O vice-chanceler da Coreia do Norte chegou a Nova York na noite de quinta-feira, dias antes de seu discurso diante da Assembleia Geral da ONU, o primeiro desde 2018 a ser proferido por um membro do alto escalão do regime em Pyongyang. A escolha do diplomata ocorre no momento em que Seul e Washington demonstram interesse em retomar o diálogo com os norte-coreanos, com sinais iniciais de que isso pode ocorrer em breve.
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De acordo com a agência sul-coreana Yonhap, que acompanhou a chegada, Kim Seon-gyeong viajou a Nova York em um voo da empresa Air China, vindo de Pequim. Ele não respondeu às perguntas dos jornalistas. No mesmo dia, a imprensa estatal noticiou a partida da delegação do aeroporto de Pyongyang, em um sinal de que o regime vê a participação nos debates da ONU como importante e, literalmente, digna de nota.
Desde 2018, a Coreia do Norte não enviava um representante de alto nível para discursar em Nova York. Entre 2014 e 2018, coube ao chanceler representar o país, em falas marcadas pela defesa de seu programa nuclear, críticas às sanções e ataques a Seul, Tóquio e Washington. Após o fracasso das conversas com os EUA, no início de 2019, e a adoção de uma postura mais dura do regime, acentuada durante a pandemia da Covid-19, o representante norte-coreano na ONU, Kim Song, discursou no plenário.
A fala de Kim Seon-gyeong está prevista para segunda-feira, quando serão concluídos os Debates Gerais da Assembleia Geral da ONU.
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Nas semanas que antecederam a chegada do vice-chanceler aos EUA, Seul e Washington sinalizaram para o interesse em reabrir canais de diálogo com Pyongyang, embora reconheçam que o caminho é longo e complexo.
Na Coreia do Sul, Lee Jae-myung, no poder desde junho, abandonou a política de enfrentamento de seu antecessor, Yoon Suk-yeol, em prol de uma estratégia focada em amenizar as tensões e, posteriormente, partir para o diálogo. Na terça-feira, em discurso na Assembleia Geral, Lee apresentou uma proposta guiada pela “troca”, “normalização” e “desnuclearização” do país vizinho — o regime de Kim Jong-un repetiu, inclusive nos últimos dias, que não pretende abandonar suas armas atômicas.
— A Coreia Democrática iniciará uma nova jornada rumo à coexistência pacífica e ao crescimento compartilhado na Península Coreana. O primeiro passo será restaurar a confiança intercoreana rompida e adotar uma postura de respeito mútuo — disse Lee. — O governo da República da Coreia (Coreia do Sul) reafirma claramente que respeita o sistema atual do Norte, que não buscará qualquer forma de unificação por absorção e que não tem intenção de se envolver em atos hostis.
No caso dos EUA, parece contar, e muito, a relação interpessoal entre Kim e Donald Trump, forjada no primeiro mandato do republicano. Em agosto, quando recebeu Lee na Casa Branca, Trump reiterou a amizade com o norte-coreano e disse que se encontraria novamente com ele “em um futuro apropriado”. Existe uma possibilidade, hoje remota, de um encontro durante a reunião de cúpula do fórum da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, no mês que vem, em Gyeongju, na Coreia do Sul.
Em resposta, Kim afirmou, na semana passada, que estava disposto a se encontrar com o republicano, e que “não há razão para não se sentar com os EUA. Contudo, ele reiterou, assim como o fez indiretamente à Coreia do Sul, que Washington deveria abandonar “a absurda obsessão com a desnuclearização e aceitar a realidade”, e que seu governo busca uma “coexistência pacífica genuína”.
Na quinta-feira, em conversa com investidores em Nova York, Lee Jae-myung disse que está aberto a uma proposta para congelar o número de ogivas nucleares da Coreia do Norte, como um primeiro passo para a desnuclearização. Pyongyang não comentou.