É simbólico que Taylor Swift abra “The life of a showgirl”, seu 12º álbum, evocando o “destino de Ofélia”, tradução do título “The fate of Ophelia”, faixa inaugural do trabalho. Em “Hamlet”, de Shakespeare, a morte perturbadora da jovem Ofélia simboliza a inocência esmagada pelos jogos de poder e vingança. A personagem nada tem a ver com a morte do rei da Dinamarca, mas acaba usada pela família em meio à trama sombria. Peça involuntária de um xadrez real manipulado por figuras sempre masculinas, Ofélia enlouquece e morre afogada.
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Na canção, Taylor fala de um amor que salvou seu coração do “destino de Ofélia”. Quase um prólogo do que vem adiante. “The life of a showgirl” poderia ser uma ópera pop sobre o mito da celebridade, o “ser artista no nosso convívio, pelo inferno e céu de todo dia”, com as nuances que cercam as grandes estrelas, muitas vezes cegas e insensíveis por trás das roupas de grife. Mas Taylor Swift, maior astro de sua geração, parece consciente e amadurecida diante da sua grandeza. E obstinada a nunca se afogar.
Eis o ponto de partida para uma nova era na trajetória da cantora de 35 anos. Taylor vive o auge, o que é sempre delicado de se dizer porque, se tratando dela, o amanhã pode sempre ser maior. Mas o momento para lançar “The life of a showgirl” é cercado de prosperidade. No ano passado, ela levou pela quarta vez o Grammy de melhor álbum do ano com “Midnights”, superando Stevie Wonder, Frank Sinatra e Paul Simons, os únicos que já haviam vencido três vezes a categoria. Encerrada em dezembro de 2024, sua “The Eras” foi a turnê mais lucrativa de toda a história. Em maio, outra vitória: ela finalmente adquiriu os direitos das masters de seus seis primeiros álbuns, que haviam sido vendidos há seis anos, sem sua participação, numa operação que a forçou a regravar suas próprias canções.
Na vida pessoal, tudo segue como num conto de fadas. Depois de vários romances frustrados que viraram inspiração para muitas de suas canções (inclua aí nomes como John Mayer, Harry Styles e Calvin Harris), tudo indica que ela vive um amor em paz com o quarterback Travis Kelce, jogador badalado do time de futebol americano Kansas City. Eles oficializaram o namoro em 2023 e viraram casal chiclete, inseparável. Ficaram noivos em agosto e o mundo inteiro só falava sobre isso. “Juro lealdade às suas mãos, ao seu time, à sua energia”, diz um verso de “The fate of Ophelia”. Poderia ser um trecho dos seus votos no altar.
E tudo segue como um conto de fadas na vida pessoal. Depois de vários romances frustrados que viraram inspiração para muitas de suas canções (inclua aí nomes como John Mayer, Harry Styles e Calvin Harris), tudo indica que ela vive um amor em paz com o quarterback Travis Kelce, jogador badalado do Kansas City, time de futebol americano. Eles oficializaram o relacionamento em 2023 e viraram casal chiclete, inseparável. Ficaram noivos em agosto deste ano e o mundo inteiro só falava sobre isso. “Juro lealdade às suas mãos, ao seu time, à sua energia”, diz um verso de “The fate of Ophelia”. Poderia ser um trecho dos seus votos no altar.
Neste sentido, depois de lidar com a ambição dos tubarões da indústria, bater cabeça em relacionamentos tóxicos, conviver com as piores e as melhores esquizofrenias da internet e aguentar o peso — e a glória — de ser a maior estrela pop da atualidade, “The life of a showgirl” soa como um jogo de espelhos, um autorretrato impressionista onde Taylor Swift se pinta com otimismo, confiante, pronta para o futuro.
Esteticamente, como já era esperado, o álbum se afasta da sonoridade cinzenta de trabalhos como “Folklore” e “Evermore”, ambos de 2020, bem como da pegada meio fossa de discos como “Midnights” (2022) e “The tortured poets department” (2024). E isso se deve muito à reedição, após 7 anos, da parceria de Taylor Swift com a dupla sueca Max Martin e Shellback, que assinam com ela todas as faixas de “The life of a showgirl”. Eles são os produtores responsáveis por alguns dos maiores hits pops da artista, como “22”, “Shake it off”, “Blank space”, “Don’t blame me”.
“The life of a showgirl” é muito pop, sim, um pop vibrante que reflete o atual momento de Taylor Swift. Depois de um primeiro ato mais contemplativo, com a primeira música já descrita, e a segunda, uma ode à “Elizabeth Taylor” (“Todos os caras certos prometeram que ficariam sob os holofotes / Eles murcharam, mas você floresce”), engrena no brilho com “Opalite”, que trata de um novo céu após uma dança em meio aos relâmpagos. Denuncia tipos canastrões abusivos do showbizz em “Father figure”, nos fazendo lembrar de pais como o de Britney Spears ou o de Michael Jackson (“Posso fazer acordos com o diabo porque meu pau é maior”), e versa sobre o mundo sombrio da internet em “Eldest daughter” (“Por mais triste que pareça, a apatia está na moda / Todo mundo é cruel nos comentários”).
Taylor Swift volta a ser a boa e velha Taylor Swift em ótimas baladinhas como “Ruin the friendship”, onde detalha um amor da juventude, ou em “Wood”, talvez a melhor do disco, onde canta orgulhosa: “Nós fazemos nossa própria sorte”. Ressignifica o termo “Honey”, o nosso “querida”, na faixa homônima, exaltando um novo amor, e é debochada em “Actually romantic”, onde pinta alguém que a difama, mas que fala tanto dela, mas tanto, que, na verdade, é amor (“Ouvi dizer que você me chamou de Barbie sem graça quando a cocaína te deixou corajosa”). O jornal americano The New York Times especulou que pode ser uma indireta à Charli XCX ou à Olivia Rodrigo. Mas isso já é outra história.
Na última música, a faixa-título “The life of showgirl”, Taylor presenteia o ouvinte com a grata participação de sua “amadrinhada” Sabrina Carpenter, cantora que segue os trilhos que ela já trilhou, rumando para o estrelato absurdo que ela já rumou, como quem passasse o bastão de grande diva do pop (não o passa pois está longe de largá-lo). Juntas, cantam a história de uma showgirl, em versos filosóficos escritos do alto de quem entende do assunto com propriedade. “Quanto mais você se apresenta, mais você paga”, diz a canção. Se é no débito ou no crédito, não importa, a conta de Taylor Swift está fechando direitinho.