O presidente americano Donald Trump, ao mencionar o Brasil e Lula em seu discurso na Conferência Geral das Nações Unidas, logo após a fala de abertura do brasileiro na manhã de hoje, teve forte influência sobre os rumos dos principais indicadores financeiros no Brasil nesta terça-feira.
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Ao dizer que os dois tiveram “uma ótima química” em um rápido encontro nos bastidores da assembleia, em Nova York, e que deve se encontrar na semana que vem com o petista, Trump aumentou a expectativa entre o investidores de abertura de diálogo entre Brasil e EUA em torno da taxação de 50% sobre produtos brasileiros importados pelos americanos.
O real se valorizou diante do dólar, cuja cotação fechou em queda de 1,1%, aos R$ 5,27. As ações de empresas brasileiras também se valorizaram. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de São Paulo, a B3, renovou sua máxima histórica de encerramento pela oitava vez em 18 dias de negociação, fechando em alta de 0,91%, aos 146.425 pontos.
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O dia, que começou morno, teve a inversão do sentido dos indicadores ao fim da manhã, após o discurso do republicano na tribuna das Nações Unidas. O dólar acelerou a queda e o Ibovespa ultrapassou pela primeira vez os 147 mil pontos logo após as declarações do presidente americano.
— Combinamos que vamos nos encontrar na semana que vem — afirmou Trump sobre o rápido encontro com Lula nos bastidores da conferência. A declaração alimentou o apetite a risco dos investidores globais, disseram analistas.
Para Marcos Oviedo, estrategista para a América Latina na XP, uma reunião bilateral entre os chefes dos dois países ajuda a aliviar as tensões do relacionamento internacional causadas pela aplicação das sobretaxas aos produtos brasileiros pelos EUA, o que aumenta o interesse do investidor global por aplicações no Brasil:
— Pode ser o início das negociações e das discussões sobre reduções tarifárias. E esse otimismo pode ser interpretado pelo mercado como um aumento do apetite ao risco, com taxas mais baixas e à valorização do real — afirmou.
A conversa ajudou a alimentar mais um recorde nominal na Bolsa brasileira, observou Mauricio Carvalho, assessor da Aware Investments:
— Isso demonstra uma boa vontade do presidente dos EUA de conversar, e Lula também demonstra interesse em conversar. E isso é bom para o país, diminuindo a intensidade do problema das tarifas que estamos tendo.
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A moeda americana fechou em queda de 1,1%, aos R$ 5,27, no menor patamar de 2025, e o mais baixo desde 6 de junho do ano passado. Para Carlos Lopes, economista do Banco BV, o câmbio correspondeu a um somatório de notícias, mas acelerou a queda diante da possível aproximação entre os chefes dos dois países.
— Tivemos um dia favorável a moedas emergentes de forma geral. É positivo por uma tendência global e acentuada pela notícia de aproximação de Trump com Lula, podendo trazer algum benefício. E ainda uma ata (do Copom) que confirma a mesma mensagem do comunicado, com juros parados num patamar elevado até o fim do ano — diz Lopes.
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Ele afirma que uma solução na questão tarifária no horizonte ajuda a aliviar o câmbio:
— O Brasil é um dos países que ficou mal posicionado na questão tarifária com os EUA e não avançou muito em negociações. As tarifas prejudicam as exportações brasileiras aos EUA e isso reduz o fluxo de capitais que entram no país. Se tivermos um avanço nas conversas que reduzam as tarifas, acaba sendo positivo ao fluxo de capitais (que afeta o câmbio) — afirma.
O Ibovespa, que já registra valorização de 22% no ano, teve desde o último dia de agosto oito recordes de fechamento. Para João Mamede, analista sênior de ações e renda variável da AZ Quest, três são os motivos que levam o principal índice da B3 a registrar consecutivos recordes nominais. Dos fatores locais, ele diz, há uma antecipação à perspectiva de um ciclo de baixa na Selic (apesar do início apenas no ano que vem), além, segundo ele, da antecipação ao pleito presidencial do ano que vem:
— Há quase um consenso de que o arcabouço fiscal atual não é sustentável por muito mais tempo. Então, com eleição de um novo governo, poderíamos pensar num governo mais fiscalista, e alguma reforma fiscal terá de acontecer. Então se isso de fato acontecer, ajuda a trajetória positiva da Bolsa — afirma ele, que afirma que parte da valorização já apresentada pelo índice este ano já vem dessa previsão de investidores.
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Para além disso, afirma, há a rotação dos investidores diante da trajetória de queda do juro americano. Com a redução da taxa por lá, o capital global tem seu apetite a risco aumentado, e busca novos territórios e aplicações que possam dar maiores retornos:
— Além dos cortes já precificados, há previsão de mais dois cortes no juro americano em 2026. Isso aumenta o diferencial de juros e ajuda o trabalho do Banco Central a reduzir juros por aqui — afirma ele.
Daniel Utsch, gestor da Nero Capital, afirma que o ajuste na taxa americana pode promover um fluxo consistente para o Brasil:
— O Brasil é sim alternativa de veículo de diversificação, com múltiplo baixo, potencial de longo prazo e, quando estrangeiro reduz ainda que na margem posições nos EUA, é natural que Brasil apareça (como destino). E pequeno fluxo já é gigantesco — afirma ele sobre as recentes máximas. Os “múltiplos baixos” a que o analista se refere trata da capacidade de retorno em lucro que uma empresa é capaz de gerar ao investidor com base no preço da ação. Este fator torna a Bolsa brasileira “barata”.
Duplo mandato é ‘desafio’, diz Powell
Nesta terça, o chefe da autoridade monetária americana, Jerome Powell, voltou a dizer que as perspectivas para o mercado de trabalho e para a inflação enfrentam riscos, reiterando sua visão de que a política monetária terá um caminho difícil pela frente ao avaliar novos cortes de juros.
— Os riscos de curto prazo para a inflação estão inclinados para cima e os riscos para o emprego, para baixo. Uma situação desafiadora. Riscos em duas direções significam que não existe um caminho sem risco — disse ele num aguardado discurso, reafirmando a desaceleração tanto na oferta quanto na demanda por emprego.
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Sobre inflação, Powell disse que permanece atento aos impactos das tarifas, que podem levar tempo para percorrer as cadeias, já que “dados recentes e sugerem que esses aumentos de preços refletem, em grande parte, tarifas mais altas, em vez de pressões inflacionárias mais amplas”.
O tom mais duro demonstrado no discurso alimentou a realização das Bolsas de Nova York, que botaram um pé no freio nas últimas máximas, registradas na segunda.