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Livro resgata trajetória de polêmicas da imprensa erótica brasileira, do século XIX aos dias atuais

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abril 13, 2025
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Edição da "Ba-Ta-Clan", precursora do jornalismo erótico no país — Foto: Reprodução

A própria capa de “Repórter Eros” (Cepe), estudo de quase 700 páginas sobre a história do jornalismo erótico, soa como um tratado sobre a hipocrisia. Um vão na letra “O” do título oferece ao leitor duas opções: se escorregar a folha de rosto dentro da orelha do livro, verá um comportado asterisco, que lhe permitirá passear sem medo com a publicação debaixo do braço. Basta remover a página, porém, para contemplar o bumbum masculino descoberto e uma mulher nua que ilustram a dobra da primeira capa.

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No livro, o jornalista pernambucano Valmir Costa percorre as páginas da imprensa erótica de 1808 até 2022, analisando a sua relação com uma cena social caracterizada por censura, moralismo, machismo e homofobia. Em dez segmentos, que vão da imprensa satírica do século XIX ao declínio do imprenso no século XXI, o autor mostra como jornais e revistas geraram polêmicas e debates sobre sexualidade, gênero, moralidade e tabus.

— Sexo sempre despertou interesse, mas também pânico moral — diz Costa. — No meu perfil de Instagram, os meus posts sobre o livro têm muito menos curtidas do que fotos de pôr do sol. Fotos da capa livro já foram inclusive censuradas pelas plataformas.

Edição da “Ba-Ta-Clan”, precursora do jornalismo erótico no país — Foto: Reprodução

Antes de chegar aos periódicos eróticos propriamente ditos, Costa examina as mudanças de costumes no Rio da segunda metade do século XIX. A inauguração do polêmico Alcazar Lyrique, em 1859, é um divisor de águas. O teatro de variedades da Rua da Vala (atual Uruguaiana) apresentou o conceito de cabaré à capital imperial, e virou febre com seus espetáculos ligeiros, operetas, vaudevilles, bailes de máscaras e, claro, dançarinas de cancã.

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Fundada pelo francês Arnaud, a casa também celebrou a figura da cocotte, que fundia numa mesma persona a figura da prostituta de luxo e da artista performática. Quase sempre vindas da Europa, as vedetes mais famosas do Alcazar — como a icônica Aimée, “o toque feminino francês na noite carioca” —tornavam-se íntimas dos poderosos e personificavam a fantasia da elite masculina da cidade. Podia faltar-lhes talento no palco, mas nunca sex appeal.

Elas também estampavam as capas da Ba-Ta-Clan, periódico especializado no universo do teatro musicado e precursor das primeiras publicações eróticas. Criado pelo próprio Arnaud para divulgar seu negócio e suas estrelas, o jornal exaltava um modo de vida transgressor (“à moda de Paris”) e satirizava a moral vigente, ao mesmo tempo que, sem perder a leveza, engajava-se em causas progressistas defendendo a abolição e criticando a monarquia. Só que era editado inteiramente em francês, apenas para a elite.

— Se a Ba-Ta-Clan fosse escrita em português, ela seria a prima-dona do jornalismo erótico nacional, pois era muito moderna e com ótimo recurso de impressão e ilustração — pontua Costa. — Tinha até cores.

A imprensa tradicional reagia com ambiguidade à revolução trazida pelo Alcazar. Entre escândalo e fascínio, cobriam intensamente o que acontecia dentro do teatro. Um desses “alcarzistas” era ninguém menos que Machado de Assis, que sob o pseudônimo “Doutor Semana” escreveu com regularidade sobre a casa e, em 1968, lamentou a despedida de Aimée do cabaré carioca. “Os astrônomos da cidade estão munidos com os competentes instrumentos a ver se descobrem algum astro que substitua o que se vai embora”, anunciou em crônica da Revista da Semana.

Edição de 1908 do periódico O Rio Nu — Foto: Reprodução
Edição de 1908 do periódico O Rio Nu — Foto: Reprodução

Foi preciso esperar o ano de 1893 para que a cidade conhecesse o boom das primeiras publicações eróticas. “O sexo ganha nova narrativa e surge repaginado e apimentado”, escreve Costa, ao definir o início do jornalismo de “gênero alegre”. Quem dá o tom é O Badalo, um periódico que se apresentava como “satyrico, humorístico, epigrammatico e debochático”. Com sede “no mundo da lua” (na verdade Rua do Ouvidor 143) e vida curta (durou apenas dois meses), trazia poeminhas debochados e contos safados, garantindo não poupar ninguém de sua troça.

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A fórmula seria retomada cinco anos mais tarde com muito mais sucesso — e ousadia — por O Rio Nu. Entre humor e malícia, a revista masculina multiplicava imagens de mulheres seminuas e textos e charges carregados de humor e erotismo. Também trazia anúncios de folhetos com contos e fotografias de sexo explícito, alguns deles vendidos por correio ou na própria redação do jornal. Embora liberal, a publicação reforçava preconceitos da época. Suas páginas documentavam o temperamento sexual do carioca, servindo muitas vezes como guia para onde se podia encontrar sexo.

O Riso mostrou o primeiro nu completo da imprensa brasileira em 1911 (o primeiro nu frontal apareceria seis décadas depois) — Foto: Reprodução
O Riso mostrou o primeiro nu completo da imprensa brasileira em 1911 (o primeiro nu frontal apareceria seis décadas depois) — Foto: Reprodução

Os expoentes do gênero “alegre” tinham em comum uma produção artesanal, impressão pobre e infraestrutura precária, mas também uma linguagem genuinamente nacional.

