As posições políticas à direita de Nana Caymmi, que morreu nesta quinta-feira (1), aos 84 anos, incomodaram muito sua sobrinha Alice Caymmi, filha de Danilo e neta de Dorival. Mas antes disso, foram as críticas da veterana, conhecida pela acidez nos comentários, ao trabalho da sobrinha que calaram fundo em seu coração.
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Em entrevista à Folha de São Paulo em 2019, Nana se mostrou descontente com o rumo da carreira de Alice: “Eu tinha muita esperança de que ela fosse para o meu caminho. Achei que Alice ia dar mel, mas não deu”.
A sobrinha, por sua vez, usou as redes sociais para contar que passou por muita “rejeição e violência” e nunca pediu a aprovação de ninguém. A violência, segundo Alice, não vinha só da família, era coletiva (“foram 10 anos tendo que responder como era ser neta do Caymmi”), como detalhou em entrevista ao GLOBO, também em 2019.
– As palavras são instrumentos de cura. Estou falando sobre existência, perdão, vida e morte. As pessoas te decepcionam de uma maneira que não tem volta. Sofri essa morte da decepção, voltei e renasci – afirmou Alice. – Você não pode se divorciar de um tio, desistir. Nossas imagens estão ali, misturadas, juntas. As palavras são instrumentos de cura. As pessoas gostam de apontar dedos, culpar os outros pelos próprios erros. Tem gente que deprime, tipo “olha o que você fez comigo”. Mas quando você se livra, vira outra. As pessoas te decepcionam de uma maneira que não tem volta. Sofri essa morte da decepção, voltei e renasci. Luto para viver, e sinto hoje que as pessoas decidem, a cada segundo, viver ou morrer.
No último dia 29, quando Nana Caymmi completou 84 anos, Alice fez um post emocionante em homenagem à tia, mostrando que as mágoas ficaram para trás:
“Vamos celebrar hoje a maior cantora do Brasil. Vamos discordar sem perder o amor e a reverência pela arte sublime de nana. Eu me curvo diante da sua grandeza, tia. Eu te amo. Queria estar com você agora. Eu sempre quero te abraçar. Você é meu norte incerto, minhas noites em claro e minhas alegrias diurnas. Aceite a sua “filha” torta, que veio por outros caminhos e também erra. “Onde você estiver, não se esqueça de mim” porque eu mesma, não vou esquecer de você. Com amor, Alice”, escreveu ela.
Em sua mais recente entrevista ao GLOBO, em 2024, Alice já havia contado que fizera as pazes com a tia:
— A gente conversou horrores. E ela fez o que sempre faz: fingiu que nada aconteceu. Disse: “Sou sua tia, te amo e estou aqui”. Respondi: “Eu também, e vai ficar tudo bem” — conta. — Não tem como ficar de mal com uma pessoa que está de mal com o mundo.
A sobrinha procurou entender as razões da tia dentro da história familiar e acabou enxergando paralelos com a própria história.
— Sei de onde ela vem, que, às vezes, é um lugar de tristeza e de não adaptação. Vim da mesma fonte maluca. É uma mulher dentro desse contexto, sofreu muito mais opressão que eu. Teve uns 12 casamentos, três filhos, um sofreu um acidente… Não é uma vida comum nem fácil. Inclusive, um dos meus sonhos é contar a história dela no cinema, a dela e a da minha avó, Stella. Acho importante que saibam de onde vêm Nana e suas questões.
Alice lembra que o modo “sem filtro” de Nana é pré-rede social.
- Sem filtro: ‘Quer me cancelar, cancela’, disse Nana Caymmi
— Os millennials não a conheciam como ela é. Quando isso aconteceu, foi automaticamente cancelada, o modus operandi de hoje — analisa. — Lembra quando saiu aquela entrevista bombástica em que ela bateu nos grandões da MPB? Eles responderam: “Ah, é a Nana!” Estão acostumados. Ela mostrava o peito, ficava nua, sempre foi contracultura. Canta bolero, mas fala barbaridades nos shows (risos). A essência é punk, é contra o sistema. Essa grosseria e violência é uma reação à opressão.
Diante da morte de Nana, Alice fez um post com a seguinte legenda:
“Dor indescritível. Perda irreparável”, escreveu.