O Exército israelense fechou nesta quarta-feira o último acesso ao norte da Faixa de Gaza para os residentes do sul do território palestino, após ultimato do ministro da Defesa de Israel de que essa seria a “última oportunidade” para os moradores se deslocarem. A campanha israelense no território palestino continua após o presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, anunciar um plano de cessar-fogo na segunda-feira, depois de se reunir com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, na Casa Branca. A proposta ainda está sendo analisada pelo Hamas, que, segundo fontes familiarizadas com as negociações, deseja a modificação da cláusula que prevê seu desarmamento.
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“Aqueles que permanecerem (…) serão considerados terroristas e colaboradores do terrorismo”, disse o ministro Israel Katz em um comunicado.
Katz disse ainda que os militares capturaram o corredor Netzarim, no centro da Faixa de Gaza, até a costa oeste, uma ação que, segundo ele, separou o norte de Gaza do sul. Ele acrescentou que qualquer pessoa que saísse da Cidade de Gaza em direção ao sul teria que passar por postos de controle militares israelenses.
O ultimato foi feito horas depois de os militares anunciarem o fechamento da última rota restante para os moradores do sul de Gaza acessarem o norte. “Habitantes de Gaza, a rua al-Rashid será fechada ao tráfego a partir do setor sul da Faixa a partir das 12h (6h de Brasília)”, afirmou um comunicado em árabe divulgado pelo porta-voz militar Avichay Adraee nas redes sociais.
Esta semana, os militares israelenses disseram que 780 mil pessoas deixaram a Cidade de Gaza desde que uma ordem de retirada foi emitida em 9 de setembro.
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O enorme fluxo de moradores de Gaza para o sul sobrecarregou ainda mais os serviços humanitários, que, segundo grupos de ajuda, não eram suficientes mesmo antes da chegada de milhares de pessoas.
Desde que a ofensiva terrestre na Cidade de Gaza começou, dizem agências de ajuda, os esforços para aliviar a crescente crise humanitária em Gaza mergulharam no caos.
No mês passado, uma comissão da ONU que investigava a guerra disse que Israel estava cometendo genocídio contra palestinos, uma acusação que Israel negou. E em agosto, um painel de especialistas em alimentos apoiado pela ONU concluiu que a Cidade de Gaza e seus arredores estavam oficialmente em situação de fome, com pelo menos meio milhão de pessoas enfrentando fome, desnutrição aguda e morte. Israel negou as conclusões do relatório e criticou a metodologia do painel.
Enquanto isso, o plano de cessar-fogo proposto pelo presidente Trump ainda não foi aprovado pelo Hamas. O movimento islamista palestino, que governa Gaza desde 2007, está avaliando a proposta de 20 pontos dos EUA, informou uma fonte palestina sob condição de anonimato. Segundo a fonte, ainda não foi tomada “nenhuma decisão final”, acrescentando que o Hamas precisará de “dois ou três dias” para anunciar a resposta.
O projeto, elogiado por vários países, contempla um cessar-fogo, a libertação dos reféns israelenses em um prazo de 72 horas, o desarmamento do Hamas e uma retirada gradual das forças israelenses mobilizadas na Faixa de Gaza. Também prevê uma autoridade de transição dirigida pelo próprio Trump, na qual será acompanhado, entre outros, pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair.
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De acordo com a fonte, o Hamas “deseja modificar algumas cláusulas, como a do desarmamento e a da expulsão dos dirigentes de alto escalão” do movimento de Gaza. O Hamas também pede “garantias internacionais” de que as tropas de Israel deixarão integralmente a faixa costeira e que não haverá mais assassinatos “dentro ou fora do território”.
A proposta de Trump exige o desarmamento completo do Hamas e sua exclusão de qualquer futuro governo, mas prevê uma anistia para os combatentes que aceitarem a “coexistência pacífica” com Israel.
Uma fonte próxima às negociações em Doha, Catar, declarou à AFP que existem “duas opiniões dentro do Hamas” sobre o plano americano para um cessar-fogo.
— A primeira apoia a aprovação incondicional, já que a prioridade é um cessar-fogo no âmbito das garantias dadas por Trump, com mediadores que assegurem que Israel cumpra o plano — declarou a fonte. — A segunda tem sérias reservas sobre cláusulas-chave, rejeita o desarmamento e as expulsões (…) e prefere uma aprovação condicional, acompanhada de esclarecimentos que reflitam as exigências do Hamas e dos movimentos de resistência.
Ao mesmo tempo, os bombardeios não deram trégua na Cidade de Gaza nesta quarta-feira, onde o Exército israelense iniciou uma ofensiva terrestre em larga escala em 16 de setembro.
— As explosões não param — denunciou por telefone Rabah al-Halabi, um palestino de 60 anos.
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O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) suspendeu nesta quarta-feira suas operações na Cidade de Gaza e transferiu os funcionários para o sul do território. “Hoje, na Cidade de Gaza, estão matando civis, estão sendo deslocados à força e obrigados a suportar condições terríveis”, alertou a organização com sede em Genebra.
Apesar do ultimato de Israel, muitos moradores da cidade ainda se recusam a deixar o local” por temerem não ter para onde ir.
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— Não vou sair, porque a situação em Gaza não é diferente da situação no sul da Faixa de Gaza. Todas as áreas são perigosas, os bombardeios não param e os deslocamentos são aterrorizantes e humilhantes — disse al-Halabi, que vive em uma tenda instalada no terreno de um hospital.
A Defesa Civil de Gaza informou que pelo menos seis pessoas morreram em um bombardeio israelense contra uma escola que abrigava deslocados nesta quarta-feira. Outras sete faleceram em um ataque contra uma casa na cidade. O Exército israelense indicou à AFP que estava examinando as informações.
— Esperamos a morte, ou talvez a ajuda de Deus e o cessar-fogo — acrescentou al-Halabi.
O ataque do Hamas de 7 de outubro de 2023 matou 1.219 pessoas no sul de Israel, a maioria civis, segundo um balanço da AFP baseado em números oficiais israelenses. Os comandos islamistas também sequestraram 251 pessoas, das quais 47 continuam em cativeiro em Gaza, incluindo 25 que, segundo o Exército, estão mortas. Em resposta, Israel iniciou uma ofensiva implacável em Gaza, que matou mais 66 mil palestinos, a maioria civis, segundo dados do Ministério da Saúde do território que a ONU considera confiáveis.