As duas adolescentes de 17 anos desciam de bicicleta elétrica por uma rua tranquila de uma pequena cidade na segunda-feira, sob a luz inclinada de um fim de tarde outonal de clima ainda de verão. As garotas, Maria Niotis e Isabella Salas, amigas próximas, estavam acompanhadas da família de Maria e iam tomar sorvete.
De repente, um carro surgiu disparado rua acima, contou o tio de Maria, Emmanuel Niotis. — Na próxima coisa que se sabe, havia corpos voando pelo ar — disse ele.
Uma das bicicletas retorcidas ficou incrustada na parte dianteira destruída de um Jeep SUV. O motorista fugiu brevemente, disseram os promotores. As duas jovens foram declaradas mortas no hospital.
E, à medida que o nome do motorista começou a circular, para as famílias e amigos das meninas em Cranford, Nova Jersey, a dor deu lugar à fúria.
O motorista, segundo eles, era Vincent Battiloro, também de 17 anos, que estaria obcecado por Maria havia meses, pelo menos. A mãe de Maria contou a uma amiga que já havia chamado a polícia várias vezes porque ele estacionava em frente à casa da família e se recusava a ir embora. Duas amigas de Maria disseram que ele a assediava. Na internet, onde Vincent tem dezenas de milhares de seguidores como streamer de videogame, ele havia zombado de Maria e de sua mãe uma semana antes do acidente, mandando pizzas para a casa delas como trote.
Os promotores não divulgaram o nome do motorista por causa da idade, descrevendo-o apenas como um jovem de 17 anos da vizinha Garwood. Mas um banco de dados do tribunal estadual mostra que um motorista chamado Vincent Battiloro recebeu 14 intimações de trânsito por um acidente ocorrido em Cranford na segunda-feira. Uma pessoa familiarizada com a investigação do acidente fatal confirmou que as intimações estavam relacionadas a esse caso. Outra confirmou que o motorista era de fato Vincent Battiloro. Ambas falaram sob anonimato, por se tratar de uma investigação em andamento.
As intimações incluem acusações por deixar a cena de um acidente com vítimas, direção perigosa, dirigir sem habilitação e trafegar a pelo menos 112 km/h em uma rua cujo limite era de 40 km/h. As intimações em nome de Vincent foram divulgadas primeiro pelo site NJ.com.
Na noite seguinte ao acidente, a situação tomou um rumo surreal: Vincent estava de volta ao YouTube, transmitindo ao vivo de seu habitual sofá marrom.
— E aí, pessoal, tudo bem? — disse ele descontraído. — Estamos de volta com mais uma live e esta vai ser um pouco diferente das anteriores.
Poucos minutos depois, começou a explicar: — Numa cidade vizinha, infelizmente, duas meninas morreram em um atropelamento com fuga do local — disse. — Tem circulado muita desinformação na internet. Mas digo o seguinte: desejo minhas mais sinceras condolências às meninas, perdidas nesse trágico acidente. — Em seguida, afirmou que não estava — autorizado a falar sobre o assunto todo — e mudou de tema.
Em grupos locais no Facebook e em um memorial improvisado no local do acidente, as pessoas expressaram indignação: por que Vincent estava em liberdade? Muitos se perguntavam se isso teria a ver com o fato de seu pai ser policial em outra cidade de Nova Jersey e outro parente ser chefe de polícia em Westfield, município próximo. (O gabinete do promotor do condado de Union afirmaria depois que o motorista havia sido liberado após interrogatório na segunda-feira — enquanto prosseguem as investigações.)
Na quarta-feira, dois dias após o acidente, o gabinete do promotor informou que o motorista havia sido preso sob duas acusações de homicídio doloso em primeiro grau, um crime que pressupõe causar a morte de alguém — intencionalmente, conscientemente ou propositalmente.
Em comunicado à emissora Fox 5 New York, após o anúncio das prisões, as famílias das meninas disseram: — Isso não foi um acidente de bicicleta elétrica, e não foi um atropelamento com fuga.
