Enquanto as negociações indiretas acontecem no Egito, Israel parou por um minuto nesta terça-feira para marcar os dois anos do ataque do Hamas que deflagrou a guerra em Gaza. Às 6h29 no horário local (00h29 em Brasília), mesmo momento em que Hamas lançou sua ofensiva em 2023, dezenas de regiões em todo o país fizeram silêncio em tributo às vítimas e aos reféns.
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Exatamente dois anos atrás, no fim do feriado judaico de Sucot, militantes do Hamas cruzaram a fronteira de Gaza e realizaram o ataque mais mortal da História de Israel, matando 1.219 pessoas. Parte da ação terrorista ocorreu no festival de música Nova, onde mais de 370 jovens foram assassinados. Nesta terça-feira, familiares voltaram ao local para prestar homenagens às vítimas e aos reféns. Dos 251 sequestrados, 47 ainda estão em Gaza, sendo que 25 estão mortos, segundo o Exército israelense.
O ex-refém Eli Sharabi, que ficou 491 dias de cativeiro, compartilhou uma reflexão profundamente pessoal nas redes sociais. Em sua publicação, ele lamentou a perda de sua esposa, Lian, de suas filhas Noya e Yahel, e de seu irmão Yossi, todos mortos pelo Hamas. Sharabi também pediu a devolução do corpo de seu irmão e a libertação de seu amigo Alon Ohel, que foi mantido ao lado dele em túneis em Gaza.
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“Nossas vidas pacíficas e felizes se transformaram em um inferno, com uma perda inimaginável que me acompanhará a cada momento até o meu último dia. (…) Já sofremos o suficiente, merecemos uma realidade diferente. Queremos começar a nos curar”, escreveu Sharabi.
Orit Baron, de 57 anos, mãe de Yuval, umas das vítimas daquele 7 de outubro, esteve no local onde ocorreu o festival de música nesta terça, e afirmou que o luto permanece vivo.
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— Estou aqui para estar com ela, porque foi a última vez que ela esteve viva, aqui com seu noivo, Moshe, que também foi morto naquele dia — refletiu Baron. — É como se estivesse aqui comigo agora.
O sentimento é compartilhado por Gal Gilboa-Dalal, irmão de Guy, sequestrado no festival Nova e ainda mantido como refém em Gaza. O rosto de Guy está estampado em cartazes por todo o país, do aeroporto aos muros de jardins urbanos, e notícias sobre sua condição aparecem regularmente nas manchetes.
— O tempo tem passado de uma forma muito estranha. De certa forma, sinto como se estivesse com ele em Nova ontem e como se não visse meu irmão há mais de 100 anos — afirmou Gilboa-Dalal em entrevista ao jornal britânico Guardian. — É tão difícil sentir falta dele o dia todo, todos os dias. Fica cada vez mais difícil ver a luz no fim do túnel.
Dalia Cusnir, cunhada de Eitan Horn — um dos cerca de 25 reféns que se acredita ainda estarem vivos em Gaza — contou que ele foi sequestrado no kibutz Nir Oz junto com o irmão, Lair, libertado no início deste ano. À rede britânica BBC, Dalia afirmou que a família resiste para trazê-lo de volta e se uniu a outros parentes de reféns em protestos diante da casa do premiê Benjamin Netanyahu nesta terça.
— Estamos lutando e resistindo. Vamos trazê-lo de volta e, assim, poderemos viver nossas vidas e ser felizes. No dia 7 de outubro de 2023, eu deixei de ser eu mesma — disse Cusnir, acrescentando que precisa-se de um “plano para o dia seguinte”. — Não se trata apenas de libertar os reféns e parar a guerra. Trata-se também de um plano para o dia seguinte. Há cerca de 2 milhões de pessoas em Gaza, e elas precisam de um novo amanhã.
Repercussão em Gaza
Em comunicado, o Hamas descreveu os meses desde os ataques de 7 de outubro como “dois anos de dor, injustiça, opressão e grande sofrimento, com custos elevados”. O grupo afirma que as mortes de “civis indefesos” em Gaza foram recebidas com “vergonhoso silêncio internacional” e “abandono sem precedentes de países árabes”.
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O comunicado também presta homenagem aos membros do Hamas que morreram — incluindo o líder do Hamas, Yahya Sinwar, morto por tropas israelenses em outubro de 2024.
Enquanto isso, a ofensiva israelense em Gaza já provocou ao menos 67.160 mortes, em sua maioria civis, segundo dados do Ministério da Saúde administrado pelo Hamas, considerados confiáveis pela ONU. Bairros inteiros foram arrasados, e centenas de milhares de palestinos vivem em condições precárias, sem acesso adequado a alimentos, água e saneamento.
— Perdemos tudo nesta guerra: nossas casas, nossos parentes, nossos amigos, nossos vizinhos — disse Hanan Mohammed, de 36 anos, deslocada de sua casa em Jabalia. — Mal posso esperar que um cessar-fogo seja anunciado e que esse derramamento de sangue e morte sem fim acabe. Nada resta além de destruição.
Após dois anos de conflito, 72% da população israelense está insatisfeita com a condução da guerra pelo governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, segundo uma pesquisa recente.
“Estamos indo muito bem”
Israel e o Hamas enfrentam uma crescente pressão internacional para encerrar a guerra. No mês passado, um relatório de investigadores independentes da ONU indicou que Israel cometeu “genocídio” em Gaza enquanto grupos de direitos humanos acusam o Hamas de crimes de guerra em 7 de outubro. Ambos os lados rejeitam as acusações.
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Na semana passada, o presidente americano, Donald Trump, revelou um plano de 20 pontos que inclui um cessar-fogo imediato assim que o Hamas libertar todos os reféns, o desarmamento do grupo e uma retirada israelense gradual de Gaza.
As negociações indiretas começaram na segunda-feira na cidade turística egípcia de Sharm el-Sheikh, sob forte esquema de segurança. Segundo duas fontes palestinas próximas à equipe de negociação do Hamas, as negociações foram “positivas”.
— Acho que estamos indo muito bem e o Hamas está concordando com algumas coisas muito importantes. Acho que chegaremos a um acordo — disse Trump após o primeiro dia de negociações no Egito.
(Com AFP)