Na última terça-feira, Fernando Santana, de 38 anos, tentava salvar alguns objetos de sua casa no bairro da Vila América, em Santo André, na região metropolitana de São Paulo. O imóvel foi invadido pelas águas do temporal da tarde da última segunda-feira. Com mais de 2 metros acima do nível normal, elas ultrapassaram a contenção usada há anos pelo dono de empresa de transportes e mudanças com o objetivo de evitar o pior. Mas, com a crise do clima e a intensidade das chuvas na cidade, as contenções já não funcionam mais como escudos protetores dos cidadãos, que têm perdido móveis, eletrodomésticos e até carros, como observou a reportagem do GLOBO.
Dona de uma loja de roupas, Maria Luiza Navarro perdeu mais de R$15 mil em produtos por conta das chuvas. Ela e o marido, o advogado Denilson, não estavam em casa quando um temporal atingiu a residência e não puderam subir a contenção. Mas, contam, não teria adiantado. As proteções usadas há anos têm em média 1 metro de altura, no máximo 1,5m.
Além das roupas, a família perdeu eletrodomésticos, móveis e viu seu carro, que estava estacionado na casa quando a água começou a subir, ficar quase submerso. Navarro diz que pretende acionar o seguro, mas não saberia dizer quanto tempo até a situação normalizar.
— Você vê a batalha de uma vida perdida em minutos. — pontuou o advogado na manhã após as chuvas.
O casal comprou a residência há três anos, e nunca havia presenciado algo parecido.
Fernando Santana perdeu a moto e um carro. Sua filha, de um ano, se mudou para a casa de um parente.
— Dessa vez não adiantou a contenção, a água subiu pela privada, nunca vi isso — contou.
Na rua Afonso Pena, na Vila América, os moradores estão tão acostumados com os alagamentos que diversas casas já têm uma contenções no formato das portas e das janelas. É o caso de Gisele Marinho, de 41, e Edson Cardoso Albuquerque, de 47, que, mesmo sabendo da particularidade, planejavam fazer uma oferta pelo endereço que alugam no bairro. Mas a tragédia, contam, mudou os planos. O casal, que tem cinco filhos, agora quer sair da região.
— Estamos procurando casa. Não quero mais fica lá — afirmou.
Já os Navarro, Maria e Denilson, permanecerão no endereço que compraram há três anos, mas pretendem fazer uma reforma na casa com o objetivo de evitar novos sustos com o aumento das águas na cidade.
Na quinta-feira, 3, e na sexta, 4, a Defesa Civil de São Paulo voltou a montar o gabinete de crise para monitorar as chuvas no Estado. A previsão é de temporais na região metropolitana, assim como no Litoral Norte, Baixada Santista, Vale do Paraíba, Vale do Ribeira, Sorocaba, Campinas e Itapeva.
O GLOBO acompanhou o trabalho de limpeza realizado pela Defesa Civil, que virou a madrugada. Durante a noite, a gestão municipal desobstruiu vias e retirou carros levados pela chuva. Pela manhã, o trabalho continuou com retirada de lama, limpeza e árvores caídas.
O secretário de Infraestrutura e Serviços Urbanos de Santo André, José Antônio Ferreira, que acompanhava os trabalhos de limpeza da Defesa Civil na manhã após a tempestade, argumentou que as equipes da Defesa Civil estavam posicionadas no início do temporal nos pontos propícios a alagamentos. Mas que as chuvas desta segunda-feira atingiram 85 milímetros em 40 minutos, uma “tempestade fora da curva”. Informou que há cinco anos bairros do município, como o Santa Terezinha, por exemplo, não inundavam.
O secretário também destacou que a tecnologia empregada para lidar com os temporais, como a instalação, pluviômetros e pluviômetros ajudaram a antecipar os problemas. Para o futuro, a prefeitura trabalha na ampliação da capacidade da estação de bombeamento da Vila América, a construção de “canteiros esponja” em pontos estratégicos, além da construção de 7 ‘piscininhas’ na Vila América.
— O que a gente tinha feito até hoje funcionou. Durante cinco anos funcionou. Mas a mudança climática nos surpreendeu. Avaliaremos agora como podemos ampliar o que já fazemos para uma nova precipitação desse porte — afirmou o secretário.