No vilarejo de Zababde, no norte da Cisjordânia, digno de cartão-postal, os aviões de combate israelenses costumam abafar a melodia dos sinos das igrejas. Enquanto a Páscoa se aproxima, os cerca de 5 mil habitantes da região, predominantemente cristãos, mantêm vivas as tradições religiosas: escoteiros se preparam para as procissões, outros fazem bolos recheados com tâmara e o coral da igreja ensaia. No entanto, o tema de todas as conversas entre as pessoas não é a ressurreição de Cristo, que estão prestes a celebrar, nem o que poderá comer após 40 dias de jejum, mas sim sobre a guerra, que parece se aproximar desse pequeno enclave de casas, encravado entre colinas da Cisjordânia, território palestino ocupado por Israel desde 1967.
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— Certo dia desses, o Exército entrou em Jenin — conta a moradora Janet Ghanam, de 57 anos, referindo-se à cidade mais próxima de Zababde. — As famílias correram para buscar os filhos na escola. Há um medo constante. Você dorme com ele e acorda com ele.
A guerra em Gaza, somada às operações militares na Cisjordânia e à crise econômica, afeta profundamente a comunidade cristã local. O território, ocupado por Israel desde 1967, está sob ameaça de anexação, o que intensifica a tensão entre os moradores.
O filho de Ghanam, que mora em Belém, a cerca de 100 quilômetros ao sul, disse que não poderá visitá-la na Páscoa, pois teme ser parado no caminho, onde o Exército israelense instalou novos postos de controle nos últimos meses.
Os palestinos vivem há mais de um ano em meio ao medo e a incerteza da guerra entre o Hamas e Israel. Na Faixa de Gaza, o Ministério da Saúde, controlado pelo Hamas, contabiliza mais de 50 mil mortos desde de 7 de outubro de 2023.
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— Muita gente se pergunta se ainda estará em suas casas dentro de cinco anos — disse o diácono episcopal Saleem Kasabreh, acrescentando que o acompanhamento constante das notícias sobre Gaza mergulha os habitantes em “depressão”.
Desde 21 de janeiro, o Exército israelense conduz uma ofensiva de larga escala no norte da Cisjordânia, especialmente em Jenin, a apenas 20 minutos de carro do vilarejo, Considerado um reduto de grupos armados, o campo de refugiados da cidade foi completamente destruído em poucas semanas, e muitos buscaram refúgio em Zababde.
Paralelamente, cerca de 450 pessoas da região perderam seus empregos em Israel após a revogação das autorizações de trabalho para palestinos.
— Israel nunca havia nos trancado completamente na Cisjordânia antes desta guerra — destaca o agricultor Ibrahim Daud, de 73 anos. — Ninguém sabe o que vai acontecer.
A possibilidade de um êxodo em massa paira sobre a comunidade. O temor de ver a “Terra Santa” esvaziada de seus discípulos originais — um tema tabu entre os cristãos palestinos durante muito tempo — agora é abertamente discutido.
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— As pessoas não podem ficar sem trabalho. A vida não é fácil — comenta o professor de matemática Tareq Ibrahim, de 60 anos, lamentando o desinteresse da comunidade internacional pelos palestinos em geral. Ele “compreende” os que buscam um futuro melhor na Europa ou nos Estados Unidos. — A longo prazo, pode ser que não sobrem mais cristãos no país de Jesus — afirma, em referência aos locais-chave da vida de Cristo nos territórios palestinos e em Israel.
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De acordo com o padre Elias Tabban, líder da maior paróquia do vilarejo, “quando as pessoas vão embora [de Zababde], elas voltam, pois não vendem suas terras”. Tabban mantém viva a esperança e investe em projetos para formação profissional e geração de empregos no vilarejo. Para ele, teria que ter até mais bancos em sua igreja.