Rita Lee colhia os frutos da parceria musical com seu companheiro de vida, o guitarrista Roberto de Carvalho, quando recebeu a equipe do Jornal O GLOBO para uma conversa às vésperas do lançamento do disco “Saúde”, em abril de 1981. Antes mesmo de o álbum sair do forno, já havia algo em torno de 400 mil cópias encomendadas pelas lojas. Ao incorporar uma sonoridade mais pop, a cantora surgida das entranhas do rock tinha se tornado, aos 33 anos, quase uma unanimidade nacional.
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“Nós nos completamos, o Roberto e eu. Isso se reflete em vários níveis. No cuidar dos nossos três filhos, por exemplo, no manter a casa, como marido e mulher, namorados adolescentes, crianças, velhos… e, também, na música”, disse a artista, emendando com elogios ao parceiro. “Roberto é muito musical, harmonicamente é riquíssimo. Ele se senta no piano e não para, vai fazendo as coisas, eu fico que nem uma maluca, com gravadorzinho atrás, falando pra ele parar, pra gente fazer uma letra.”
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Rita começou sua trajetória nos anos 1960, cantando na banda Os Mutantes, antes de se lançar em carreira solo e formar o grupo Tutti-Frutti, com o qual ela gravou hits como “Esse tal de roque enrow”, “Ovelha negra” e “Agora só falta você”. A cantora era contra se encerrar no rótulo de roqueira, mas foi a partir de 1979, quando passou a compor com Roberto, num formato de “dupla dinâmica”, que Rita se desprendeu mesmo do gênero das guitarras e alcançou um público muito mais amplo.
“Eu e Roberto construímos juntos, a letra, a música, a melodia”, descreveu a compositora paulistana, que morreu há dois anos e está sendo homenageada em um festejado musical recém-chegado ao Teatro Casa Grande, no Rio. “Ele mais a música, eu mais a música, mas num trabalho integrado”.
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São desse começo da criação com o companheiro os discos homônimos da cantora. Lançados em 1979 e 1980, os álbuns batizados de “Rita Lee” vieram recheados de sucessos, como “Mania de você”, “Chega mais” e “Lança perfume”. A artista alcançou o topo de várias paradas no Brasil e no exterior. “Saúde”, divulgado em 1981, foi o primeiro no qual todas as faixas, sem exceção, são assinadas pelo casal. Entre elas, estava a clássica “Banho de espuma”, composta num momento de intimidade.
“Antes de um show no Maracanãzinho, eu estava tensa e resolvi tomar um banho de banheira, com sais de espuma, pra relaxar”, contou Rita. “Achei tão bom que chamei o Roberto, ele todo agitado, indo para lá e para cá. Ele entrou, começamos a fazer espumlnha, aí velo a letra, O resto está no disco”.
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“Banho de espuma” gerou problemas com a censura federal, ainda em vigor na reta final da ditadura militar, que acabaria em 1985. A música se chamava “Afrodite”, mas o Ministério da Justiça pediu a mudança no título e no verso “Bulinando com água e sabão”, que virou “Esfregando com água e sabão”.
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Enquanto gravava “Saúde”, nos estúdios da Som Livre em São Paulo, Rita amamentava o filho caçula, Antonio Lee. Ele e os dois irmãos, Roberto e João, eram os xodós da cantora, que tinha adoração por crianças e não abria mão dos cuidados com os meninos. Naquela época, o casal não deixava nem que eles fossem fotografados. O objetivo era preservar a prole. Pelo mesmo motivo, a família havia havia se mudado da casa onde morava, no Pacaembu, para um apartamento mais protegido.
“Estávamos tendo problemas com a vizinhança. Volta e mela apareciam tletes, o bairro todo sabendo onde a gente morava”, explicou a artista. “Algumas pessoas acham que você está disponível o tempo Inteiro para ser Rita Lee, não respeitam nem que você tenha filhos, vivem pedindo autografos, discos, ingressos. Eu tinha medo não por mim, mas pelas crianças, era acesso demais”.
Rita e Roberto continuaram produzindo hits ao longo dos anos 1980. Em 1982, o disco “Rita Lee e Roberto de Carvalho” chegou com “Cor de rosa choque” e “Flagra”, que virou tema da novela “Final Feliz”, da Globo. No ano seguinte, veio “Bombom”, com “Desculpe o auê” e “On the rocks”, entre outras. Na mesma década, ainda seriam lançadas “Bwana”, “Pega rapaz” e muitas outras que, hoje, têm lugar no vasto cancioneiro de uma das compositoras mais exitosas da história da música brasileira.