Daqui a dois dias começa o conclave, o evento mais secreto do planeta. De lá nenhuma informação pode escapar até a definição do sucessor de Francisco. Os votos continuam em silêncio para sempre — o vazamento pode custar a excomunhão para os cardeais, de acordo com os regulamentos da Igreja. O que acontece durante esses dias fora da Capela Sistina, onde ocorre a eleição, é organizado meticulosamente para o prelado não poder se comunicar com pessoas de fora e ficar até acabar a assembleia.
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Os cardeais dormem e fazem as refeições na Casa Santa Marta, onde morou o Papa Francisco. Essa será a terceira vez que o lugar é usado para abrigá-los durante um conclave. O prédio de cinco andares foi esvaziado há poucos dias. Os outros hóspedes do Vaticano foram realocados para casas paroquiais distantes. Neste ano haverá uma exceção, o cardeal Angelo Acerbi, é o único não eleitor autorizado a ficar na residência no período da votação, em decorrência da idade, 99 anos. O número de funcionários é reduzido, ficam poucas pessoas para cozinhar, servir a mesa e arrumar os quartos. Todos assinam documentos com votos de jamais divulgar o que é dito dentro da casa.
A comida é leve e simples, preparada por cozinheiros do Vaticano, que são assessorados por freiras. Os alimentos passam por um controle rígido para evitar o risco de fazer mal aos cardeais. O cardápio não costuma variar entre um conclave e outro. No de 2013, incluiu sopa de legumes, pão, legume grelhado, risoto, peixe assado, espaguete e frutas.
Feitas em espaços comuns, as refeições são completas, seguindo o hábito italiano de ter mais de uma etapa por refeição: almoço e jantar com primeiro e segundo prato, mais a sobremesa. O vinho não é proibido, os cardeais podem pedir se quiserem tomar, mas em quantidade pequena. Os alimentos têm algumas apresentações vetadas. Pela tradição, bolos e frangos inteiros, por exemplo, não entram na cozinha pelo risco de conterem mensagens vindas de fora.
Uso de celular, televisão, leitura de jornais são proibidos. Assim como ocorre na Capela Sistina, a Casa Santa Marta foi cercada por dispositivos de interferência que impedem o uso de aparelhos. Pouco tempo antes do início do conclave, a residência vai ser inspecionada para detectar possíveis câmeras ou microfones escondidos. As janelas permanecem fechadas.
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A Casa Santa Marta fica no lado oposto da Capela Sistina, dentro do Vaticano. Os cardeais fazem o percurso de cerca de 500 metros entre os dois lugares de micro-ônibus. É permito fazer o caminho a pé, se preferirem. O trajeto é completamente isolado para evitar contato com funcionários da Santa Sé.
A Casa Santa Marta tem 129 quartos. Alguns prelados, portanto, deverão dividir o mesmo espaço para dormir, visto que os votantes formam um grupo de 133 pessoas. Todos os ambientes têm decoração sóbria, nem todos são suítes. A distribuição dos quartos é feita por sorteio. Um médico e uma enfermeira ficam à disposição dos cardeais, no Vaticano.
As regras do conclave foram sendo estabelecidas aos poucos, ao longo do tempo, mas é praticamente inalterado há oito séculos. O Papa Gregório X, em 1274, foi quem instituiu o ritual oficialmente, estabelecendo que deveria ser realizado num local precisamente “fechado a chave”. O mesmo Pontífice promulgou um documento criando regras rígidas para encurtar o tempo de eleição: se a escolha de um Papa durasse mais de três dias, os cardeais passariam a ter somente o almoço ou o jantar. A partir do oitavo dia, pão, vinho e água. As regras de Gregório X surgiram para evitar o que ocorreu no conclave que o elegeu: durou dois anos e nove meses.
A duração média dos últimos dez conclaves foi de três dias. Espera-se que o próximo não ultrapassará esse tempo pelo perfil do Colégio Cardinalício, formado por uma maioria moderada.