Na semana em que a Feira da Glória foi declarada patrimônio histórico, cultural e imaterial do Estado do Rio de Janeiro, feirantes foram impedidos de montar suas barracas em um trecho da Avenida Augusto Severo, na manhã deste domingo (13/7). Agentes da Secretaria Municipal de Ordem Pública (SEOP) e a Subprefeitura do Centro não permitiram que barracas que seriam montadas na calçada fossem instaladas. Embora estes feirantes já atuem no mesmo local há alguns anos, o órgão argumentou que esta instalação “extrapola o traçado autorizado para a feira livre”.
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— Fiz uma produção de milhares de reais, está tudo preparado, e não vou conseguir montar minha barraca. Porque de forma arbitrária, eles simplesmente disseram que não ia ter. Tentamos há anos fazer com que tudo aqui seja regularizado, e nunca conseguimos. Falamos com a Secretaria de Ordem Pública e com os responsáveis pela feira, para ter uma licença. Todo mundo quer trabalhar de forma honesta, justa e legal. Já tivemos reuniões marcadas com o responsável e desmarcada em cima da hora — desabafa Guilherme Brainer, do Risoto do Seu Zé, que atua há dois anos no local.
Os feirantes calculam que mais de 50 barracas não foram montadas neste domingo e dizem que não receberam nenhum aviso sobre esta interdição. Todas elas são de comida, e muitos já estavam com os pratos preparados para serem vendidos.
Os nigerianos Latifa Adunni Hassan e Mubarak Hassan, mãe e filho, vieram para o Brasil refugiados da guerra civil na Nigéria, envolvendo o grupo islâmico Boko Haram. No Brasil, encontraram uma oportunidade com a venda de comida típica do seu país. Na Feira da Glória, passaram a ser conhecidos pelos clientes, e neste domingo ficaram entre os vendedores que não puseram montar suas barracas.
— O sentimento é de tristeza, achei que seria mais um dia de trabalho, mas infelizmente não foi. Fiz muita comida, ninguém avisou nada que não daria para trabalhar. Acordei 2h da manhã só para começar a preparar as coisas. Chegarmos aqui e me falaram isso. Trabalhamos em outras feiras, mas infelizmente essa semana não tenho nenhum evento além desse. Só o meu prejuízo vai passar de R$ 6 mil — estima Mubarak, que já tem a Cozinha da Latifa há mais de 4 anos com sua mãe.
Guilherme ressalta que a Feira da Glória tem crescido bastante nas últimas semanas, o que trouxe também novas barracas ao local. Ele afirma que moradores da região fazem reclamações, e suspeita que alguma delas tenham precedido esta ação do poder público.
— Reclamam, por exemplo, de carros estacionados de forma irregular, mesas e cadeiras ocupando espaços, onde as pessoas não conseguem circular. Só que são problemas que, em boa parte deles, não tem como nós feirantes resolvermos. Não é responsabilidade nossa. No último domingo, alguns clientes pegaram mesas e cadeiras e colocaram na rua, em frente ao ponto de ônibus. Parece que isso foi a gota d’água — recorda ele.
Em resposta ao O GLOBO, a SEOP não citou reclamações de moradores, mas enviou a foto do caso citado pelo feirante, com as cadeiras no local. A secretaria informou que “todos os domingos, faz ações de ordenamento urbano na Feira da Glória, com o objetivo de garantir a organização do espaço público e a harmonia entre feirantes, pedestres e demais usuários da via” e que as barracas em questão possuem “estruturas que comprometem o canteiro central, incluindo árvores, jardins com grama e um ponto de ônibus localizado no trecho”.