Federico Brito criou em 2022 a empresa Last Trip, que se dedica à coleta de arquivos digitais e físicos que posteriormente são enviados ao espaço graças aos foguetes privados fornecidos pela SpaceX, empresa de Elon Musk. Em conversa com o jornal LA NACION, o argentino explicou como surgiu essa ideia e por que, dentro da última carga lançada em 26 de fevereiro, as cinzas de seu pai também viajaram para o espaço.

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Federico tem 51 anos e, desde os 15, esteve ligado ao espaço, quando começou a desenvolver sistemas de propulsão à base de combustível líquido para foguetes. Além de integrar uma equipe que fabrica satélites, ele é professor de biologia em uma escola pública de Vicente López, na província de Buenos Aires. A ciência e o cosmos sempre foram seus guias, até o ponto em que criou sua própria empresa, que oferece serviços de envio de cinzas humanas ou de animais para a órbita terrestre.

Essa ideia, que pode parecer excêntrica para muitos, já é uma realidade nos Estados Unidos e no Reino Unido, onde algumas empresas permitem que qualquer pessoa incorpore os restos mortais de um ente querido ou de um animal de estimação em um satélite para que flutue pelo espaço por séculos.

No entanto, o empreendimento de Brito tem um significado especial, pois ele o iniciou com o propósito de realizar o sonho de seu pai, que desejava que suas cinzas flutuassem no espaço para que seus netos “pudessem vê-lo à noite da Terra”.

O foguete SpaceX que enviou o satélite com os módulos de Federico Brito para a órbita da Terra — Foto: Divulgação

Sem perder tempo, o empreendedor registrou a empresa Last Trip em 2022 e, em 3 de janeiro de 2023, lançou o primeiro módulo com cinzas de pessoas e animais. Como sentiu que ainda faltava algo, incluiu arquivos digitais das pessoas e dos animais falecidos. Isso despertou o interesse de outros clientes, que também decidiram contribuir com seus próprios materiais.

A empresa se tornou um sucesso, especialmente por ser a primeira na América Latina a oferecer esse serviço, o que representou um feito inédito. Graças à divulgação e ao interesse do público, em fevereiro deste ano, foi enviado um segundo módulo por meio de um foguete da SpaceX. Nele, foi adicionada uma pequena porção das cinzas de seu pai, juntamente com as de outras pessoas e um compilado digital.

Para gerar consciência sobre a iniciativa, Brito desenvolveu o segundo projeto com o lema “Celebrar a vida na Terra”, no qual convidou as pessoas a contribuírem com arquivos digitais em cinco áreas: “Meio ambiente, saúde, arte, esporte e educação”.

“Dentre essas categorias, os artistas foram os que mais contribuíram. Eles representaram 80% do material enviado”, destacou o empreendedor. Ele justificou a proposta: “Se vamos preservar arquivos digitais sobre a vida na Terra, faz todo sentido preservar arquivos sobre meio ambiente, saúde, arte, esporte e educação”.

O satélite permanecerá em órbita geoestacionária por 300 anos ou mais, dependendo da resistência de seus materiais — Foto: Divulgação
O satélite permanecerá em órbita geoestacionária por 300 anos ou mais, dependendo da resistência de seus materiais — Foto: Divulgação

Nesse pacote, foram incluídas obras literárias e pinturas. Além disso, Brito ressaltou que o projeto foi ainda mais abrangente: “Neste segundo voo, Sebastián Battaglia enviou uma campanha publicitária de seus clubes, os SB5. Então, percebi que não se tratava apenas de arquivos digitais de familiares falecidos, mas também de arquivos de artistas e até de campanhas publicitárias, algo que pode ser explorado a partir do espaço”.

Um marco importante foi o envio de uma carta do escritor Jorge Luis Borges ao espaço, embora em formato digital. Brito, que possui o documento original, revelou que a carta data de 1962.

Essa foi a maneira que Federico Brito encontrou para imortalizar arquivos e informações relevantes do nosso tempo, que ficarão preservados na órbita terrestre por 300 anos ou até mais, dependendo da durabilidade do satélite e de sua resistência ao ambiente cósmico.

“No segundo voo, o satélite que está passando atrás da Lua neste momento [durante a entrevista] voltará e será atraído para uma órbita geoestacionária ao redor da Terra. É uma órbita tão distante que o tempo de vida orbital é de pelo menos 300 anos ou mais”, explicou.

Uma réplica digital da pintura do artista Mario Lange foi enviada no último satélite — Foto: Divulgação
Uma réplica digital da pintura do artista Mario Lange foi enviada no último satélite — Foto: Divulgação

O professor e especialista em propulsão de foguetes explicou que a empresa precisa comprar módulos que são incluídos nos satélites. Como os satélites pertencem a outras companhias, é difícil acompanhar sua localização em tempo real após serem lançados além da exosfera. Por isso, ele pretende desenvolver seus próprios satélites para que os clientes possam rastrear a trajetória em tempo real, sem depender de terceiros.

O objetivo de Federico é oferecer um serviço que permita às famílias, após a cremação de um ente querido ou animal de estimação, enviar um grama de cinzas ao espaço. Atualmente, o custo para essa unidade de peso é de 500 dólares ao contratar a Last Trip. Se o serviço for realizado por meio de uma funerária, o valor pode variar.=

O empreendedor destacou que, através do site oficial da empresa ou do perfil do Instagram da Last Trip, qualquer pessoa pode entrar em contato para participar desse projeto. O terceiro módulo, que será lançado ainda este ano, conterá exclusivamente arquivos digitais artísticos de argentinos e estrangeiros.

Argentino cria empresa de transporte espacial e envia as cinzas de seu pai para a órbita da Terra por 300 anos