Quando se fala em balé no Brasil, é impossível não mencionar Dalal Achcar, uma das personalidades que marcaram a história da dança nacional, cuja trajetória atravessa décadas e continentes. Bailarina, coreógrafa, diretora artística e mentora de gerações, Dalal não para de inovar e agora dá mais um passo, desta vez no universo digital. A estreia não é nos palcos, mas com “Dalal & Companhia — Um videocast sobre dança”, disponível no YouTube do Ballet Dalal Achcar. Em vez de coreografias, ela apresenta conversas profundas, memórias afetivas e histórias inéditas de grandes nomes da cultura brasileira.
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A primeira temporada conta com 14 episódios, que serão exibidos semanalmente até 18 de dezembro, e reúne nomes como Ana Botafogo, Nora Esteves, Carlinhos de Jesus, Marcelo Gomes, Marcelo Misailidis, Rui Moreira, Alex Neoral, Carla Camurati, Aniela Jordan, Tatiana Leskova, Éric Frédéric e Ilara Lopes, oferecendo ao público um retrato da diversidade e da riqueza do universo artístico nacional e internacional. Dalal define o projeto como um privilégio.
— Poder reunir e conversar com pessoas importantes do mundo da dança e da cultura é um grande privilégio. Por meio dessas conversas, vamos poder conhecer histórias e trajetórias inspiradoras de quem movimenta o cenário artístico no Brasil — explica, com a serenidade de quem passou décadas no palco, mas ainda carrega a mesma paixão pelo movimento e pela arte.
A ideia do videocast surgiu dentro da própria companhia de Dalal.
— Não sou muito dessas modernidades, não foi algo que eu mesma planejei. Vieram me pedir para fazer, e eu acabei aceitando porque achei importante cultivar a memória da arte e registrar a história do balé no nosso país — conta.
Ela acredita que o Brasil não cultiva memórias, e é justamente por isso que muitas histórias se perdem com o tempo.
— Esse videocast ajuda a resgatar isso. Como a dança se desenvolveu, quem construiu esse caminho e para onde vamos agora — reflete.
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Para Dalal, a dança não é apenas técnica e execução, é memória, arte e emoção.
— Não é só sobre execução, não é só sobre ser perfeita na técnica. O que faz da dança uma arte é a capacidade de emocionar, de se conectar com o público — reforça.
O primeiro episódio teve Nora Esteves, mestra em balé clássico e primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Desde então, outros nomes de destaque passaram pelo videocast. Entre eles está Ana Botafogo, cuja parceria desperta lembranças carinhosas em Dalal.
— A Ana começou a ser mais conhecida depois que veio trabalhar comigo. Trabalhamos juntas no Theatro Municipal, e ela se tornou a primeira bailarina. Temos uma história de muitos anos que vai muito além do palco — conta.
No videocast, o tom das conversas é leve, espontâneo, cheio de humor e sem roteiro a ser seguido. Dalal diz que deixa os assuntos surgirem naturalmente e que é assim que aparecem as histórias mais bonitas e inesperadas.
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— As entrevistas são como um bate-papo descontraído. Há sempre jornalistas convidados, como Katy Navarro, Débora Ghivelder, Leticia Levy e Roberta Camargo, que mediam diálogos ricos e cheios de memórias, bastidores e reflexões sobre a arte e a cultura — explica.
Para Éric Frédéric, belga que é coreógrafo e maître de ballet da Companhia Dalal Achcar, participar do videocast foi uma experiência afetiva e enriquecedora.
— Ser um dos entrevistados do videocast da Dalal foi maravilhoso. Ela é a minha mentora, e trocar experiências sobre os universos da dança e do balé é muito gratificante. Receber esse carinho, a generosidade e o reconhecimento de uma das mulheres mais importantes para a cultura do Brasil, não tem coisa igual — afirma Frédéric.
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Mas o videocast não é apenas uma série de entrevistas; é também um registro histórico. Dalal revisita memórias pessoais e reflexões sobre o desenvolvimento da dança no Brasil, sobre a importância da técnica aliada à emoção e sobre a formação das novas gerações.
— Quando comecei, a gente buscava nos romances, nos livros e na literatura referências sobre como emocionar e interpretar. Hoje, o jovem é mais técnico, muito mais visual, preocupado em impressionar. A arte precisa voltar a comover, a despertar sentimento. Senão vira só execução atlética, e não arte — observa.
