A literatura, o cinema e a televisão já provaram muitas vezes que um par central carismático não precisa de romance para cativar o público. “Ladrões de drogas”, série lançada pela AppleTV+, é assim, uma aventura urbana conduzida com vigor por Brian Tyree Henry e Wagner Moura no papel de amigos de infância criados em um ambiente de desamparo e que nunca soltaram a mão um do outro. A química perfeita dos atores potencializa o talento individual deles. É o que sustenta e amplia o poder dramático da narrativa.
Para o público brasileiro, trata-se também de uma ótima chance de rever Wagner na tela, já que ele está fazendo carreira nos Estados Unidos.
O enredo tem cinco episódios. Seu criador, Peter Craig, se baseou em um livro de 2009, de Dennis Tafoya. Ridley Scott, que é produtor executivo, assina a direção do primeiro capítulo.
Brian Tyree Henry vive Ray. Seu pai (Ving Rhames) cumpre pena por tráfico de drogas e ele foi criado pela madrasta Thereza (Kate Mulgrew), com quem tem uma ligação de amor filial genuíno. Seu melhor amigo é o brasileiro Manny Carvalho (Wagner). Eles vivem numa área pobre e violenta da Filadélfia.
Os dois tentam se manter fora das gangues locais. Ganham dinheiro com o crime, mas seguindo um engenhoso esquema próprio. Disfarçam-se de policiais de elite. Usam bonés e coletes falsos e emulam o vocabulário dos agentes. Portam armas, mas sem a intenção de machucar. Estudam a rotina e o comportamento dos bandidos. E irrompem nas fábricas clandestinas de metanfetamina, como se fossem prender, mas roubam a droga para revender.
A operação é meticulosa, quase clínica, até que decidem recrutar um terceiro integrante. O desequilíbrio gerado por esse novo elemento precipita o colapso do plano. O que era controle vira caos: o cartel entra em cena, a polícia também, e os protagonistas tornam-se alvos. A perseguição imprime novo ritmo à história, e a série mergulha num clima de urgência. Nesse ponto surge Mina (Marin Ireland), agente infiltrada entre os traficantes. Um ferimento a faz perder parte da fala — limitação que, embora justificada na trama, compromete o desempenho de uma atriz claramente capaz de muito mais.
As cenas de ação são bem coreografadas e tensas. Do ponto de vista estético, “Ladrões de drogas” é crua, sem concessões: os ambientes são degradados, a luz é fria, os cenários urbanos são marcados por abandono e feiura.
O roteiro perde tração, entretanto, quando abraça alguns dramas. Isso acontece sobretudo com a subtrama envolvendo Manny e a noiva, Sherry (Liz Caribel Sierra). As cenas faladas/gritadas em espanhol são de novelão mexicano e destoam do restante. Em compensação, os conflitos envolvendo o vínculo de Ray e Manny fogem dessa estridência, comovem e levam à ideia de que a amizade pode ser vista como um ato de resistência.
