A prefeitura do Rio quer autorização da Câmara Municipal para contrair nos próximos quatro anos empréstimos que somam R$ 6 bilhões. O pedido foi feito por Eduardo Paes (PSD) num pacote enviado ao Legislativo no início de fevereiro e estava previsto para ir a plenário ontem, mas acabou adiado devido a questionamentos feitos por vereadores. Entre as críticas ao texto está a falta de definição dos projetos nos quais os recursos serão investidos, o que para muitos parlamentares significa dar um “cheque em branco” ao prefeito.
A previsão é que o projeto retorno à pauta na próxima terça-feira. E diante aos questionamentos, os vereadores já discutem algumas mudanças ao texto, como uma emenda do presidente da Câmara Carlo Caiado (PSD), com apoio de Rosa Fernandes (PSD), que reduz a autorização para R$ 2,2 bilhões. Outro ponto debatido por um grupo de vereadores é limitar a empréstimos que tenham a garantia do governo federal.
— Existe um limite para operações de crédito de municípios e precisamos trabalhar com o teto desse valor. Nossa emenda trata apenas de respeitar os acordos nacionais — disse o presidente Carlo Caiado.
Na mensagem enviada à Câmara, o prefeito diz que quer dar “continuidade às políticas públicas exitosas da última gestão”, mas não lista os projetos. Ele ressalta apenas que o dinheiro será usado para viabilizar “ações de mobilidade urbana, infraestrutura, drenagem, saneamento, pavimentação, habitação, inovação e tecnologia, além da implantação de equipamentos esportivos e culturais, bem como o desenvolvimento de políticas públicas que promovam a melhoria das condições de vida da população”.
Procurada pelo GLOBO, a prefeitura não detalhou em quais projetos serão gastos os R$ 6 bilhões — o valor representa cerca de 13% de todo o orçamento executado no ano passado.
O município afirmou que o limite de endividamento legal é de 120% da Receita Corrente Líquida (RCL) — hoje o Rio está em 46,8%, o que demonstra uma boa saúde financeira. Ontem, os técnicos da prefeitura se reuniram com vereadores para explicar como seria a operação de crédito. O encontro é uma praxe neste tipo de projeto, mas, desta vez, o município não detalhou em que o dinheiro será aplicado nem mesmo as condições de pagamento oferecidas pelo credor. Também saltou aos olhos dos vereadores que sequer o banco a ser contratado foi informado.
Sem este novo projeto, a prefeitura já terá que pagar R$ 22,4 bilhões em dívidas e juros pelos próximos 23 anos. Neste montante estão os R$ 5 bilhões de empréstimos contraídos por Paes em seu último mandato. O valor foi usado, por exemplo, na reformulação do BRT e na compra de ônibus articulados. Este ano, as parcelas das dívidas somam quase R$ 2,8 bilhões, 70% referentes a empréstimos anteriores a 2021.
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O vereador Pedro Duarte (Novo) criticou o pedido da prefeitura. Ele ressalta que, em outros projetos, havia pelo menos informações das condições de pagamento, como taxa de juros e meses de financiamento. A falta destes dados não permite, segundo ele, uma análise sobre o endividamento futuro do município. Ele também apontou um possível uso eleitoral de Paes, caso o prefeito se candidate ao governo do estado:
— Não é só o cheque em branco, mas também o tamanho dele. Ele precisa ter uma composição política que viabilize sua candidatura para além da cidade do Rio. E, infelizmente, ele pode acabar usando a máquina pública para entregar promessas a grupos políticos. Para isso, não pode correr o risco de ficar sem caixa para realizar obras.
Líder do governo na Câmara, Marcio Ribeiro (PSD) refutou a acusação de que seja um cheque em branco e de que o dinheiro será usado eleitoralmente:
— Apesar de não ter objeto traçado, o objetivo é claro. A cidade precisa ser cuidada independentemente do processo eleitoral, que só será no fim do ano que vem.
Especialista em gestão pública do Insper, André Luiz Marques diz que, apesar da boa saúde financeira do município, o empréstimo precisa ter um motivo claro que o justifique:
— Não é porque eu posso pegar um empréstimo com o banco que eu irei pegar. Não faz sentido contrair a dívida se não ficar claro o benefício que ela irá trazer.
Leia a nota da prefeitura na íntegra:
“A Prefeitura do Rio informa que apresentou decreto legislativo na Câmara de Vereadores para que seja permitida uma operação de crédito de R$ 6 bilhões. O valor será aplicado em ações de mobilidade urbana, infraestrutura, drenagem, saneamento, pavimentação, habitação, inovação e tecnologia e, implantação de equipamentos esportivos e culturais.
A definição do valor anual a ser gasto será determinada em função do espaço fiscal apurado pelo Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal – PAF. O valor poderá ser obtido em instituições financeiras e entidades de crédito nacionais e internacionais.
O limite de endividamento permitido pela legislação é de 120% da Receita Corrente Líquida (RCL). Vale ressaltar que, no momento, a Prefeitura tem um percentual de 46,86% da RCL.
Atualmente, 70% do pagamento de dívidas, R$1,95 bilhão, é referente a valores contratados antes de 2021.”