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Livro derruba mitos como bossa nova ter sido de elite e reforça papel revolucionário de João Gilberto

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outubro 19, 2025
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João Gilberto — Foto: Acervo/Editora Globo

Não foram poucos os livros escritos sobre João Gilberto (1931-2019), o baiano de Juazeiro que alterou o eixo gravitacional da Terra com seu violão e sua voz de suavidade e balanço sem igual. E cada um deles com uma abordagem diferente. “Ho-ba-la-lá”, do alemão Marc Fischer (1970-2011), por exemplo, é o relato de uma viagem ao Rio, feita com o propósito de convencer o arredio mestre a cantar e tocar só para ele. Referência do jornalismo musical brasileiro, Tárik de Souza, 78, também tinha uma missão: arrancar de João uma entrevista para a revista “Veja”.

Era 1971, o artista tinha acabado de voltar do México para o Brasil, onde ia fazer uma turnê. A odisseia de Tárik começou em uma conturbada entrevista coletiva, na qual usou de muita mentalização para conseguir que João se conectasse com ele e aceitasse conversar reservadamente. Não foi fácil, mas o encontro aconteceu dois dias depois e o papo se estendeu por quatro horas, entremeado por muitos números musicais. O bossanovista não permitiu que o jornalista gravasse e nem anotasse nada (a caneta só serviu para que Tárik marcasse o ritmo das músicas). Dali saíram seis páginas, históricas, com a única entrevista oficial dada por João.

— Se eu fosse fazer aquilo hoje, ia ser um fracasso, porque minha memória já era — admite hoje, rindo, o intrépido entrevistador, que dia 11 de novembro autografa na Livraria da Travessa de Ipanema “João Gilberto e a insurreição bossa nova: outros lados da história” .

— Naquela época minha memória estava a mil por hora. Então, eu não somente não gravei como, quando voltei pro hotel, podia ter anotado mil coisas e não anotei nada. No dia seguinte é que eu fui para a redação, sentei e escrevi. É como digo: eu fui o cavalo do João, quem fez a entrevista foi ele. O João foi o maior poder mental que eu conheci.

João Gilberto — Foto: Acervo/Editora Globo

As falas daquele dia sustentam a nova obra, que, como esclarece Tárik, é na verdade “um livro sobre a bossa nova”. Só que, ao se falar da bossa, não dá para passar por cima do fato de que João Gilberto é o seu principal personagem.

— O João foi o catalisador da bossa nova, ele foi o farol, foi o cara que levou a bossa adiante. Inclusive, no começo, ele foi proselitista. Foi lá gravar com Os Cariocas para mostrar como era a bossa, foi ele que chamou Alaíde Costa para o movimento, ele foi mesmo um entusiasta — defende. — No livro, fui mostrando como o João sabia o que estava fazendo, como ele foi programático. O João merece uns 50 livros, porque nunca ninguém no mundo conseguiu fazer o que ele fez de junção de voz com o violão. Ele é como Jimi Hendrix, que foi o maior guitarrista do mundo e continua sendo, porque ninguém mais chegou lá. Assim como ninguém conseguiu chegar ao que o João Gilberto fez.

Tárik confessa que a pretensão de fazer um livro sobre a bossa vinha desde 1980, quando Laurindo de Almeida (1917-1995, que foi para os Estados Unidos na década de 1940 para apresentar o violão brasileiro e não voltou mais) fez uma de suas raras aparições no país natal, para um concerto. E lhe deu uma entrevista.

— Laurindo foi o primeiro a tentar fazer a fusão da MPB com o jazz, lá nos Estados Unidos. Ele pegou o cara que trabalhava com orquestra do Stan Kenton, montou um quarteto e gravou várias músicas brasileiras. Mas a coisa não funcionou — conta. — E a entrevista que ele deu, e que está reproduzida no livro, foi muito deprimente. Ele ainda estava arrasado porque a bossa nova tinha passado na sua frente. O LP “Brazilliance” que ele fez em 1953 não deu em nada, e um tempo depois veio o “Desafinado” na gravação do Stan Getz com o Charlie Byrd e vendeu um milhão de cópias, uma coisa completamente insana. A bossa nova saiu do nicho do jazz brasileiro e foi para uma música pop mesmo, virou um fenômeno.

