O estudante Edson Luís de Lima Souto, morto aos 18 anos durante um protesto em 1968, que motivou uma série de manifestações no ano que terminou com a decretação do Ato Institucional de nº 5 (AI-5), o “golpe dentro golpe”, que endureceu ainda mais o regime militar, pode entrar no Livro de Heróis e Heroínas do Estado do Rio de Janeiro. Nesta terça-feira, deputados estaduais aprovaram o projeto de lei que prevê a inclusão. Cabe agora ao governador Cláudio Castro sancionar ou não o projeto de lei.
Edson Luís nasceu em 24 de fevereiro de 1950, em Belém, no Pará. O jovem vinha de uma família muito pobre, que se empenhou para enviá-lo ao Rio para concluir os estudos. Cursava o antigo curso de Madureza (Supletivo), ministrado pelos estudantes universitários no próprio Calabouço, e não ocupava qualquer cargo de liderança no movimento estudantil.
Após o tiro que varou seu coração, os colegas, indignados, levaram o corpo para a Santa Casa, na Rua Santa Luzia, a cem metros do restaurante, onde foi constatada a morte do jovem — os estudantes não deixaram nem o corpo ser levado ao Instituto Médico-Legal (IML), temendo que militares acobertassem o crime. Em seguida, rumaram para a Assembleia Legislativa, que funcionava no Palácio Pedro Ernesto, atual sede da Câmara dos Vereadores do Rio, em passeata, onde o corpo foi velado. Uma onda de protestos varreu a cidade.
O cortejo, no dia 29 de março, contou com mais de 50 mil pessoas e cruzou a Cinelândia levando o caixão coberto pela bandeira brasileira até o Cemitério São João Batista, em Botafogo, na Zona Sul. A partir de então, até o dia 10 de abril, várias manifestações ocorreram no Rio, em São Paulo e outras cidades do país. As Forças Armadas agiram e ocuparam com tropas pontos estratégicos da cidade. “O Exército manterá a ordem”, disse o ministro do Exército Aurélio Lyra Tavares, conforme informou O GLOBO no dia 1º de abril. Na mesma edição, foi publicada a declaração do presidente Costa e Silva, feita no coquetel em comemoração ao quarto ano da tomada do poder pelos militares, no Clube das Forças Armadas, em Brasília:
— Cumprimos o nosso dever e havemos de cumpri-lo à custa de qualquer sacrifício. Os agitadores pedem sangue, mas o Brasil continuará sem sangue.
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Na missa de sétimo dia do estudante, em 4 de abril, na Igreja da Candelária, no Centro, a repressão aos protestos foi violenta. A cavalaria da Polícia Militar investiu contra os presentes, e só não aconteceu uma tragédia porque “a intervenção dramática de alguns sacerdotes, ontem, na Candelária, impediu conflito de graves proporções entre cavalarianos e as pessoas que haviam assistido à missa por Edson Luís”, informou o jornal no dia seguinte.
Do laudo pericial do Instituto de Criminalística constou que a bala não fora disparada na direção do estudantes, mas ricocheteara nas paredes do restaurante, atingindo o peito de Edson Luís. O aspirante da polícia Aloísio Raposo Filho, apontado como autor do disparo, ficou impune e chegou ao cargo de coronel da PM. O restaurante do Calabouço foi fechado logo após a morte do estudante e nunca mais reabriu. Em 1997, o Estado concedeu uma indenização de R$ 137 mil a Maria de Belém Souto Rocha, mãe de Edson Luís, que comprou com a quantia uma casa para cada um dos seus três filhos.
Em 2019, o dia 28 de março é, desde 2019, reconhecido como o Dia Estadual da Juventude em Defesa da Democracia, justamente em homenagem a Edson Luís.