O aumento da expectativa de vida está transformando a forma como encaramos a aposentadoria. Cada vez mais brasileiros decidem permanecer ativos no mercado após os 50 anos, seja estendendo a carreira tradicional ou iniciando em outras profissões.
Essa “segunda jornada” vai além da necessidade financeira: manter-se profissionalmente ativo ajuda a preservar a autoestima, estimula o cérebro e amplia os vínculos sociais.
Do ponto de vista econômico, os números reforçam a tendência. Segundo o IBGE, a expectativa de vida no Brasil chegou a 76,4 anos em 2023, e os idosos já representam 15,6% da população. De acordo com o Ministério do Trabalho, mais de 13,4 milhões de brasileiros acima dos 50 anos seguem na ativa, em uma variedade de ocupações — muitas delas, com o frescor da novidade.
Foi assim com Janete Pasold, hoje com 67 anos. Enfermeira por formação, ela sempre teve paixão pela arte manual. Entre plantões, aulas de enfermagem e cursos variados, encontrou no bordado um elo entre cuidado, criatividade e convivência.
Aos 35 anos, abriu uma escola em casa, que atraía até recomendações médicas. Mais tarde, ao se dedicar à maternidade, interrompeu o projeto, mas seguiu estudando. Formou-se em educação artística, mergulhou em terapias alternativas e se encantou pela metodologia da biografia humana, na antroposofia.
Aos 49, começou a atuar como terapeuta biográfica. Mas foi só aos 56, já separada e repensando o futuro, que encontrou a virada definitiva: transformar sua coleção de bordados em acervo museológico. Junto de duas amigas que viviam fases parecidas, fez pós-graduação em museologia e se formou em gestão de museus.
Em 2016, nasceu em Blumenau o Museu Tilly de Bordados e Rendas, hoje com mais de 2.500 peças, algumas datadas do século 17.
— O museu me trouxe um propósito. Eu juntei o que me dava prazer, organizei em algo maior e criei um legado. Isso é o que me motiva para os próximos anos — conta.
O museu me trouxe um propósito. Eu juntei o que me dava prazer, organizei em algo maior e criei um legado. Isso é o que me motiva para os próximos anos”
— Janete Pasold, enfermeira e gestora de museu
Ter um objetivo também foi a chave para Walter Serer, administrador de empresas que fez carreira como CEO e, aos 63 anos, decidiu desacelerar. A motivação inicial foi familiar: a filha havia adoecido e ele precisou interromper a rotina de 14 horas de trabalho. Após atravessar a crise, veio a pergunta: “E agora?”.
— Descobri que não conseguiria parar. Fui fazer então formação em coaching e comecei a atuar com mentoria de altos executivos — diz ele, aos 75 anos.
Walter, que acompanhou muitos profissionais em mudança de carreira, ressalta que a transição não é simples.
— A maior dificuldade é perder o “sobrenome corporativo”. Você deixa de ser definido pelo crachá e precisa reconstruir sua identidade profissional. Além disso, tem a questão financeira. Muitos planejam viver até os 70, mas estamos chegando aos 90. Portanto, ter uma reserva de emergência e se manter atualizado é essencial.
A preocupação é compartilhada por especialistas em carreira e longevidade. O mercado de trabalho brasileiro ainda oferece barreiras para profissionais mais maduros, mas Walter não tem do que se queixar.
— Claro que precisei correr atrás de clientes. Mas o fato de eu ter idade, experiência e vivência, no entanto, faz com que as pessoas me olhem com um certo respeito — comenta Walter.
A reinvenção pode ser ainda uma forma de proteção econômica. Com o envelhecimento populacional acelerado, estender a vida ativa passou a ser tanto uma necessidade quanto uma oportunidade.
— Uma nova carreira muda tudo: saúde emocional e física e motivação. Mas também ajuda a equilibrar as contas e dá segurança para o futuro — resume o coach, há oito anos na nova área.
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Uma nova carreira muda tudo: saúde emocional e física e motivação. Mas também ajuda a equilibrar as contas e dá segurança para o futuro”
— Walter Serer, administrador e coach
Histórias como as de Janete e Walter estão se multiplicando. Para alguns, significa abrir um pequeno negócio; para outros, transformar hobbies em ofício ou colocar a experiência acumulada a serviço de mentorias e consultorias.
— Uma vida sem propósito não vale a pena ser vivida. O importante é ter algo que faça você sair da cama animado todos os dias — conclui Walter.