Quando José William, de 12 anos, entrou no projeto Olhares Cariocas, na quadra da Mangueira, não imaginava que a mesma comunidade que celebra a tradição do samba pudesse também ser palco de experimentos com realidade virtual, arte digital e empreendedorismo. Neto da coordenadora pedagógica Nadja Naira, que desfila há 64 anos na Estação Primeira de Mangueira, José William é um dos homenageados no enredo da escola em 2025.
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— Eu conheci o projeto pela minha mãe, que o indicou e falou que tinha muitas coisas legais para experimentar — conta o garoto. — O que mais me surpreendeu foi usar os óculos de realidade virtual. Nunca tinha tido essa oportunidade antes, e achei incrível saber que ainda vamos explorar tantas outras ferramentas nas oficinas. Depois das aulas, percebi que gosto muito de tecnologia e consigo imaginar como será o mundo do futuro.
O bisavô do menino, Jair Campos da Silva, foi poeta da Mangueira e dá nome a uma biblioteca pública no bairro. A mãe, Laura Thalyta, desfila na Sapucaí e trabalha no barracão da escola.
Nadja, de 69 anos, chegou à comunidade aos 4 anos e já coordenou diversos projetos educativos, como o Mangueira do Amanhã e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Hoje, à frente do Olhares Cariocas, ela acredita no poder transformador da cultura aliado à tecnologia.
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— Espero que cada jovem do projeto adquira novos conhecimentos e habilidades que normalmente não teria, diminuindo desigualdades sociais — afirma Nadja. — Com isso, mostrar que mudanças positivas são possíveis na minha comunidade e nas vizinhanças.
O projeto Olhares Cariocas acaba de iniciar mais uma edição, desta vez com novidades, como a inclusão da música em sua programação. São 20 oficinas gratuitas de audiovisual, novas tecnologias e educação financeira, voltadas para jovens a partir de 12 anos, moradores da Mangueira e de outras comunidades cariocas. Com curadoria de Ana Brites e incentivo da Lei Rouanet — Programa Nacional de Apoio à Cultura, o curso aborda fotografia, vídeo, arte digital, realidade virtual, metaverso, empreendedorismo e outros temas ligados à produção audiovisual, formando jovens com conhecimento técnico e capacidade de gerar renda.
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As aulas, teóricas e práticas, são ministradas aos sábados, às 10h, no auditório da quadra da Estação Primeira de Mangueira. As inscrições são gratuitas, com vagas limitadas.
Para os alunos, a experiência vai além do aprendizado técnico. Hoje graduanda em Cinema e Audiovisual, Nayana Alves, participante da edição de 2024 e que retorna em 2025, destaca o acompanhamento próximo dos professores:
— Eles sempre estiveram dispostos a ajudar e tirar dúvidas, o que tornou as aulas muito mais proveitosas. Aprendi bastante sobre tecnologia e audiovisual, e as oficinas me deram uma visão mais ampla e segura, essencial para meu desenvolvimento e futuro profissional.
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Ela afirma que pretende seguir carreira no audiovisual.
— Essas experiências me motivaram ainda mais a trilhar esse caminho — diz Nayana, que compareceu a todas as oficinas e foi vencedora do sorteio de um smartphone.
O professor Gean Guilherme ressalta o impacto social das oficinas:
— No começo, alguns jovens têm dificuldade de lidar com os equipamentos, mas, aos poucos, ganham familiaridade e confiança. É uma oportunidade de reduzir desigualdades no acesso à tecnologia. Ver um aluno usando, pela primeira vez, óculos de realidade virtual ou criando uma animação com inteligência artificial é simplesmente incrível.
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Ele acrescenta que a troca de conhecimentos é extraordinária.
— Reunimos pessoas de diferentes idades e perspectivas, e os resultados vão da fotografia e da pintura até construções em 3D para o metaverso. Muitos alunos que nunca tiveram contato com esses recursos concluem o curso com um diploma e novas habilidades, prontos para explorar oportunidades que antes pareciam distantes — ressalta.
No Caju, o projeto-irmão Olhares Digitais oferece oportunidades para jovens a partir de 12 anos. Com foco em games, fotografia, inteligência artificial e produção de conteúdo digital, o curso gratuito é realizado na Associação Filantrópica Arte Salva Vidas. Serão oito encontros às quintas-feiras, das 16h às 19h, nos dias 2, 9, 16, 23 e 30 de outubro e 6, 13 e 20 de novembro, e as atividades culminam em uma exposição final das produções dos participantes.
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O objetivo das oficinas é formar jovens de maneira integral, oferecendo conhecimento técnico e ferramentas que podem gerar oportunidades de renda.
— Reunimos professores especializados em artes digitais, games, mídias sociais e ferramentas do metaverso — explica Ana Brites, curadora dos dois projetos. — Nosso objetivo é preparar os jovens para o mercado de trabalho, ampliar seu olhar e oferecer aprendizado de qualidade, muitas vezes com recursos que eles só conhecem pelas redes sociais.
No Olhares Digitais, os jovens participam de uma experiência prática e imersiva, aprendendo a criar games, conteúdos audiovisuais e obras digitais com o celular. De acordo com Ana Brites, os projetos Olhares Cariocas e Olhares Digitais buscam não apenas transmitir conhecimento técnico, mas também ampliar perspectivas, desenvolver criatividade e incentivar o empreendedorismo.
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— Os alunos aprendem audiovisual, arte digital, games e ferramentas de inteligência artificial com orientação sobre educação financeira e geração de renda — destaca Ana.
Ambos os projetos são realizados com incentivo e patrocínio cultural. O Olhares Cariocas é promovido pela Aloha Consultoria & Eventos, com patrocínio de Ingresso.com, G-Tech, Natcofarma Brasil e Megamatte, por meio da Lei Rouanet, e apoio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do RJ, prefeitura do Rio e Juventude Carioca. O Olhares Digitais conta com apoio de Ingresso.com, Rio Brasil Terminal, Logbit, Frontier, Summa Nativas, Land, Megamatte e prefeitura do Rio, em parceria com a Associação Filantrópica Arte Salva Vidas.
As inscrições são gratuitas e devem ser feitas presencilamente. Para se inscrever, é necessário apresentar RG, CPF e comprovante de residência.
*Esta reportagem foi publicada no especial Educação do GLOBO-Tijuca+Zona Norte de 27/09