O Sistema Cantareira, maior rede de represas de abastecimento hídrico de São Paulo, atingiu nesta manhã o seu nível mais baixo em dez anos. Desde março de 2016, quando a cidade começava a sair da pior crise hídrica de sua história recente, esse conjunto de mananciais não esteve tão seco.
Na medição realizada nesta manhã pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), o Cantareira tinha 24,2% de “volume útil”, a parcela de água do reservatório que pode ser transferida para abastecimento. A capacidade toda do sistema é de 973 milhões de metros cúbicos.
A última vez que o sistema atingiu um nível tão baixo foi em 1º de março de 2016, num período do ano em que estava se recuperando com chuvas, a 24,0%. Na crise que durou de 2014 a 2016, o Cantareira secou a ponto de bater no “volume morto”, quando a água fica abaixo do nível mínimo de captação e não pode ser retirada pelas estruturas disponíveis de bombeamento e adução.
O esvaziamento observado neste ano se deu não tanto por um período de seca intenso, mas por um período de chuva que não conseguiu recarregar bem o sistema. Em nenhum momento de 2025 o Cantareira esteve acima de 60% de capacidade.
O mês de outubro, oficialmente, marca a entrada do período chuvoso, mas as chuvas que efetivamente consigam elevar o nível dos reservatórios estão demorando a aparecer. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), está trabalhando com cenário de “seca moderada” para o final deste ano.
Antevendo problemas, ainda em setembro, a Agência de Águas do Estado de São Paulo (SP Águas) colocou o Cantareira e esquema de restrição, e fez a Sabesp reduzir de 27 m³/s (metros cúbicos por segundo) para 23 m³/s a velocidade de retirada de água do manancial. Além disso a Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) autorizou transposição de águas da bacia do Rio Paraíba do Sul para o Cantareira, para tentar recuperar o manancial.
Na estrutura de distribuição urbana, a Sabesp também tem aplicado uma redução de pressão no sistema durante a noite, como forma de reduzir as perdas por vazamentos em tubulações e adutoras. A medida começou no final de agosto, com despressurização de oito horas por dia, e aumentou para dez horas no final de setembro, sempre das das 19h às 5h do dia seguinte.
A empresa diz que a medida não deve provocar desabastecimento persistente, ainda, mas que durante a madrugada os imóveis que ficam em bairros altos e não têm caixa d’água podem enfrentar intervalos de escassez.
Segundo a Sabesp, o risco de uma crise hídrica como a de dez anos atrás se repetir é pequena, porque o sistema passou por muitas obras de interligação de represas e conexão de novos mananciais.
— Grande parte dessas obras veio como um legado daquela crise hídrica de 2014 e 2015, que a gente utiliza sempre que necessário — afirmou Meunim de Olivera Jr., diretor de relações contratuais institucionais da empresa, em entrevista na semana passada. — Estamos utilizando novamente todas elas, justamente para poder fazer enfrentamentos de momentos de escassez hídrica, que é o caso que nós estamos passando nesse momento.
ONGs da sociedade civil que monitoram a situação afirmam que, mesmo com uma infraestrutura melhorada, São Paulo enfrenta agora um momento delicado.
— O fato de a gente precisar usar esses recursos já é um alerta muito grande — diz Eduardo Caetano, coordenador de conhecimento e difusão do Instituto Água e Saneamento (IAS). — A gente está fazendo uso desse instrumento muito importante, que foi uma conquista após a grande crise hídrica de 2015, mas isso também evidencia coisas que deixaram de ser feitas para chegar nesta situação.
Caetano pontua que, apesar das obras em interligações de represas, o sistema evoluiu pouco em outras frentes. Ficaram aquém do desejado na última década, por exemplo, o investimento em reflorestamento das áreas de proteção de mananciais (essenciais para captar água) e na manutenção da rede de tubulação para reduzir a taxa de perda por vazamentos sistêmicos.
A Sabesp afirma que tem uma taxa de perdas sistêmicas de cerca de 19%, um nível melhor que a média nacional, e está investindo em corrigir problemas, sobretudo aqueles oriundo de “gatos”, as ligações irregulares de água e esgoto.
O Cantareira não é o único sistema de mananciais no abastecimento da região metropolitana, mas é o maior, sendo responsável por mais de metade da água consumida na área. Outros sistemas menores, porém, como Alto Tietê e Guarapiranga, não estão conseguindo dar conta do consumo, e também seguem se esvaziando. O nível do Sistema Integrado Metropolitano está agora em 28,7%, que também põe a cidade na pior situação hídrica desde 2016.
O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) diz que, por enquanto, as chuvas não vão chegar a São Paulo. Nesta semana a previsão é de seca, inclusive com alerta para baixa umidade. As chuvas registradas no início do mês vieram com baixo volume de água.
