O primeiro-ministro do Catar, xeque Mohammed bin Abdulrahman al-Thani, afirmou que o país continuará tentando mediar um cessar-fogo e a libertação de reféns em Gaza, mesmo com o ataque de Israel a um complexo do Hamas em Doha nesta terça-feira, apesar de ter anunciado o contrário inicialmente. Além disso, o líder reforçou que enxerga o bombardeio — que levou à morte de um de seus agentes de segurança, além de outros feridos — como uma sabotagem às negociações pela paz no enclave em guerra, que estava sendo negociada com o grupo terrorista a pedido do presidente dos EUA, Donald Trump.
- Contexto: Exército de Israel ataca altos líderes do Hamas em Doha, capital do Catar, onde fica sede do grupo
- ‘Flagrante violação da soberania’: Líderes e países reagem ao ataque de Israel às autoridades do Hamas no Catar
— Nada nos impedirá de continuar essa mediação na região — disse o xeque Mohammed bin Abdulrahman al-Thani aos repórteres, acrescentando que é um “momento crucial” para a região.
Ele também alertou que seu país se reserva o direito de responder ao ataque, e acusou Israel de trabalhar para sabotar as negociações de cessar-fogo em Gaza.
— Acreditamos que hoje chegamos a um momento crucial. É preciso que haja uma resposta de toda a região a ações tão bárbaras — acrescentou durante entrevista coletiva. (…) — Este ataque, só podemos descrevê-lo como terrorismo de Estado. O mundo precisa de uma imagem mais clara de quem é o valentão na região.
Segundo ele, Israel atacou a sede administrativa do Hamas na capital do país com “armas não detectadas” pelas suas defesas aéreas, o que antes foi definido pelo seu governo como um ato “covarde” da administração do homólogo Benjamin Netanyahu.
O Exército de Israel atacou líderes do grupo terrorista Hamas reunidos em Doha nesta terça-feira, em uma ação inédita que ignorou a soberania do Catar para alcançar a liderança política da organização palestina. Horas depois, o Hamas informou que seus representantes estavam reunidos para discutir uma proposta de cessar-fogo enviada pelo presidente americano, Donald Trump, e que seu principal líder sobreviveu, mas acrescentou que cinco pessoas ligadas ao grupo foram mortas.
A ação ocorre em um momento em que militares israelenses fazem um ultimato para a retirada da população palestina da Cidade de Gaza, em um preparativo final para o avanço contra o principal centro urbano do enclave em guerra.
“As Forças Armadas de Israel (FDI) e o Shin Bet [agência de Inteligência interna] realizaram um ataque preciso contra a alta liderança da organização terrorista Hamas”, afirmou o Exército em uma publicação na rede social X, sem especificar inicialmente onde o ataque ocorreu — a confirmação veio pouco depois pelo governo. “Durante anos, esses membros do Hamas lideraram as operações da organização terrorista, são diretamente responsáveis pelo brutal massacre de 7 de outubro e orquestraram e administraram a guerra contra o Estado de Israel. Antes do ataque, medidas foram tomadas para mitigar os danos a civis, incluindo o uso de munições de precisão e inteligência adicional”.
Em um comunicado, a Casa Branca afirmou que os israelenses avisaram antecipadamente sobre o bombardeio, e que o enviado especial Steve Witkoff teria repassado a informação ao presidente do Catar — que é um aliado fundamental dos EUA na região e abriga uma grande base militar americana em seu território.
“Bombardear unilateralmente dentro do Catar — uma nação soberana e aliada próxima dos Estados Unidos que está trabalhando ardua e corajosamente assumindo riscos conosco para negociar a paz — não promove os objetivos de Israel ou dos Estados Unidos. No entanto, eliminar o Hamas — que lucrou com a miséria dos que vivem em Gaza — é um objetivo nobre”, diz a mensagem de Trump lida pela porta-voz Karoline Leavitt. “O presidente vê o Catar como um forte aliado e amigo dos EUA e se sente muito mal com a localização do ataque.”
A porta-voz ainda mencionou que Trump conversou com o emir e com o primeiro-ministro do Catar, afirmando que “tal coisa não se repetirá em seu território”.
