Uma visita realizada na última quinta-feira por uma comissão composta por representantes do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) e do Ministério Público mudou o rumo da proposta de transferência de internos da unidade para Potim, também no interior paulista. A mudança havia sido cogitada por autoridades estaduais como uma tentativa de alterar o perfil daquele ficou conhecido como o “presídio dos famosos” por abrigar acusados de crimes de grande repercussão, como o ex-jogador Robinho, o empresário Thiago Brennand e, no passado, Suzane von Richthofen, entre outros nomes. Após a inspeção, porém, o grupo concluiu que a medida não faz sentido e não deverá ser levada adiante.
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O plano previa o envio de detentos notórios — como os próprios Robinho e Brennand, além de Lindemberg Alves, Fernando Sastre e Roger Abdelmassih — para a Penitenciária 2 de Potim, a cerca de 34 quilômetros de distância. A unidade receberia parte dos presos de Tremembé, enquanto outros seriam redistribuídos para mais cadeias do interior de São Paulo. A proposta, no entanto, enfrentou resistência dentro e fora do sistema prisional e acabou sendo revista após a visita da comissão.
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Durante a inspeção, a juíza corregedora dos presídios do Vale do Paraíba, Sueli Zeraik Armani, conversou pessoalmente com diversos detentos, entre eles Thiago Brennand e Robinho, ambos condenados por estupro. Os dois manifestaram à magistrada o desejo de permanecer em Tremembé, alegando que estão adaptados à rotina e às condições da unidade.
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Já passaram por Tremembé Alexandre Nardoni, condenado pela morte da filha Isabella, os irmãos Daniel e Christian Cravinhos, autores do assassinato de Manfred e Marísia von Richthofen, além de Mizael Bispo, condenado pelo assassinato de Mércia Nakashima.
A comissão considerou que Tremembé mantém um padrão de disciplina e organização que dificilmente seria reproduzido em outra penitenciária. A avaliação é de que a unidade funciona de forma estável e não apresenta motivos para a redistribuição dos presos, o que poderia gerar desconforto e instabilidade no sistema.
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O complexo penitenciário de Tremembé é formado por cinco unidades prisionais, com uma população de aproximadamente 7 mil presos, o que representa cerca de 13% da população total do município. Por e-mail, a assessoria de imprensa da Prefeitura de Tremembé informou que o governo do estado não oferece contrapartidas à cidade pela presença das penitenciárias e que a administração municipal não vê com bons olhos a concentração de presídios em seu território. A gestão local afirma, por exemplo, ser responsável pela retirada diária de toneladas de lixo das unidades e reclama que, quando ocorre a morte de um preso, o auxílio-funeral é custeado pelo município, gerando despesas adicionais.
A bem da verdade, foi a própria SAP quem consolidou a fama de Tremembé como o “presídio dos famosos”, ao publicar o Decreto 50.412, de 27 de dezembro de 2005, que definiu o perfil e as características das unidades prisionais da cidade. O texto estabeleceu que parte do complexo seria destinada a presos que pudessem sofrer constrangimento físico ou moral em estabelecimentos comuns, seja pela função pública que exerceram, pela atividade particular ou pela reprovação decorrente da natureza do crime cometido, com o objetivo de preservar suas vidas.
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A partir desse decreto, as unidades de Tremembé passaram a ter funções distintas. A Penitenciária I Masculina foi classificada como de segurança máxima, voltada a detentos do regime fechado. O Centro de Progressão Penitenciária (CPP) recebeu o perfil de segurança média, para presos do regime semiaberto. A Penitenciária Feminina II também foi definida como de segurança média, abrigando mulheres em regime semiaberto e fechado. Já as penitenciárias Feminina I e Masculina II foram formalmente designadas para custodiar presos que, por algum motivo, necessitam de maior proteção dentro do sistema prisional — o que acabou concentrando em Tremembé condenados de grande repercussão.
Além dos detentos famosos, o presídio reúne pedófilos, estupradores, assassinos em série e criminosos condenados por homicídios intrafamiliares — pais que mataram filhos, filhos que mataram pais —, além de ex-policiais, empresários e ex-médicos que perderam o direito de exercer suas profissões após condenações.
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A visita técnica, no entanto, reforçou a percepção de que a mudança teria mais caráter simbólico do que prático. A juíza Sueli Zeraik registrou que o presídio cumpre bem seu papel e que não há razões técnicas, estruturais ou de segurança que justifiquem a remoção dos detentos. Com isso, o plano de transferência dos presos de Tremembé deve ser abandonado, e a tentativa de desfazer a fama de “presídio dos famosos” permanecerá apenas no discurso institucional da Secretaria de Administração Penitenciária.
O blog procurou tanto a SAP quanto a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo, mas nenhum dos órgãos quis se manifestar sobre o assunto. Embora o plano de transformar o perfil de Tremembé não tenha sido confirmado publicamente pelo governo estadual, o próprio TJSP chegou a informar, em agosto, que foi “cientificado sobre a mudança”.