O tom inicialmente solene da cerimônia de anúncio dos projetos vencedores do edital Viva Pequena África foi substituído por um clima de emoção e festa à medida em que os 11 projetos vencedores do certame — promovido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e entidades parceiras — eram anunciados, na manhã desta terça-feira, no Armazém Docas Pedro II, bem em frente ao Cais do Valongo, marco histórico do Rio e principal porta de entrada de africanos escravizados no Brasil. Serão R$ 5 milhões distribuídos para fomentar iniciativas culturais estabelecidas na região.
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Os recursos serão distribuídos de acordo com o previsto nos projetos apresentados e cada entidade receberá entre R$ 308,7 mil e R$ 500 mil para promoção de iniciativas visando à preservação da memória, qualificação profissional, atividades educacionais, culturais e de inclusão digital. Ao todo, foram apresentados 45 projetos que passaram por uma seleção conduzida pelo Consórcio Viva Pequena África, formado pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), Diáspora.Black e Feira Preta.
— Normalmente, as pessoas, quando choram de emoção em público, pedem desculpa. Eu não vou pedir desculpa. E posso chorar mesmo e à vontade. Essa conquista mostra a potência da comunidade negra. E é importante dizer que cada ação do Estado brasileiro ou de uma organização brasileira que tem o poder do capital está devolvendo para a sociedade, está nos devolvendo simbolicamente o que os africanos e seus descendentes construíram nesse Brasil — disse a escritora Conceição Evaristo, uma das idealizadoras da Casa Escrevivência, vencedora geral do edital. — Essa ação está dentro inclusive das ações reparadoras que nós merecemos, que o povo negro merece.
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Além da Casa Escrevivência, foram contemplados os projetos Caminhos de Tia Ciata, da Casa da Tia Ciata; Providência, a Favela da Pequena África, do Instituto Entre o Céu e a Favela; Cultura e Educação para a Liberdade, da Casa Amarela Providência; Nas Pegadas do Prata Preta, do Cordão do Prata Preta; Hip Hop Feito o Efeito, do Instituto Efeito Urbano; Casarão Cultural João de Alabá; Caminhos da Ancestralidade, do Bloco Carnavalesco Coração das Meninas; Memórias Negras em Movimento, da Associação Cultural Recreativa Filhos de Gandhi; Por um fio, do Providenciando a Favor da Vida, e a reforma do barracão de Candomblé mais antigo da Pequena África, o Ilê Asé Iyá Omi Funfun, representado pela Associação Brasil Cultural.
— É uma trajetória de uma vida toda, são 60 anos. É a única casa de Candomblé que resistiu a tudo na Gamboa graças ao trabalho de todos na casa. Quando anunciaram que fomos contemplados, passou um filme na cabeça. É um sonho, vamos poder dar continuidade, foi o primeiro edital que participamos, vai ficar marcado — disse a Yalorixá Glória de Yemanjá, do Ilê Asé Iyá Omi Funfun.
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A seleção dos projetos levou em conta seis critérios: relevância, impacto social, tradição e trajetória, maturidade organizacional, viabilidade técnica e poder de articulação.
— É uma emoção muito grande ver nosso trabalho, nossa luta pela ancestralidade ser reconhecida num projeto ambicioso como esse. Vai ajudar bastante a instituição, nossos projetos culturais e festas tradicionais que mostram o legado do povo negro — disse Célio Oliveira, presidente do Filhos de Gandhi.
Além de recursos do próprio BNDES, o edital conta com a colaboração de instituições parceiras como a Open Society Foundation, a Ford Foundation, o Instituto Ibirapitanga e a Fundação Itaú.
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— A Pequena África é um patrimônio histórico do povo brasileiro, tem que ser tratado com essa dignidade. É um território de resistência e de criação. Apoiar essas iniciativas significa reconhecer a importância histórica desse espaço, impulsionar a economia criativa, a geração de renda e o fortalecimento das organizações negras — disse Aloizio Mercadante, presidente do BNDES.