O número de estrangeiros e naturalizados vivendo no Brasil cresceu 70% de 2010 a 2022, segundo dados do Censo divulgados ontem pelo IBGE. O total passou de 592 mil para mais de 1 milhão de pessoas, impulsionado principalmente pela chegada de imigrantes venezuelanos nos últimos anos. O avanço marca uma mudança histórica: após décadas de queda contínua desde 1960, o país volta a registrar aumento na população vinda do exterior.
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No mesmo período, além do aumento de estrangeiros, também mudou o perfil de origem dessa população. Em 2010, os portugueses eram o grupo mais numeroso entre os nascidos no exterior, mas, em 2022, foram superados pelos venezuelanos, que passaram a liderar com 271.514 residentes no país (há 12 anos, eram apenas 2,8 mil).
Para a professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp Rosana Baeninger, que pesquisa migração interna e externa, a crescente chegada de venezuelanos no Brasil reflete a situação econômico-política do país, em especial após 2017. De lá para cá, a Venezuela sofreu uma hiperinflação descontrolada, com escassez generalizada de alimentos, remédios e produtos básicos, em cenário que empurrou milhões de pessoas para a pobreza extrema.
— Em 2017, o Brasil iniciou a Operação Acolhida em Roraima, com adoção do visto de refúgio e redistribuição destes imigrantes por diferentes cidades — detalha Baeninger.
Com o salto venezuelano, a América Latina e o Caribe passaram a representar a maior parte dos fluxos migratórios no Brasil, saltando de 27,3% para 72% do total. Países como Bolívia, Haiti, Paraguai, Argentina e Colômbia também destacam-se como relevantes pontos de origem.
O argentino Federico Gonzalez, de 46 anos, simboliza muitos latinos que recomeçaram a vida no Brasil. Em 2010, quando o desemprego e a falta de oportunidades bateram à porta, ele trocou Buenos Aires pelo Rio de Janeiro, onde uma sólida rede de argentinos facilitou a adaptação.
— Quando cheguei, já comecei a trabalhar, o que era diferente da situação na Argentina. Longe de casa, a gente acaba se abrindo a outras possibilidades profissionais que talvez não aceitaríamos — conta o argentino, que passou a atuar como segurança em um hostel de Ipanema. Hoje, ele é gerente da rede e lidera uma equipe 80% composta por latinos.
Em contraste, houve queda expressiva na participação de imigrantes da Europa (de 29,9% para 12,2%), da América do Norte ( 20,4% para 7%) e da Ásia (19,1% para 5,3%). Segundo o IBGE, a maior parte dos fluxos migratórios, até 2010, vinha de regiões como Estados Unidos, Japão e países europeus, mas eram catapultados, majoritariamente, por brasileiros que estavam retornando após viverem no exterior — e não por estrangeiros de fato.