Pela primeira vez, a Conferência das Partes (COP), principal fórum de deliberação sobre a agenda climática global, será realizada no Brasil. O evento acontece em Belém (PA), entre os dias 10 e 21 de novembro, mais de 30 anos após a Rio-92, que foi a pedra fundamental para a criação das COPs. Desde o início das negociações, o governo brasileiro deixou claro o desejo de levar a conferência internacional para a Amazônia, um dos ecossistemas mais importantes para a regulação do clima no mundo, e cuja preservação é a principal marca da política ambiental da gestão Lula.
Após o encontro do ano passado — em Baku, no Azerbaijão — ter sofrido críticas sobre falta de metas ambiciosas para a reversão dos efeitos das mudanças climáticas, a presidência brasileira da COP30 promete entregar a “COP da implementação”.
Mas, afinal, para que serve a COP? Quem participa dela? Quais as conquistas realizadas ao logo dos últimos 30 anos? E o que o Brasil ganha ao sediar o evento? Veja abaixo a resposta para essas e outras perguntas.
COP é a sigla para Conferência das Partes (COP), a reunião anual dos países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês). A UNFCCC foi criada durante a Conferência Rio-92, em 1992, e a COP é o principal evento para definições de resoluções ambientais e metas climáticas. Qualquer decisão só pode ser tomada se for unânime entre as partes, e passa a valer para todos os países signatários.
Em 1995, aconteceu a primeira COP, em Berlim, na Alemanha, e, desde então, a conferência foi realizada em todos os anos, exceto em 2020, quando o evento foi cancelado em decorrência das restrições sanitárias impostas pela Covid-19.
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QUEM PARTICIPA DA COP?
Participam da conferência todos os 198 países signatários da UNFCCC. Chefes de Estado, ministros e diplomatas costumam ir ao encontro anual representando seus países.
Além disso, é comum eles ser organizarem em grupos e coalizões, por agrupamentos territoriais ou de agendas específicas. Existe, por exemplo, a G77, coalizão dos países em desenvolvimento. Além das nações, o evento reúne cientistas, líderes empresariais, ONGs e ativistas de todo o mundo.
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COMO FUNCIONA UMA COP?
As negociações de uma COP servem para alinhar os interesses globais em torno de objetivos concretos, como metas de redução de emissões de gases de efeito estufa, mecanismos de financiamento de projetos climáticos, transição para economia de baixo carbono e outros pactos globais.
A presidência da COP prioriza os temas, define objetivos e molda as discussões. Neste ano, ela será exercida pelo diplomata André Corrêa do Lago, com direção executiva de Ana Toni, secretária Nacional da Mudança do Clima. Eles respondem diretamente ao gabinete da Presidência da República.
O evento dura duas semanas. A primeira é reservada para as discussões mais técnicas e a segunda para encontros políticos e assinaturas de acordos. As metas firmadas ao final de uma COP precisam ser consensuais, e todos os países têm direito a voto. Embora resoluções dessa natureza demandem discussões ao longo do ano inteiro, é na COP que os memorandos costumam ser de fato finalizados e assinados.
Durante uma COP, há eventos acontecendo simultaneamente todos os dias. A conferência é dividida em duas zonas principais: a azul e a verde.
• A Zona Azul é onde ocorrem as negociações políticas e encontros diplomáticos. Ela é gerenciada diretamente pela ONU.
• Já a Zona Verde é focada em painéis para o público geral, debates promovidos por ONGs e até atividades culturais.
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COMO VAI FUNCIONAR A COP 30?
Quase toda a programação vai acontecer no Parque da Cidade de Belém, uma área de 500 mil m² onde funcionava um antigo aeroporto, e que está sendo transformado em um grande parque para receber a estrutura da COP30. Depois do encerramento da conferência, o espaço ficará de legado para a cidade. O parque vai se conectar ao Hangar Centro de Convenções, um espaço que já existe, recebeu reuniões do G20 em 2024 e que fará parte da Zona Azul.
O governo ainda está construindo o Porto Futuro II, em um complexo de cinco galpões cedidos pela Companhia Docas do Pará (CDP), que vai se transformar em um complexo de lazer e gastronomia para o evento.
O governo federal estima investir cerca de R$ 4,7 bilhões nos preparativos, considerando orçamento da União, recursos do BNDES e outros parceiros.
• Dedicada às apresentações e negociações políticas, essa zona possui pavilhões específicos dos países membros, como o Pavilhão Brasil.
• Os pavilhões são espaços temáticos onde se exibem as principais informações e detalhes da agenda climática e de propostas de cada nação.
• Além disso, há os pavilhões temáticos, como os da ONU, da Sociedade Civil, dos Povos Indígenas, da Fé, e de Mulheres e Gêneros.
• Só pode circular na Zona Azul quem estiver devidamente credenciado.
• Tem acesso livre para todo o público. Mas é possível que alguns eventos demandem inscrições prévias.
• Esse espaço é dedicado a atividades culturais, palestras, eventos acadêmicos e workshops organizados por empresas, ONGs e associações gerais.
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QUAL A EXPECTATIVA PARA A COP30?
Na edição de novembro, há seis eixos principais em pauta, de acordo com o governo brasileiro:
Segundo especialistas, a COP30 precisa acelerar as metas de redução de emissões de gases, frente à intensificação dos eventos extremos no planeta. Além disso, o resultado de financiamento climático da COP29, em Baku, no Azerbaijão, no ano passado, foi considerado pouco ambicioso por especialistas e observadores internacionais.