A família de Vincent não respondeu a uma mensagem de voz deixada em sua casa. Os promotores se recusaram a dizer se a pessoa acusada tinha advogado, e um funcionário do tribunal do condado de Union não quis liberar informações sobre o caso.
O chefe de polícia de Westfield, Christopher Battiloro, tio de Vincent, escreveu em uma publicação no Facebook na quarta-feira que, embora o suspeito do acidente fatal — seja parente meu, ele não é meu filho nem membro da minha família imediata. — Ele acrescentou: — Como policial, mantenho plena fé e confiança em nosso sistema de justiça criminal.
Uma igreja ortodoxa grega na vizinha Union ficou lotada de pessoas em prantos no velório de Maria, na noite de quinta-feira. Seu caixão branco estava coberto com uma bandeira da Grécia. Sua mãe, Foulla Niotis, que trabalha em um restaurante em Cranford, tremia enquanto falava. Maria, disse ela, — não era apenas minha filha. Era minha melhor amiga.
Maria trabalhava em uma cafeteria e queria ser cosmetóloga, enquanto Isabella atuava em peças da escola e do teatro comunitário e cantava em corais, segundo os obituários publicados online.
Ao longo da semana, centenas de pessoas visitaram o local do acidente para lamentar e deixar flores e velas. Leyton Buckley, de 16 anos, que disse ser namorado de Maria, a descreveu como — simplesmente a pessoa mais doce.
— Você poderia ser um completo estranho para ela, e ainda assim ela deixaria você chorar no ombro dela — disse. Leyton também era amigo de Isabella e contou que ela tinha um senso de humor contagiante. — Sempre que estava com ela, eu não conseguia parar de rir — disse.
Tammy Carbajal, colega de Foulla Niotis no restaurante Cranford Station House, contou que Foulla já havia dito que Vincent estacionava em frente à casa delas e ficava horas parado, e que a família chamara a polícia várias vezes por causa dele.
Elio Martinez, de 17 anos, outro amigo de Maria, disse que ela e Vincent estudaram juntos e que ela havia reclamado ao diretor e à polícia sobre ele. A polícia de Cranford se recusou a comentar, assim como os responsáveis pela escola que Elio afirmou que eles frequentaram.
Elio mostrou a um repórter do New York Times capturas de tela de uma troca de mensagens no Instagram em abril entre ele e uma conta ligada a outros perfis de Vincent nas redes sociais.
Na conversa, Elio pedia a Vincent que parasse de incomodar Maria, que na época era sua namorada. Vincent ameaçou divulgar fotos nuas dela.
— Não vou deixá-la em paz até que ela me peça desculpas — escreveu. Vincent então enviou a Elio a foto nua de uma garota.
— Eu fiz isso com uma garota — escreveu Vincent. — Vou fazer com outra. — E acrescentou: — Continue falando demais e eu crio nudes da sua garota agora mesmo.
Em uma transmissão ao vivo três semanas depois, Vincent disse a seus seguidores que havia feito — uma pausa nas streams — por causa de — acusações ridículas que essa garota está fazendo contra mim —, que — a polícia se envolveu e a escola se envolveu — e que ele tinha sido suspenso.
Durante uma live em 23 de setembro, Vincent falou abertamente sobre sua hostilidade contra Maria e sua família.
— Vocês todos sabem que tenho uma vingança contra essa garota por me acusar de enviar pornografia — disse.
E acrescentou: — Acho que você está com fome. Vamos te mandar uma pizza. — Ele ligou para a Domino’s e pediu duas pizzas de pepperoni. — Será pago em dinheiro na entrega — disse.
A transmissão de Vincent na noite seguinte ao acidente foi a última. Catorze minutos após começar, ele fez uma pausa para reconhecer seu público.
— Construí uma ótima base de seguidores no TikTok, com 39 mil seguidores, que venho acumulando desde 2020, e quero agradecer a cada um de vocês — disse. — Amo vocês até a morte absoluta. E, independentemente do que acontecer, se vocês não me virem transmitindo por um tempo, vocês vão entender o motivo.
