As “laranjinhas” instaladas em postes da cidade do Rio exibem a mensagem: “Lixo é aqui”. Mas, para além do destino de papéis de bala e guimbas de cigarro de cidadãos bem-intencionados, essas papeleiras são alvos frequentes de furtos e vandalismo. Na Lagoa Rodrigo de Freitas, 26 delas foram depredadas na semana passada, apenas um mês depois de serem instaladas — uma triste realidade que se espalha pela cidade. A Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) calcula gastar cerca de R$ 1 milhão por ano para recolocar essas peças. De janeiro até o último dia 19, foram repostas 2.042 — quase oito por dia, em média.
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Copacabana é, até o momento, o bairro que mais precisou ter lixeiras trocadas por conta de vandalismo ou furto: foram 455 este ano. Na esquina da Avenida Nossa Senhora de Copacabana com a Rua Joaquim Nabuco, um dos “alvos” segue de pé, mesmo que já desencaixado da tampa e fora do prumo. O cenário pode ser visto em outros postes do bairro, com na Avenida Atlântica e na Rua Barata Ribeiro, onde as papeleiras foram trocadas há pouco tempo.
— Fico envergonhado porque botam a lixeira nova para o povo zelar e não jogar lixo na rua. E fazem uma coisa dessas. É só pelo prazer de destruir — lamenta o comerciante Edmilson Vieira.
Juntos, Copacabana, Centro (303) e Ipanema (226) estão no topo do ranking do vandalismo. Na Rua do Riachuelo, por exemplo, via que liga o Centro à Lapa, a Comlurb precisou recolocar 25 papeleiras no fim de agosto. Mas algumas delas voltaram a ser destruídas logo em seguida, como uma entre a Rua do Senado e a Avenida Henrique Valadares. A ação surpreendeu a costureira Ana Sales, moradora da região.
— Não fazia nem dois dias que tinham instalado (a lixeira nova). Não sei nem para o que serve: vão fazer o que com isso? Quando não levam, quebram — reclama Ana.
Sua filha, a educadora Tenily Sales, conta que normalmente isso acontece aos poucos. Primeiro, quebram a tampa da lixeira. Depois, levam a borda, até que ela desaparece da rua.
Presidente da Comlurb, Jorge Arraes diz que a empresa tem a sensação de estar enxugando gelo em alguns pontos da cidade. Segundo ele, foi detectado que uma base de metal, instalada para que cigarros fossem apagados nas papeleiras, era o alvo de criminosos. Eles estariam furtando toda a papeleira apenas para vender aquela pequena peça em ferros-velhos clandestinos. Por isso, as novas “laranjinhas” vêm sem esse elemento metálico, mas, mesmo assim, o vandalismo continua.
— É um fenômeno antropológico meio inexplicável, porque (a lixeira) não tem valor comercial algum — diz Arraes. — Quando a papeleira está vandalizada, o próximo cara que passa, a não ser que seja muito consciente, acaba jogando o lixo no chão e isso atrapalha muito a produtividade do gari.
Atualmente, os únicos metais presentes na estrutura são para prender as lixeiras nos postes. Mas a Comlurb já estuda usar materiais alternativos nessa fixação, como plástico ou fibra de vidro. Essa opção estará na próxima licitação para comprar dez mil peças no ano que vem.
Hoje, a cidade tem 38 mil papeleiras. Após avarias por vandalismo, algumas delas são transformadas — numa fábrica da Comlurb em Campo Grande, na Zona Oeste — em carrinhos, chamados de Lutocar, que auxiliam os garis na varrição. São produzidos 50 por mês. Outras viram pás de lixo.
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Numa tentativa de educar em vez de punir, a Comlurb vai distribuir panfletos, com mensagens como “Deixe nossas lixeirinhas em paz”, nas ruas nas próximas semanas.
No episódio recente na Lagoa, teve papeleira que foi parar até dentro d’água, conforme noticiado pelo blog do jornalista Ancelmo Gois, no GLOBO. As lixeiras foram repostas em poucos dias. Mas, na esquina da Avenida Borges de Medeiros com a Rua Gilberto Cardoso, uma lixeira jogada no chão chamava a atenção no início desta semana.
— Quando cheguei aqui de manhã, a lixeira estava certinha. Isso são os “cracudos” (usuários de crack) que tiram a cesta para pegar o que tem dentro e não colocam no lugar — disse o comerciante Waldir Figueiredo.
Barra da Tijuca, Leblon e Tijuca também estão na lista com mais casos de depredação de lixeirinhas. Desde 2021, o gasto acumulado do governo com reposição foi de R$ 3,9 milhões, incluindo cestas, fechos e fitas para a fixação nos postes.
De acordo com a arquiteta e urbanista Luciana Mayrink, essas lixeiras são instaladas em pontos estratégicos das cidades para diminuir a varrição manual dos garis. Quando elas são alvo de vandalismo, os efeitos vão do alto custo de reposição, com um investimento que podia ser destinado a outras melhorias urbanas, aos alagamentos, com bueiros entupidos pelo lixo que deveria estar recolhido.
— Isso acaba gerando, para a população, uma sensação de abandono e degradação do espaço público — observa Luciana, conselheira do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU-RJ).
Como opção às papeleiras, a Comlurb tem instalado contêineres, que são de aço e bem maiores. Já são 12 mil na cidade. Segundo o presidente da companhia, eles não têm sido alvo de criminosos, apesar de já haver registros de incêndio. Esses equipamentos, esvaziados pelos caminhões de coleta, são alugados pela empresa.