Em meio a uma indefinição que já se arrasta por quase seis meses, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda tem uma série de nós para desatar antes de bater o martelo sobre quem serão os dois novos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Além de pressões, lobbies e vetos de todos os lados, o presidente ainda tem que arbitrar uma disputa ferrenha entre políticos envolvendo uma procuradora de Alagoas — o que tem sido chamada de “Faixa de Gaza” nos bastidores de Brasília.
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Desde outubro do ano passado, o presidente da República tem em mãos as duas listas tríplices formadas pelo STJ – uma para representante da Justiça Federal, outra para representante do Ministério Público.
As vagas foram abertas com a saída de duas mulheres – Laurita Vaz (que se aposentou em outubro de 2023) e Assusete Magalhães (que deixou o tribunal em janeiro de 2024).
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Mas Lula vem adiando a escolha, principalmente em razão da dificuldade de resolver o impasse na “faixa de Gaza” em torno da candidatura da procuradora de Justiça de Alagoas Maria Marluce Caldas Bezerra, que consta na lista do Ministério Público.
Ela é tia do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o JHC – aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), filiado ao PL de Bolsonaro e arquirrival do clã Calheiros no tabuleiro político alagoano. Conforme informou o blog, há meses JHC sinaliza que vai migrar para o PSD de Gilberto Kassab – solução preferida do próprio presidente da República, que já conversou com JHC sobre o tema e deu aval à movimentação. Mas até agora, o prefeito ainda não deixou formalmente o PL.
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Aliado dos Calheiros, o governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), tem se movimentado contra uma eventual indicação de Maria Marluce e a favor da escolha de outro candidato, o procurador de Justiça do Acre Sammy Barbosa.
Sammy também conta com o apoio do grupo ligado aos ministros do STJ Luis Felipe Salomão e Mauro Campbell, que articulou contra a candidatura do desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) na etapa anterior da disputa, em que os próprios ministros do STJ fazem uma votação sigilosa para definir a lista e enviar as opções de candidatos a Lula.
Apesar do apoio do Palácio do Planalto, Favreto ficou de fora da lista reservada à Justiça Federal, o que irritou o presidente da República.
A lista da Justiça Federal também é marcada por lobbies e vetos.
Por ora, o favorito é o desembargador Carlos Pires Brandão, do TRF-1, que conta com o apoio de outro influente governador nordestino – o do Piauí, Rafael Fonteles (PT), que fez questão de defender recentemente as credenciais de Brandão perante o próprio Lula.
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Brandão é defendido por outro conterrâneo, o ministro piauiense Kassio Nunes Marques, do STF, que assumirá a chefia do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano que vem e comandará as próximas eleições presidenciais. No polo oposto, porém, está Flávio Dino, do STF, que tem feito uma forte campanha contra.
Assim como Lula, Dino também sofreu um revés na etapa anterior da disputa, quando viu o seu colega desembargador Ney Bello, do TRF-1, ficar de fora da lista. O tribunal, sediado em Brasília, é área de influência de Kassio. Apesar de ter sido indicado por Bolsonaro ao STF, Kassio tem feito uma série de acenos à administração petista desde que Lula retornou ao Palácio do Planalto.
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“Essa escolha é como um quebra de cabeças. A demora do presidente Lula não é por conta de desprestígio, e sim por motivos de dúvida”, diz um interlocutor de Lula no meio político.
Como se não se faltassem nós para desatar, um outro fator tem complicado ainda mais as coisas para Lula: a questão de gênero.
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O presidente já se queixou da “supremacia branca” e da falta de diversidade no Judiciário brasileiro, mas até agora tem dados sinais tímidos para mudar isso.
A primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja, tem defendido a escolha de ao menos uma mulher para o STJ, mas até agora não se movimentou a favor de nenhum dos indicados.
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Na definição das duas listas – uma com três desembargadores da Justiça Federal e outra com três representantes do Ministério Público – o STJ incluiu mulheres em ambas: as desembargadoras Daniele Maranhão e Marisa Ferreira dos Santos, respectivamente do TRF-1 e do TRF-3, na lista da Justiça Federal; e a procuradora Maria Marluce Caldas Bezerra, na do Ministério Público.
Enquanto as listas do STJ estão paradas no Planalto há cerca de seis meses, Lula fez uma indicação a jato, ao escolher em março a advogada Verônica Sterman para uma vaga que só foi aberta neste mês no Superior Tribunal de Militar (STM).
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Verônica defendeu a ministra da Secretaria Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e o ex-marido dela, o ex-ministro Paulo Bernardo, em casos da Operação Lava-Jato.
“O presidente se apressou para indicar uma mulher ao STM para diminuir as críticas com a possível escolha de dois homens para o STJ”, critica um ministro ouvido reservadamente pela equipe da coluna.
