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O presidente usou o púlpito, diante dos homens e mulheres que comandam a maior máquina militar do planeta, como se estivesse com apoiadores em um comício no Texas ou na Carolina do Norte. Ele citou seu tarifaço global, a decisão de renomear (unilateralmente) o Golfo do México de “Golfo da América”, e criticou o ex-presidente Joe Biden por usar um equipamento conhecido como caneta elétrica, tema pelo qual Trump demonstra fixação. Em determinados momentos, não escondeu o incômodo com a falta de reação dos oficiais às suas declarações ou piadas.
— Me disseram: ”Senhor, o senhor não vai ouvir um murmúrio na sala”. Eu disse que precisávamos relaxar um pouco esses caras — afirmou, tentando fazer mais uma de suas piadas, que arrancaram poucas reações da plateia. — Se os senhores não gostam do que estou dizendo, podem sair da sala. Porque lá se vai a sua patente, lá se vai o seu futuro.
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Mas em meio às falas dignas de uma campanha eleitoral, Trump apresentou as linhas gerais de uma mudança estrutural e de doutrina das Forças Armadas dos EUA, mais associada à seu ideário político do que a conjunturas globais: para o republicano, a principal ameaça aos Estados Unidos está dentro do país, e não em outras regiões do planeta, como na Europa (Rússia) e Ásia (China).
— Estamos sob invasão vinda de dentro, não diferente de um inimigo estrangeiro, mas mais difícil em muitos aspectos, porque eles não usam uniformes — disse o presidente, atacando o que chamou de “lunáticos da esquerda radical”, um alvo frequente de seus discursos.
Trump sinalizou que pretende empregar cada vez mais soldados em áreas urbanas, como fez com a capital, Washington, e como tenta fazer em cidades como Los Angeles e Chicago, ambas comandadas por democratas que não querem ver tropas em suas ruas.
— Eu disse a Pete [Hegseth] que deveríamos usar algumas dessas cidades perigosas como campos de treinamento para nossas forças armadas, a Guarda Nacional, mas forças armadas, porque entraremos em Chicago muito em breve, que é uma cidade grande com um governador incompetente — afirmou Trump. — São lugares muito inseguros e vamos endireitar um por um.
Sem vozes contrárias na Casa Branca, como havia em seu primeiro mandato, Trump vê na militarização um pilar de seu novo governo, mas não da mesma maneira como alguns de seus antecessores. Ao invés de novas guerras, aposta em demonstrações internas de força — como em um desfile militar, em junho, no dia de seu aniversário — e em tropas em ações de segurança pública e de imigração.
Foi assim em Los Angeles, durante protestos em junho, em Washington, onde as forças federais assumiram na prática o policiamento, e pode ser em Chicago, Portland e Memphis. Desde abril, os militares expandiram a presença na fronteira com o México, e atuam em parceria com as agências migratórias.
— E isso vai ser um papel importante para algumas das pessoas nesta sala. Isso também é uma guerra. É uma guerra interna. Controlar o território físico da nossa fronteira é essencial para a segurança nacional. Não podemos deixar essas pessoas entrarem — declarou.
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O foco interno não significa que Trump tenha esquecido de um mundo cheio de conflitos. Ele revelou certa frustração com a falta de um cessar-fogo na Ucrânia, creditando o fracasso no diálogo ao presidente russo, Vladimir Putin, alegou ter sido o responsável pela pausa nos combates entre Índia e Paquistão (algo negado à exaustão por Nova Délhi) e, mais uma vez, disse merecer o Nobel da Paz, outra de suas fixações.
— Você receberá o Prêmio Nobel? — questionou, em um peculiar solilóquio. — De jeito nenhum. Eles o darão a um sujeito que não fez absolutamente nada. Mas não receber o prêmio seria um grande insulto ao nosso país.
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Anunciada de forma tímida na semana passada, a quase sem precedentes reunião de comandantes nos arredores de Washington também foi uma das mais incisivas ações do governo Trump para replicar no Pentágono o que fez com o Departamento de Justiça: adequar um braço do governo, em tese independente, às suas visões de mundo.
Antes de Trump, Hegseth fez uma pregação sobre a ausência da “Cultura do Macho” nas Forças Armadas, tratando como essencial um “ethos militar” (conjunto de valores) pautado pela aparência, força física e rejeição de agendas de “justiça social, ao politicamente correto e ao lixo ideológico tóxico” — para o ex-comentarista da Fox News, “chega de meses de identidade, escritórios DEI (Diversidade, Equidade, Inclusão), caras de vestido, chega de adoração às mudanças climáticas, chega de divisão, distração ou ilusões de gênero.”
— Quando se trata de unidades de armas de combate, e há muitas tendências diferentes em nossa força conjunta, a era da liderança politicamente correta, excessivamente sensível e que não magoa os sentimentos de ninguém termina agora — disse, sugerindo que o combate ao assédio nas Forças Armadas “passou dos limites”, e que mulheres em funções de combate foram “indevidamente beneficiadas”. — Em todos os níveis, ou você atinge o padrão, ou você faz o trabalho, ou você é disciplinado, apto e treinado, ou você está fora.
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Para os que não concordarem com as novas ideias, as opções são poucas.
— Quanto mais cedo tivermos as pessoas certas, mais cedo poderemos promover as políticas certas — afirmou o secretário, que fez numerosas demissões no alto escalão desde sua chegada ao cargo. — Mas se as palavras que estou dizendo hoje estão deixando você desanimado, então você deveria fazer a coisa certa e se demitir.