Em meio a muitos debates sobre inovação e criatividade no mercado audiovisual, um “primo antigo”, mas jamais ultrapassado, da indústria da economia criativa e da produção de conteúdo foi o protagonista no primeiro dia de debates do Rio2C: o jornalismo. O apresentador do Jornal Hoje César Tralli se juntou à âncora do Jornal da Globo Renata Lo Prete para uma reflexão sobre o papel do jornalismo na construção de confiança com o público nos dias atuais.
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A conversa foi realizada em meio ao Summit Acontece Globo, em comemoração aos 100 anos de Globo. A data comemorativa, não por acaso, celebra o jornalismo da empresa a partir da fundação do jornal O GLOBO, em 29 de julho de 1925.
Em um papo sem a presença (ou a necessidade) de mediação, Tralli e Lo Prete falaram sobre a importância do jornalismo em tempos de fake news, destacando a realidade como pilar da categoria e da própria democracia. Antes do início da conversa, um vídeo foi apresentado mostrando reportagens de programas do grupo Globo desmentindo notícias falsas, incluindo o notório desabafo fora do script de William Bonner no Jornal Nacional diante das fake news sobre vacinas durante a pandemia da Covid-19.
— Uma alegria tratar de um tema, para quem trabalha com informação, que é muito mais do que técnico. É uma questão existencial. A confiança é um elemento essencial da comunicação. Com o passar do tempo, fui descobrindo que a confiança não tem a ver com erro. Todos erramos, eu sofro muito quando erro. Mas o erro não é por si só um elemento que destrói a confiança. Você pode errar a pronúncia de um nome ou não dar importância a uma história que vai se revelar maior. O público fica com você se ele percebe em você o esforço de acertar e a humildade de admitir o erro — destaca Lo Prete. — Este cem anos nada mais é que a construção de uma confiança ao longo do tempo em diferentes plataformas. Confiança não é cheque em branco e não se constrói da noite pro dia. É um patrimônio que tem que ser cuidado o tempo inteiro.
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A apresentadora compartilhou dados de pesquisa da Universidade de Harvard que revelou que o público não espera que o jornalista domine todos os assuntos, mas que seja capaz e transparente sobre o que ainda não sabe. Além disso, o público espera que o jornalista siga códigos de transparência e ética, explicando seus processos e critérios de escolha e apuração.
Tralli fala da dificuldade no combate à desinformação diante do avanço das ferramentas de inteligência artificial.
— Está cada vez mais desafiador checar a verificação da autenticidade de fotos, vídeos e áudios — destaca o jornalista. — Nossa equipe usa 19 softwares de diferentes lugares do mundo para fazer a verificação de informações e conteúdos. O trabalho de construção de confiança passa por esse desafio tecnológico da construção da IA. Hoje, não basta você falar que a informação é falsa, você precisa mostrar como foi feita aquela falsificação.
O jornalista, há 32 anos na Globo, fala sobre a dificuldade de combater desinformação em um universo de informações fragmentadas, com muitas notícias falsas sendo impulsionadas nas redes sociais e aplicativos de mensagens. Ele destaca que desde 2018, com a criação do Fato ou Fake, já foram realizadas mais de 5 mil checagens de desinformação pelas equipes de jornalismo do grupo Globo.
— Somos carrascos de nós mesmos no sentido de tentar fazer o melhor o tempo inteiro. E essa busca incessante pela notícia da forma mais informativa e isenta possível. Temos que fazer um contraponto a este mundo de desinformação que permeia as redes — afirma Tralli. — Não somos uma biblioteca. Temos que estar o tempo todo estudando e nos aprimorando.
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No painel mais disputado do primeiro dia de Rio2C, os comunicadores falaram sobre o relacionamento com o público e com as fontes, destacando conceitos como transparência e proximidade. Neste sentido, eles citaram as fontes em off como um expediente importante, mas que não pode ser banalizado em razão de um compromisso mais importante com o público. Outra palavra chave para dupla é isenção.
— Precisamos recuperar o valor da palavra isenção que foi massacrada no debate político. Ela foi tratada como um defeito, mas é o valor de nos colocarmos em uma distância crítica dos interesses em conflito — explica Lo Prete, completando 40 anos de jornalismo em 2025.
Durante a conversa, Tralli relembra a cobertura recente do conclave que elegeu o Papa Leão XIV como exemplo da importância dos processos jornalísticos. O jornalismo cita que muitos espectadores se surpreenderam com a exibição rapidamente de um perfil do novo Papa após a eleição.
— Já tínhamos prontos os perfis de 37 papáveis. Os primeiros começaram as ser feitos no segundo semestre de 2023, há dois anos, quando o Papa Francisco começou a sofrer com problemas de saúde — conta.
O Rio2C acontece até o próximo domingo, 1º de junho.

