Em vez de tamborins, surdos e cuícas típicos de uma bateria, o som mais ouvido nos últimos dias na Sapucaí tem sido o de retroescavadeiras, pás e picaretas. O Sambódromo entrou em obras para abrir canaletas que atravessam a Avenida em dez pontos, como parte de uma intervenção que vai banir uma das “alegorias” mais antigas dos desfiles das escolas de samba. Nessas calhas, serão embutidos os cabos do novo sistema de sonorização, com tecnologia digital, e que vai aposentar de vez os carros de som usados pelos intérpretes desde a inauguração da Passarela, em 1984.
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Fim do carro de som na Sapucaí
A expectativa da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa) é que a novidade encerre uma polêmica de décadas de queixas de diretores de harmonia e de intérpretes sobre falhas no sistema de som. Mas, se o novo sistema afasta de vez o risco de os cantores tropeçarem nos cabos usados na conexão do carro com o sistema de alto-falantes da Avenida, por outro lado, trará desafios para o sambista.
Os cantores passarão a acompanhar o ritmo das baterias por fones de ouvido e terão que usar microfones direcionais semelhante aos empregados em shows internacionais. Sem as amarras dos fios, poderão ficar em qualquer ponto da escola. O presidente da Liesa, Gabriel David, explicou que toda a tecnologia empregada será apresentada às escolas no fim de novembro em um evento na Cidade do Samba como parte das comemorações do Dia Nacional do Samba. Os testes finais serão nos ensaios técnicos na Sapucaí, antes do carnaval.
— Criamos uma equipe de trabalho focada em trazer um sistema sonoro com o que existe de mais moderno no mercado. Antes, realizamos reuniões com todos os mestres de bateria, cantores e músicos das escolas para construirmos uma solução conjunta — contou Gabriel.
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Até agora, o equipamento foi testado apenas pela Beija-Flor, campeã deste ano, numa apresentação sem público, mas com parte dos integrantes da bateria e dos novos intérpretes, Jéssica Martin e Nino, que herdaram o posto de Neguinho, que se aposentou.
— O intérprete poderá cantar onde quiser. No nosso caso, defendo que seja perto da bateria para acompanhar o ritmo. Agora acabou a desculpa de problemas no som. Na verdade, o carro de som era um trambolho na Avenida — afirmou Almir Reis, presidente da Beija-Flor.
A abertura das canaletas é de responsabilidade da Secretaria municipal de Conservação, como parte de um acordo com a Liesa, que administra a Passarela durante o carnaval. A entidade não divulgou o valor investido na compra dos equipamentos.
— Os serviços vão terminar na semana que vem. Após concluirmos a abertura das canaletas, vamos recapear toda a Sapucaí — disse o secretário municipal de Conservação, Diego Vaz.
As novas calhas serão exclusivas para o sistema de som. Os cabos de energia e de outras concessionárias continuarão independentes.
Mestre Odilon, que comandou a bateria da Acadêmicos do Grande Rio, disse que a expectativa para testar a novidade é grande:
— A realidade é que o som da Sapucaí nunca foi grande coisa. A tendência é melhorar. Mas o teste final será nos ensaios técnicos.
Ciça, mestre da Viradouro e homenageado no enredo da escola em 2026, contou que tem conversado sobre a novidade com colegas de outras escolas:
— Alguns podem estranhar, mas acho que vai haver uma rápida adaptação.
A Vila Isabel já tem usado essa tecnologia sem fio na quadra desde 2022.
— É claro que nos ensaios técnicos na Sapucaí haverá uma nova avaliação — disse Douglas Rodrigues, diretor musical da azul e branco.
Para Igor Vianna, novo intérprete da Mocidade, a escola não vai inventar ao escolher onde ele vai cantar durante o desfile:
— O lugar do intérprete é atrás da bateria.