Em viagem nesta quinta-feira para a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, nos EUA, onde promete se opor duramente ao reconhecimento do Estado palestino, o premier de Israel, Benjamin Netanyahu, e sua mulher, Sara, passaram outro tom no embarque — ao menos na escolha do figurino. O casal vestia verde, branco e vermelho, cores presentes na bandeira palestina, que saltavam aos olhares mais atentos, mesmo eles estando envoltos a um “arsenal” de representações israelenses. Além disso, o percurso para a conferência da ONU foi marcado por um desvio de rota inédito, que evitou sobrevoar o território francês.
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Antes da decolagem, Netanyahu declarou que sua missão era a de “contar a verdade” ao mundo e condenar os líderes mundiais favoráveis a criação de uma nação para os povos palestinos:
“Na ONU e em Washington, vou contar a nossa verdade – a dos cidadãos de Israel, a dos soldados das Forças de Defesa de Israel, a do nosso Estado”, prometeu ele em uma publicação no X. “Vou condenar os líderes que, em vez de condenarem os assassinos, estupradores e incendiários de crianças, querem dar-lhes um Estado no coração de Israel. Isso não vai acontecer.”
O avião do governo israelense, conhecido como “Wings of Zion” e usado pelo primeiro-ministro em viagens oficiais, mudou pela primeira vez sua rota para os Estados Unidos, evitando o espaço aéreo de países europeus e acrescentando mais de 600 km ao trajeto habitual. Em seus seis voos anteriores para os EUA, a aeronave havia sobrevoado Grécia, Itália e França. Nesta, que inclui a cúpula das Nações Unidas e um encontro com o presidente Donald Trump, o avião seguiu pelo Mar Mediterrâneo, passando ao sul da Espanha e em direção ao Estreito de Gibraltar.
O motivo do desvio ainda é desconhecido. Segundo um diplomata francês, em entrevista ao Haaretz, a França autorizou o pedido de Israel para sobrevoar seu território, mas desconhece a razão da escolha da rota alternativa. Há duas semanas, o canal israelense i24 informou que menos passageiros, entre funcionários e jornalistas, seriam permitidos a bordo, reduzindo o peso total da aeronave para permitir o voo pela Europa.
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Em novembro do ano passado, o Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, emitiu mandados de prisão contra Netanyahu e o ex-ministro da Defesa Yoav Gallant por crimes contra a humanidade — a primeira vez que mandados internacionais foram expedidos para altos funcionários de Israel. Os mandados obrigam os 124 Estados-membros do TPI a prender e extraditar Netanyahu e Gallant caso entrem em seus territórios.
Em abril, o TPI exigiu explicações da Hungria sobre a não execução do mandado contra Netanyahu durante sua visita ao país. O tribunal afirmou que a Hungria descumpriu sua obrigação, prevista no Estatuto de Roma, de prender o primeiro-ministro ao desembarcar em Budapeste. Em resposta, o chefe de gabinete do premiê Viktor Orbán anunciou que a Hungria decidiu se retirar do TPI.
O protagonismo do presidente francês, Emmanuel Macron, na onda de reconhecimento dos europeus ao Estado palestino pode ser apontado como uma possível motivação ao desvio. Ao final de um encontro bilateral com Donald Trump na quarta-feira, Macron — um dos responsáveis pelo encontro na ONU na segunda-feira, em que nações europeias reconheceram oficialmente o Estado palestino —, disse ter tratado sobre a situação do Oriente Médio com o presidente americano. Ao ser questionado sobre os planos israelenses de ampliar a ocupação na Cisjordânia, Macron disse que essa era uma “linha vermelha” para Trump.
— Sobre esse assunto, em termos muito claros, os europeus e os americanos estão na mesma página — disse Macron. — [Qualquer tentativa de anexar a Cisjordânia] seria o fim dos Acordos de Abraão, que foi uma das histórias de sucesso do primeiro governo Trump. Os Emirados Árabes Unidos foram muito claros sobre isso. Acho que é um limite para os EUA.
Fontes americanas ouvidas pelo jornal New York Times afirmaram que Trump garantiu nesta semana a líderes de nações árabes e de maioria muçulmana que não permitiria que Israel anexasse a Cisjordânia.
À medida que as Forças Armadas de Israel se concentram na operação militar contra a Cidade de Gaza, principal centro urbano da faixa litorânea palestina, sob o pretexto de eliminar o último grande foco de resistência do Hamas e resgatar os reféns sequestrados em outubro de 2023, autoridades políticas do país têm revelado planos para ocupar de forma definitiva não apenas o enclave, como também o território mais ao norte, governado pela Autoridade Nacional Palestina.