Apontado como o “lobista do Comando Vermelho” Luiz Eduardo Gonçalves da Cunha, o Dudu, está preso preventivamente na penitenciária de segurança máxima Laércio da Costa Pellegrino, conhecida como Bangu 1. Ele foi assessor do ex-deputado estadual Tiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Jóias, também preso supostamente por ligações com o tráfico. Desde a operação no último mês que levou os dois à cadeia, a defesa de Dudu tenta liberta-lo ou transferi-lo de presídio. Nesta semana, o desembargador federal Macario Ramos Judice Neto negou o pedido:
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“Já foi advertido à defesa que o custodiado não tem opção de cardápio para escolher em qual presídio haverá de seguir preso preventivamente”, escreveu o magistrado em sua decisão.
Além de já ter pedido a liberdade de Dudu, a defesa reclama na Justiça de que está sendo cerceada ao não conseguir contato com o preso. Os advogados pediam, por exemplo, encontros semanais com no mínimo duas horas, além de autorização para conversar com Luiz Eduardo quando necessário.
No entanto, as regras de visitação à Bangu 1 são mais rígidas. Uma resolução da Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) define que os presos fiquem recolhidos em cela individual, com direito a saída dela por três diariamente, podendo aumentar por até seis horas. Já as entrevistas com advogados são de até 20 minutos.
“Portanto, a defesa não terá acesso ao custodiado de modo livre e a tempo e hora por si arbitrados, como pretende. É bizantino e de pouca praticidade ter que explicar, a cada petição, reiteradamente, as razões pelas quais a defesa deverá se adaptar e seguir as regras próprias do regime imposto”, completa o desembargador.
Ao pedir a prisão do então deputado estadual Tiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Jóias, a Polícia Federal revelou como integrantes do Comando Vermelho se infiltraram no poder público para obter vantagens, como saber antecipadamente sobre operações policiais. Além do parlamentar, outra figura central do esquema criminoso é Luiz Eduardo Gonçalves da Cunha, o Dudu, ex-assessor de TH, descrito na investigação como o “lobista” do tráfico. Com bom trânsito na política fluminense, ele trabalhou em campanhas eleitorais, teve cargo em secretaria estadual e até comprou uma construtora para tentar firmar contratos com o governo.
Dudu aparece em mensagens obtidas pela Polícia Federal intermediando a compra de bazucas antidrones para traficantes do Complexo do Alemão e até se oferecendo a viajar aos Estados Unidos para adquirir os equipamentos. Ele ainda aparece numa conversa com Gabriel Dias de Oliveira, o Índio do Lixão, que também foi preso, sugerindo que o traficante deveria se candidatar a vereador em Duque de Caxias com aval de TH Jóias.
“As evidências o descreveram como lobista da organização criminosa, transmitindo mensagens entre os integrantes e o público externo, e executando outras ações delituosas. Como assessor na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), articulou ações criminosas”, diz trecho do relatório da PF.
Mas antes mesmo de ter influência na Alerj com a posse de TH em junho do ano passado, Dudu já circulava nesse limbo entre a política e o crime organizado. No ano passado, ele envolveu o nome de outro político fluminense num escândalo. Flagrado na Avenida Brasil por PMs com R$ 175 mil em dinheiro vivo, disse ser assessor do deputado federal Gutemberg Reis (MDB) e que o parlamentar explicaria a origem do dinheiro. O valor foi apreendido e, em depoimento na delegacia, ele mudou a versão: negou que tenha tentado contato com o parlamentar e afirmou que a quantia era da venda de um carro.
Na época, o deputado federal disse que Dudu tinha trabalhado como freelancer em uma campanha eleitoral, mas que não tinha qualquer relação mais com ele ou com o dinheiro. Gutemberg é irmão de Washington Reis, presidente estadual do MDB no Rio, que também negou qualquer ligação de sua família com o ex-assessor de TH Jóias. Reis destacou ter expulsado o joalheiro sumariamente do partido ao saber da operação na semana passada.
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No caso dos R$ 175 mil, aparece outro personagem preso por ligações com o tráfico na semana passada: o ex-secretário de Esportes e advogado Alessandro Carracena, acusado pela PF de ser do núcleo político da facção. Um mês depois do flagrante na Avenida Brasil, Dudu buscou na Justiça reaver o dinheiro. Ele foi representado pelo escritório de Carracena.
Quem assina a petição inicial é um outro advogado que trabalha para Carracena. No documento, Dudu é descrito como um “jovem empresário que, através de muito trabalho e espírito empreendedor, vem tentando construir seu patrimônio juntamente com sua esposa”. A defesa cita que ele fez trabalhos para a prefeitura de Barra Mansa e para a escola de samba Beija Flor, além de ter uma “bem-sucedida” barbearia na Zona Sul, e que precisa do dinheiro para pagar dívidas com credores. O pedido foi negado pela Justiça, que manteve a investigação aberta. Tanto a prefeitura de Barra Mansa quanto a agremiação negaram ter contratado a empresa de Dudu.
No relatório, a Polícia Federal destaca que Dudu usava suas empresas para lavar dinheiro. Segundo a investigação, ele e pessoas relacionadas a ele movimentaram R$ 8,7 milhões entre 2021 e 2024.
Dono de uma empresa de marketing digital, ele chegou a ser nomeado para a Secretaria estadual de Trabalho e Renda, em 2021, na gestão de Patrique Welber, na época um dos principais nomes do PTB. Ficou apenas um mês no cargo. No ano anterior, a empresa de Dudu tinha sido contratada por R$ 100 mil pela legenda para fazer a campanha digital de candidatos à eleição municipal do Rio. Procurado, Welber não quis comentar.
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Dois anos depois, em março de 2023, Dudu se lançou em outro ramo: o da construção civil. Por R$ 800 mil, comprou a construtora MCA, que tinha sede em São Francisco de Itabapoana, no interior do Rio. Quatro meses depois, se habilitou no Sistema Integrado de Gestão de Aquisições (Siga) do governo fluminense.
A plataforma é o primeiro passo para as empresas assumirem contratos da administração pública. No mesmo mês, ele concorreu em um pregão para fazer a reforma do Colégio Estadual Alfredo Pujol, em Rio Claro. A empresa apresentou a segunda melhor proposta.
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Como lobista da facção, Dudu sabia da importância de demonstrar poder e conexões, mesmo quando elas não eram verdadeiras. Como O GLOBO já publicou, a investigação da PF mostra que ele e Índio do Lixão simularam ser um capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e um secretário de governo para “enganar” traficantes rivais na venda de drogas.