Dalal Achcar não se limita à dança. Ela é uma grande apreciadora das artes em geral e acredita que todas as manifestações artísticas se conectam e se inspiram mutuamente. Durante a entrevista por telefone para O GLOBO-Zona Sul ela passeava pela exposição “Re-Selvagem: a natureza inventada”, da artista francesa Eva Jospin, em cartaz em São Paulo.
— Todas as artes dependem umas das outras, todas são inspiradoras. Acredito que todo ser humano é um pouco artista. Alguns desenvolveram, outros não, mas todos são apreciadores. Todo ser humano tem ligação com a arte porque é ela que alimenta nosso espírito, a imaginação e a alma — diz.
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Por isso, o videocast inclui não apenas bailarinos e coreógrafos, mas também diretores, educadores, gestores culturais e artistas de diversas áreas, promovendo um diálogo amplo sobre cultura, memória e sociedade. Cada convidado traz uma perspectiva diferente, e é justamente essa diversidade que torna o programa relevante não apenas para o meio da dança, mas para o público em geral.
— Todos têm algo a contar que desconhecemos. A leveza do humor e os casos inesperados tornam as conversas interessantes para qualquer pessoa, não apenas para quem está no mundo da dança — garante.
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A recepção do público tem sido extremamente positiva. Os quatro primeiros episódios, com Ana Botafogo, Marcelo Gomes, Carlinhos de Jesus e Éric Frédéric, já somam 47.933 visualizações, com uma média de aproximadamente 12 mil por episódio, e a interação do público nas redes sociais confirma o interesse por conteúdos que celebrem a memória cultural e artística.
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Dalal acredita que o sucesso do videocast se deve justamente à busca por preservar histórias e registrar trajetórias de artistas que construíram a dança brasileira.
— As pessoas têm sede de arte e de histórias, e o videocast oferece isso de uma forma afetiva e acessível — comenta.
Mesmo com uma carreira já consolidada, Dalal mantém o olhar voltado para o futuro. Ela já pensa na segunda e na terceira temporadas do videocast, que deverão expandir o escopo dos temas, incluindo não apenas dança, mas também educação, cultura e sociedade, sempre mantendo o tom afetuoso e reflexivo que caracteriza o programa.
— Já estamos pensando nas próximas temporadas. Antigamente, demorávamos seis meses para começar um novo planejamento, agora precisamos pensar um ou dois anos na frente — brinca.
Para Dalal, o objetivo é que o videocast contribua para a valorização da dança e da cultura brasileira no mundo.
— Quero que o Brasil seja respeitado e reconhecido pelos artistas que tem na dança, como já acontece na música. A arte deve emocionar, provocar reflexão e marcar presença universal — completa.
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Dalal também compartilha suas reflexões sobre as mudanças na forma como os jovens se relacionam com a arte. Ela observa que, quando começou, os artistas buscavam emocionar, mas que hoje, a preocupação é com técnica e resultado imediato.
— A técnica é fundamental, mas não pode se sobrepor à emoção. O balé não é apenas uma sequência de movimentos; é expressão, comunicação e arte. Precisamos garantir que as novas gerações entendam isso, para que a dança continue sendo uma arte completa e não apenas uma execução técnica — diz.
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Da nova empreitada, o que Dalal mais apreciou foi perceber o entrosamento e a aceitação entre todos os artistas convidados. Apesar de cada um atuar em linguagens diferentes e ter personalidades distintas, todos compartilhavam uma conexão profunda por meio da arte.
— Várias pessoas me disseram que estão curtindo muito e que não querem que chegue ao fim com a exibição do último episódio no dia 18 de dezembro. Por isso, vamos continuar. E também porque tenho uma lista muito grande de convidados que eu gostaria que dividissem esse momento comigo. Quero continuar fazendo um programa para o qual todos possam contribuir e no qual que eu seja apenas o elo — destaca.
A energia e a vivacidade de Dalal também são compartilhadas dentro de sua companhia e escola de dança, na Gávea. Quando questionada sobre sua idade, ela é taxativa:
— Não respondo a essa pergunta porque não quero parar para pensar e deixar de fazer tudo o que eu faço, não quero ficar assustada. Mantenho a forma na medida do possível e ainda danço, faço meus movimentos, ainda coreografo. Busco passar para os jovens professores que não é só a técnica que é importante, mas o que faz da dança uma arte, porque isso é cultural.