Pouco após a operação, o gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu emitiu um comunicado afirmando que a “ação contra os terroristas chefes do Hamas” foi uma ação “independente”, e que o Estado judeu assume total responsabilidade pelo ataque. Em um comunicado conjunto posterior, o premier e seu ministro da Defesa, Israel Katz, vincularam o ataque em Doha ao tiroteio em Jerusalém Oriental na véspera, que matou seis israelenses — um braço armado do Hamas assumiu a autoria do ataque nesta terça.
“O primeiro-ministro e o ministro da Defesa acreditavam que a operação era totalmente justificada, visto que a liderança do Hamas foi quem iniciou e organizou o massacre de 7 de outubro e desde então continuou a realizar ataques assassinos contra Israel e seus cidadãos, incluindo assumir a responsabilidade pelo assassinato de nossos civis no ataque de ontem em Jerusalém”, diz o comunicado.
O Shin Bet divulgou imagens de Netanyahu e Katz acompanhando ao vivo o bombardeio. Mais cedo, o canal público israelense Kan havia noticiado que o primeiro-ministro se retirou de um depoimento a portas fechadas para a justiça, parte do caso em que é réu por corrupção, alegando haver um assunto de segurança nacional.
Após o ataque, durante um evento na Embaixada dos EUA em Jerusalém, Netanyahu afirmou que pode terminar a guerra “imediatamente” se o Hamas aceitar a proposta de trégua de Trump — um texto cujos detalhes ainda não foram divulgados, mas que especialistas especulam que não daria garantias sobre um fim definitivo para o conflito ou a saída das tropas de Israel de Gaza. O grupo palestino afirmou que os representantes atacados tinham se reunido justamente para discutir o texto.
Fontes próximas ao Hamas apontaram que a proposta de Trump cumpriu na verdade um papel de distração, para fazer com que as lideranças do grupo estivessem todas reunidas para o ataque de Israel. O grupo palestino informou que nenhum líder foi morto no bombardeio, mas que o filho de Khalil al-Hayya, maior autoridade do gabinete político, estava entre os seis mortos.
O governo do Catar condenou a agressão israelense nos mais fortes termos. Doha vinha atuando como um mediador importante no diálogo indireto entre Hamas e Israel, e teve um papel destacado na intermediação dos acordos que permitiram a libertação de parte dos reféns israelenses após o 7 de outubro — apesar de críticas por parte do lado israelense sobre o abrigo oferecido ao gabinete do Hamas. O Ministério do Interior do Catar informou que ao menos um agente de segurança morreu.
“Este ataque criminoso constitui uma flagrante violação de todas as leis e normas internacionais e uma grave ameaça à segurança dos catarianos e residentes do Catar”, manifestou-se em um comunicado o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores Majed al-Ansari. “Enquanto condena veementemente este ataque, o Estado do Catar afirma que não tolerará este comportamento irresponsável de Israel e sua contínua interferência na segurança regional, bem como qualquer ação que vise sua segurança e soberania. As investigações estão em andamento no mais alto nível e mais detalhes serão anunciados assim que estiverem disponíveis”.
Uma autoridade ouvida em anonimato pelo Canal 12, maior emissora de TV de Israel, disse que a operação teria recebido sinal verde de Trump. Em um comunicado, a Casa Branca afirmou que os israelenses avisaram antecipadamente sobre o bombardeio, e que o enviado especial Steve Witkoff teria repassado a informação ao presidente do Catar — que é um aliado fundamental dos EUA na região e abriga uma grande base militar americana em seu território.
“Bombardear unilateralmente dentro do Catar — uma nação soberana e aliada próxima dos Estados Unidos que está trabalhando arduamente e corajosamente assumindo riscos conosco para negociar a paz — não promove os objetivos de Israel ou dos Estados Unidos. No entanto, eliminar o Hamas — que lucrou com a miséria dos que vivem em Gaza – é um objetivo nobre”, diz uma mensagem lida pela porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt. “O presidente vê o Catar como um forte aliado e amigo dos EUA e se sente muito mal com a localização do ataque”.
A porta-voz ainda mencionou que Trump conversou com o emir e com o primeiro-ministro do Catar, afirmando que “tal coisa não se repetirá em seu território”.
O ataque direto aumenta o risco de antagonismo entre o governo dos dois países e mina esforços diplomáticos, especialmente porque a estabilidade política e econômica do Catar depende de sua reputação como um porto seguro para negócios e turismo em uma região volátil. O preço do petróleo subiu após relatos do ataque, que reacendeu os temores de um conflito mais amplo no Oriente Médio, o que aumentará o prêmio de risco do petróleo.