Um dos principais acordos foi a definição de um financiamento climático global de US$ 300 bilhões por ano, enquanto o objetivo inicial era o alcance de um teto de US$ 1,3 trilhão anuais. Por isso, há uma expectativa de que os resultados no Brasil superem os acordos anteriores, e o governo brasileiro vem citando que esta será a “COP da implementação”, em alusão à meta de planos mais ambiciosos, mas ao mesmo tempo tangíveis.
Entre as promessas brasileiras, há a expectativa de que o governo aprimore sua própria meta de redução entre 59% e 67% das emissões de gases de efeito estufa, que foi apresentada ano passado. Outro tema que pode ganhar protagonismo é a bioeconomia, uma agenda cara ao Brasil.
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QUANTAS PESSOAS SÃO ESPERADAS NA COP30?
A expectativa é que Belém receba de 50 a 60 mil pessoas, sendo 7 mil da chamada “família COP”, que são as equipes da ONU e as delegações de países membros.
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QUAIS PRIORIDADES A PRESIDÊNCIA DA COP30 JÁ DEFINIU?
Uma COP realizada na Amazônia vem gerando muita expectativa não só pelo simbolismo, mas também pela inclusão de novos atores ao debate. Em carta divulgada no início de março, a primeira endereçada à comunidade internacional, a presidência brasileira explicou que a COP30 terá quatro pilares: cúpula de líderes, negociação, agenda de ação e mobilização.
Os objetivos da presidência incluem fortalecer o multilateralismo, iniciar uma nova década de implementação e um mutirão global pelo combate à mudança do clima.
A carta ainda fez uma fala direta a lideranças de povos originários e citou a formação de um “Círculo de Liderança Indígena”, deixando claro que a conferência irá abraçar os conhecimentos tradicionais locais como ferramentas importantes para o debate da agenda climática.
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Em um texto de 11 cartas, o presidente André Corrêa do Lago fez uma “convocação para um mutirão global contra a crise climática”, em uma referência às tradições indígenas de “uma comunidade que se reúne para trabalhar em uma tarefa compartilhada”.
A carta ainda destacou que o evento acontece no momento em que a emergência climática “chegou à nossa porta” e até propôs uma autocrítica pelo fato de poucos resultados concretos terem avançado após três décadas de negociação.
Por fim, citou a necessidades de soluções inovadores e mencionou objetivos específicos, como o desenvolvimento de plataforma digital para facilitar a implementação de ações de mitigação, prometida na COP29; apoio à implementação de prioridades tecnológicas; foco maior em ações de adaptação.
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QUAIS OS PRINCIPAIS EVENTOS PARALELOS NA COP30?
Há vários eventos reunidos integrantes da sociedade civil. Veja os principais:
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QUAIS OS MAIORES DESAFIOS?
Nas negociações climáticas, os principais desafios passam por alinhar os compromissos de países desenvolvidos e em desenvolvimento em relação às metas de redução de gases, aliando as urgências a realidade e o contexto de cada nação, e ao financiamento climático.
O governo brasileiro vem liderando discussões em torno do pleito para que países mais desenvolvidos e industrializados, que são os que contribuem com as maiores emissões de gases de efeito estufa, paguem mais pelos danos causados ao planeta.
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Uma solução seria que essas nações destinassem mais recursos aos fundos climáticos internacionais, que ajudam a financiar projetos de mitigação e adaptação em países em desenvolvimento.
Em termos políticos, o grande desafio da COP30 será a postura dos EUA, que deixou o Acordo de Paris após decisão do presidente Donald Trump, avesso à agenda ambiental.
Apesar de reconhecerem o impacto das decisões americanas, autoridades brasileiras e internacionais vêm argumentando que estados e empresas dos EUA, que na prática são os responsáveis pelas indústrias poluidoras, já possuem metas e acordos próprios, independentes da postura de Trump, e que as negociações vão considerar essa realidade.
Em relação à infraestrutura, o principal desafio de Belém para a COP30 é a oferta de leitos suficientes. Atualmente, a cidade possui apenas metade dos cerca de 50 mil leitos esperados para o evento.
Por isso, os governos estadual e federal vêm tomando medidas para dobrar essa oferta, como contratar transatlânticos para servirem de “hotéis marítimos” e uma plataforma para anúncios de leitos para turistas, dar incentivos fiscais a hotéis, construir a Vila COP30 para chefes de estado e reformar 17 escolas para alternativa de hospedagem.
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O QUE SÃO AS NDCs?
As Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) são compromissos assumidos por cada país para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e se adaptar às mudanças climáticas.
São um elemento fundamental do Acordo de Paris, e que podem ser atualizadas a cada COP. Nas suas NDCs, as nações assumem suas metas de redução de emissões, com prazos definidos.
A atual meta brasileira, ratificada no ano passado, é reduzir as emissões líquidas de gases de efeito estufa na ordem entre 59% e 67% até 2035, tendo como base os níveis registrados em 2005.
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QUAL O ACORDO MAIS IMPORTANTE QUE UMA COP JÁ DEFINIU?
A COP3, no Japão, gerou o Protocolo de Quioto, em 1997, que foi o primeiro acordo internacional a reconhecer a necessidade de redução de emissões. Em 2023, na COP28, nos Emirados Árabes, houve outra decisão importante: o compromisso com o abandono dos combustíveis fósseis, ainda que sem prazos específicos.
Mas o acordo mais conhecido e relevante, até aqui, foi o Acordo de Paris, definido na COP21, em 2015, que aconteceu na capital francesas. Com isso, definiu-se a meta de conter o aumento da temperatura média global abaixo de 2°C sobre os níveis pré-industriais e buscar esforços “para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais”.
Pela primeira vez, um acordo vinculativo reuniu todas as nações para combater a mudança climática e se adaptar aos seus efeitos. O Acordo de Paris ainda reafirmou que os países desenvolvidos devem liderar o fornecimento de assistência financeira.