Um dos propósitos de Tárik com seu novo livro é o de bater de frente com o estereótipo de que a bossa nova era “um movimento de jovens brancos da Zona Sul carioca”. E, com isso, ressaltar quem primeiro atingiu o ponto de fusão da mistura que daria na bossa: Alfredo José da Silva (1929-2010), o Johnny Alf, “um preto nascido na Tijuca, filho de uma empregada doméstica e de um soldado (que morreu quando ele ainda era pequeno)”, autor de clássicos como “Ilusão à toa”, “Eu e a brisa” e “Rapaz de bem” (canção que tratava, de forma velada, sobre a questão da homossexualidade, que Alf passou vida tendo que esconder).

— Ele tocava na cantina do (radialista) César de Alencar e todo mundo ia atrás dele: o Tom Jobim (que o chamava de “Genialf”), o João Donato, o Roberto Menescal… porque Johnny Alf foi o cara que conseguiu encontrar o formato de se juntar samba e jazz — considera o jornalista. — Tem até gente imbecil, idiota, que fala que a bossa nova embranqueceu o samba. Mas como é que uma junção de samba com jazz pode embranquecer? E, além do Johnny Alf, você tem na bossa nova nomes como os de Moacir Santos, Paulo Moura, Dom Salvador, Dom Um Romão, Edson Machado, Leny Andrade, Alaíde Costa. A bossa tem muita negritude, e essa negritude está finalmente acentuada no livro.

Outro assunto obscuro sobre o qual Tárik faz questão de jogar luz com seu livro é o das relações entre a bossa nova, o rock e o pop (no capítulo “Amor de gente moça”). O rock brasileiro e a bossa, por sinal, tiveram sua estreia em disco no mesmo ano, 1958. O jornalista exibe os seus argumentos.

— O João Gilberto gravou Lobão (“Me chama”), gravou com a Rita Lee (em “Jou Jou Balangandans”) e ainda fez os Novos Baianos darem a guinada na carreira com o “Acabou Chorare” (LP de 1972). O primeiro ídolo da música rock no Brasil, ao lado da Celly Campello, foi o Sérgio Murilo, que gravou “Chega de saudade” e “Desafinado”. E o segundo foi o Roberto Carlos, que começou imitando João — cita Tárik, lembrando que quando a bossa foi para o mundo, até mesmo o Rei do Rock, Elvis Presley, gravou uma, “Almost in love” (de Luiz Bonfá, com letra de Randy Starr).

João Gilberto no Theatro Municipal: uma das fotos do livro'Álbum', de Leo Aversa — Foto: Leo Aversa
João Gilberto no Theatro Municipal: uma das fotos do livro ‘Álbum’, de Leo Aversa — Foto: Leo Aversa

E mesmo na questão da suposta falta de engajamento político da bossa, Tárik faz questão de dar outros lados da história, informando que o lema “o amor, o sorriso e a flor” vem dos versos de “Meditação”, uma canção de Tom Jobim com Newton Mendonça — um integrante do Partido Comunista.

Com riqueza de referências biográficas e discográficas, além de um vasto cancioneiro (para compor, como diz, o quadro de uma “bossa nova expandida”), o livro ainda traz um levantamento de todas as músicas que falam da bossa (a favor e contra), mostrando como ela foi, ao contrário do que alguns dizem, popular, um trend topic da época. E empilha depoimentos de vários artistas falando de que maneira o João Gilberto os impactou — de Gil e Caetano a Emicida e Thalma de Freitas.

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