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O chope carioca e o direito inalienável de aliviar a vida

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outubro 9, 2025
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A famosa chopeira do Bar Brasil, na Lapa, que serve um dos melhores da cidade — Foto: Divulgação

E não é que beber ficou perigoso? O susto do metanol devolveu ao carioca um certo pudor etílico: o de desconfiar do que está no copo. Passei o fim de semana ouvindo donos de bares que viram a turma dos destilados bater em retirada — e o chope, sereno e cremoso, reassumir o posto de bebida de segurança nacional. Nada mais justo: no Rio, o chope é o gole confiável, o amigo que nunca muda o sabor, a espuma que protege o carioca dos excessos e das surpresas químicas. Em qualquer esquina minimamente decente, o carioca sabe que pode pedir “um chopinho” e receber não só uma bebida segura, mas um pedaço da cidade líquida que ele reconhece no primeiro gole.

Não é só questão de segurança, é de identidade. O chope é o sotaque cremoso do Rio. Nasce no jorro gelado da serpentina e chega à mesa com aquele colarinho espesso que parece feito para proteger a cidade do calor e das más intenções. Um chope bem tirado é uma coreografia carioca: o garçom inclina o copo, o jato desce firme e bate forte no fundo da tulipa, a espuma se ergue como marola em Copacabana e a borda brilha de condensação, anunciando que está tudo em seu lugar. É o mesmo ritual há décadas, do Centro à Zona Norte, das históricas chopeiras de latão da Brahma às torres cromadas dos botecos de esquina. Mudam os bairros, os sotaques e os assuntos da mesa — e até os próprios bares —, mas o chope permanece igual: um patrimônio da cidade servido em calderetas de 350 ml e memória.

A famosa chopeira do Bar Brasil, na Lapa, que serve um dos melhores da cidade — Foto: Divulgação

É que o Rio, que adora se reinventar, ainda confia mesmo é no que não muda. As novidades que me perdoem, mas tradição é fundamental: outro dia entrei num desses bares da nova geração, com parede de azulejo e dez torneiras de chope. Experimentei o Lager, simpatizei com o Pilsen, fiz cara amarga pro copo de Apa e de Ipa. Mas saí pensando que, em tempos de tanta incerteza etílica, segurança também é saber exatamente o que vai chegar à mesa. O primeiro igual ao segundo, o terceiro tão bom quanto o quinto, o sétimo encerrando com a mesma espuma do primeiro. Nenhum susto, nenhum experimento: só o prazer repetido de saber o que se bebe. E nisso o chope mais tradicional segue imbatível. É símbolo afetivo da cidade, feito aquele compromisso que a gente chegar na hora, mas chega depois do terceiro copo.

E é esse tipo de chope que reina nas casas que melhor o servem no Rio, as que sabem que não é só a marca, é preciso saber servir. No primeiro degrau deste mapa afetivo da bebida na cidade estão os templos: o Adonis, em Benfica, o Bar Brasil, na Lapa, e o Amendoeira, em Maria da Graça, lugares em que o chope chega sempre no ponto exato entre a sede e a emoção. Só meio dedinho de colarinho abaixo, mas ainda numa prateleira altíssima, vêm o Real Chopp, em Copa, o Bracarense, no Leblon, e o Cachambeer, que leva fácil o troféu de mais gelado da cidade no Cachambi. Enquanto isso, o Rio segue trocando seus barris: há chope de primeiríssima nos novos bares, como o Chanchada, em Botafogo, o Parada de Copa, e a novíssima filial do Bar da Frente, em Copacabana, o mais caçula entre os grandes e já servindo seu suspiro com pinta de veterano.

O chope no Bar da Amendoeira, na primeira prateleira das bebidas da cidade — Foto: Divulgação
O chope no Bar da Amendoeira, na primeira prateleira das bebidas da cidade — Foto: Divulgação

A Mari, dona do bar, anda orgulhosa do chope que serve — e com razão. Pra chegar na cremosidade certa, ela rodou mais de vinte bares pelo Rio, um atrás do outro, comparando cada gole como quem julga escola de samba. Descobriram que o chope com a cara do Rio, o preferido também deste colunista, é um ser vivo: respira, exige carinho e cobra atenção. Barril frio, chopeira calibrada, linha limpa — um descuido e o copo vira drama. Se para quem bebe muito e se hidrata pouco a ressaca é depois, para quem serve, chope bom dá dor de cabeça antes de dar alegria. A bebida tem que girar rápido, tirar com leveza e chegar à mesa antes que a espuma murcha denuncie o pecado. Dá uma trabalheira, mas quando chega certo, “fica bom pra c…”, diz a Mari. E fica mesmo.

No fundo, é isso: bebida boa dá trabalho, dá confiança, dá prazer: o que não dá é pra falsificar. Enquanto tem gente misturando veneno em garrafa e atrapalhando um direito inalienável — o de aliviar a vida com um copo honesto —, há quem siga lavando copo, calibrando chopeira e acreditando que o mundo melhora com um bom colarinho.

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