— Jornais como O Badalo, O Nabo e O Rio Nu chegam com uma toda um movimento artístico por trás — explica Costa. — Estavam incorporados ao teatro de revista, ao maxixe, aos cafés-concertos. Por conta disso, o gênero “alegre” representou um erotismo bem brasileiro. Todos se denominam humorísticos e debochativos, mas fazem humor, segundo as revistas humorísticas, com pornografia.

As publicações não escaparam das garras da censura. Em 1910, os correios impediram as remessas postais de O Rio Nu sob o argumento de que o regimento interno do órgão vetava a expedição de “artefatos, desenhos e publicações obscenas”. Mas ninguém conseguiu parar a sede pelo erotismo. Um ano depois, O Riso se tornava o primeiro veículo de imprensa e exibir uma mulher completamente nua em suas páginas (o primeiro nu frontal surgiria sete décadas depois, na Ele Ela). Na década de 1920, como uma espécie de reação da alta cultura literária, surge o gênero “galante”, que mescla sexo e uma suposta erudição. A maior expoente é A Maçã, criada pelo cronista e imortal da ABL Humberto de Campos. A linha editorial rebuscada e europeizada tentava se desvincular da pornografia.

Edição de A Maçã de 1922 — Foto: Reprodução
Edição de A Maçã de 1922 — Foto: Reprodução

— As revistas galantes tentavam espelhar a produção francesa — diz Costa. — Para Humberto de Campos, o gênero alegre tipicamente brasileiro era de mau gosto. Já A Maçã, segundo ele, adicionava uma “nota alegre” à lira da literatura. É sempre a mesma história: pornografia é só o que os outros fazem. Erótico é o que pode ser mostrado, a pornografia é o que tem que ser escondido.

Edição de Moral, de 1960, publicação acusada de ser uma publicação da “gangue da imprensa marrom” — Foto: Reprodução
Edição de Moral, de 1960, publicação acusada de ser uma publicação da “gangue da imprensa marrom” — Foto: Reprodução

O termo “pornografia”, por sinal, entrou no nosso vocabulário no século XIX, mas com outro sentido, sem conotação sexual. Era como os veículos tradicionais rotulavam a a imprensa moralista da época, especializada em arruinar reputações e difamar políticos e figuras da sociedade. “Pornógrafos” eram jornais como O Corsário, que expunha endereços de bordéis e nomes de cafetinas e tirava do armário supostos sodomitas e pederastas. Seu editor, Apulcro de Castro, morreu linchado por oficiais do exército imperial.

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Na década de 1950, quase um século depois, a imprensa marrom carioca mesclou os dois tipos de “pornografia”: sexo e difamação. Em suma, uma hipocrisia em dobro que Costa define como “a era do sensacionalismo erótico”. A carioca Escândalo oferecia tanto fotos de vedetes seminuas como Elvira Pagã e Luz del Fuego quanto rumores comprometedores de famosos da era do rádio. Seu dono era o chantagista Nilson Risarde, que cobrava para não expor os podres do show business. Nos anos 1960, os artistas chegam a declarar guerra contra a “gangue da imprensa marrom”, que seria composta por veículos como Moral e A Indiscreta.

Anúncio dos cigarros Veado — Foto: Reprodução/ Fundação Biblioteca Nacional
Anúncio dos cigarros Veado — Foto: Reprodução/ Fundação Biblioteca Nacional

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  • Frangos, sinhás e veados
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Frangos, sinhás e veados

A representação da homossexualidade na imprensa atravessa todos os capítulos de “Repórter Eros”, quase como um livro paralelo. Tanto os veículos tradicionais quanto “alegres” descrevem com um misto de escândalo e deboche os encontros furtivos entre homens em espaços públicos como o Largo do Rocio (atual Praça Tiradentes). Também observam o surgimento de um contracultura queer e ajudam a difundir apelidos jocosos para chamar seus representantes. No fim do século XIX, definem como “fresco” ou “frango” o homem afeminado, conhecido por se vestir com roupas apertadas. Homens que se vestem de mulher ficam conhecidos como “sinhazinhas”, depois “travestis”.

De acordo com uma investigação de Costa, “veado” teria como origem a marca de cigarro homônima do industrial José Francisco Corrêa. Desde 1880, a imprensa moralista cola a imagem de devasso no empreendedor, que usa imagens sensuais nas embalagens de seu cigarro. A partir de 1903, o termo vira sinônimo de homossexualidade por causa da suposta orientação sexual de Corrêa.

— Durante a pesquisa e a escrita do livro, tinha a sensação de que o tema LGBTQIAP+ tinha virado o tema central — diz Costa. — Após a conclusão, percebi que estava bem balanceado, pois a heterossexualidade e a homossexualidade ocupam o mesmo campo semântico do sexo. Elas se entrelaçam. Só são abordadas de formas diferentes a depender da época.

Com pautas sobre o prazer da mulher, Rose fez sucesso mesmo entre o público gay — Foto: Reprodução
Com pautas sobre o prazer da mulher, Rose fez sucesso mesmo entre o público gay — Foto: Reprodução

Antes de ganhar publicações específicas, o público gay recorria a revistas de fisiculturismo dos anos 1940 como Força e Saúde, ou Músculo. “Mais do que mostrar corpos fortes, as poses dos halterofilistas destas revistas revelam um quê de erotismo e passam a ser consumida por homossexuais”, escreve Costa. O corpo masculino também surge em destaque nas revistas para mulheres, primeiro em contos picantes em Grande Hotel e Capricho, depois nos seminus de Rose — “a revista que informa as mulheres e tira a roupa dos homens”.

— Embora fosse voltada para mulheres, a revista já falava sobre gays, porque era o principal público dela — diz Costa. — Revista com homem pelado nunca deu certo entre mulheres.

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