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‘Os 80 anos me fizeram pensar nessa questão’

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abril 14, 2025
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'Lute', em cartaz no Itaú Cultural — Foto: Divulgação/Renato Parada

As 11 telas da individual “Pintura com a pintura”, em cartaz no Paço Imperial, no Centro do Rio, representam mais um recomeço na carreira de seis décadas de Carlos Zilio. As abstrações, em sua maioria em preto e branco, criadas entre 2023 e 2024, marcaram o fim das pinturas relacionadas aos tamanduás, um elo afetivo com o pai, iniciadas após a sua morte, em 1985. A partir de 2007, o pintor intensificou essa produção, inspirada na história de um tamanduá de estimação que seu pai teve na infância, no interior do Rio Grande do Sul. Após uma grande mostra realizada na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, em 2023, Zilio decidiu mudar e criar telas inspiradas “no nada”, em uma aproximação minimalista de obras como as do russo Kazimir Malevich e do americano Barnett Newman.

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Em paralelo, o pintor de 80 anos é homenageado na panorâmica “Carlos Zilio – A querela do Brasil”, em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo, com mais de cem obras produzidas desde 1966, período em que ele se tornou um dos nomes centrais da chamada Nova Figuração, criou trabalhos de forte engajamento político, foi baleado e preso pela ditadura militar e depois exilado, e iniciou uma carreira concomitante na pesquisa e na docência. Com curadoria de Paulo Miyada, a primeira mostra de caráter retrospectivo da carreira de Zilio reúne obras em técnicas e formatos variados, como pinturas, desenhos, objetos e instalações, que destacam a natureza plural de seu trabalho e a sua inesgotável capacidade de reinvenção.

— Quando voltei do Rio Grande do Sul, coloquei um tamanduá na minha frente e pensei: “Não, isso acabou”. Aí pintei por cima do tamanduá um quadro todo escuro, chamado “Ausência”, que encerra a exposição em São Paulo — conta Zilio. — E, a partir da ausência, me deparei com esse impasse, para onde ir agora. Estar com 80 anos me fez pensar nessa questão do nada, de como seria essa representação e de como desdobrar isso, ver a sua amplitude. Então parti para uma pintura que nasce de um vocabulário mínimo.

Na mostra do Itaú Cultural, ganham destaque as obras da fase experimental de Zilio, ligadas a questões políticas dos anos 1960 e 1970, a exemplo de “Lute”, de 1967, objeto de resina condicionado em uma marmita de alumínio, cuja a proposta inicial era ser produzido em grande escala e distribuído nas fábricas numa tentativa de mobilização dos trabalhadores contra o autoritarismo. Com a promulgação do AI-5, Zilio deixa a arte para seguir atuando no movimento estudantil e cai na clandestinidade, até ser baleado e preso em 1970. Os desenhos produzidos nos dois anos que ficou encarcerado, em caneta hidrográfica e guache sobre papel, levados para fora por visitas, são outros dos destaques do período.

— No início da carreira do Zilio, a produção artística e o engajamento político estavam intensamente vinculados, como acontecia com outros nomes do teatro, do cinema, da TV, da música. Havia essa busca por uma arte direta, crítica, de leitura rápida, para responder àquela urgência. Com o “Lute”, ele pensa numa obra que poderia ser distribuída nas portas das fábricas, como um panfleto — observa Paulo Miyada. — Mas, quando faz os protótipos, ele percebe que ainda é muito cifrado, que ficaria circunscrito ao ambiente mediado dos museus e exposições. Aí ele se dedica de vez ao movimento estudantil, parte para a ação direta. Quando é preso, ele reencontra a arte como uma espécie de diário do cárcere, no que, para mim, representa o ápice e a ruptura da Nova Figuração.

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  • Rotina no cárcere e Paris
      • ‘Os 80 anos me fizeram pensar nessa questão’

Rotina no cárcere e Paris

Zilio recorda que os desenhos feitos no cárcere foram uma forma de criar uma rotina e de reafirmar-se como artista:

— Ali era uma maneira de existir mesmo. Na cadeia você tem que criar uma disciplina, não pode se deixar levar. Levanta, faz ginástica, toma banho, faz a barba. É como se estivesse pronto para sair, para a vida. Eu era um artista preso, esses desenhos eram uma forma de me lembrar disso. Essa minha fase política surge da utopia e morre com fim da utopia para mim.

‘Lute’, em cartaz no Itaú Cultural — Foto: Divulgação/Renato Parada

Após deixar a prisão, em 1972, Carlos Zílio exilou-se em 1976 na capital francesa, onde permaneceu até 1980, quando concluiu o doutorado em artes na Universidade de Paris VIII. Na volta ao Brasil, passa a se dedicar também à docência, na Departamento de História da PUC-Rio e na Escola de Belas Artes da UFRJ. Em sua estada na Europa, Zilio diz que passa ter contato com obras-primas em museus como o Louvre.

— Lá decidi fazer algo que nunca tinha me permitido por uma autocensura, entrar num museu que não fosse de arte contemporânea. Eu virei um rato de Louvre, e isso me fez inevitavelmente a começar a pensar a pintura. A minha volta à pintura foi também a minha volta à cultura. Porque a política é o agora, mas a cultura é o que nos sustenta — analisa.

Carlos Zilio conta que passou a produzir abstrações a partir de 1978.

— Foi quando passei a fazer especulações, investigações, em torno de problemas pictóricos, relacionados a artistas que passo a estudar em determinados momentos.

Um dos desenhos feitos durante a prisão do artista — Foto: Divulgação/Daniel Mansur
Um dos desenhos feitos durante a prisão do artista — Foto: Divulgação/Daniel Mansur

Para Ronaldo Brito, curador da exposição no Paço Imperial, as últimas séries de Zilio estão entre as suas preferidas de seu trabalho como pintor.

— No exílio, ele pode se dedicar totalmente à arte e se torna um pintor para valer. Acompanhando o seu processo no ateliê, é perceptível como ele fica completamente tomado pela pintura — comenta o curador. —Na primeira aproximação, podemos identificar um certo construtivismo, um minimalismo, mas essa não é a questão mais importante. O Zilio é um pintor experimental, que só leva à tela o que sente no momento, tem muita honestidade nessas obras.

Após as aberturas, a maior vontade de Zilio era voltar à prática do ateliê, interrompida por um acidente doméstico em agosto do ano passado, que o impediu de voltar a pintar até agora.

— Sofri uma queda em casa, quebrei a mão direita, fiquei com o braço imobilizado por um mês e meio. Mas faço fisioterapia desde então e já me sinto seguro para voltar a pintar, só não consegui antes porque me envolvi muito com as exposições — conta o pintor. — Agora volto para a minha vidinha, de acordar, ir para o ateliê, trabalhar, ler meus livros. O importante é estar lá.

Junto à individual no Rio e à retrospectiva em São Paulo, Zilio aproveita as celebrações em torno de seus 80 anos para rever a trajetória, ao passo que segue produzindo.

— Estava otimista com meus 80 anos, sentia que seria como uma reta de chegada no turfe, disputando cabeça a cabeça. Mas o acidente me fez cair do cavalo — brinca o pintor. — Mas estou bem, reaprendendo os movimentos com a mão, voltando a trabalhar, pegando esse impulso que não tenho ideia de onde vai dar, só sei que tem algo ali para mim, me requisitando. Olhar para a carreira e para os 80 anos é como se ver num espelho, um reflexo de que posso gostar ou não. Mas espero que me leve a algo que ainda não tenha feito.

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