A violência contra a mulher ganhou novas fronteiras no Rio. Em uma década, as denúncias de perseguição e assédio virtual cresceram mais de 5.000%, passando de 55 para 2.834 registros. O dado integra a edição especial de 20 anos do Dossiê Mulher. Em 2024, a violência psicológica liderou os casos e atingiu, em média, 153 mulheres por dia — quase sempre dentro de casa e praticada por companheiros ou ex — somando 56.206 vítimas.
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O relatório também aponta que mais de 154 mil mulheres sofreram algum tipo de violência no estado em 2024, o equivalente a 18 vítimas por hora.
Dossiê Mulher aponta aumento de assédio virtual contra mulheres
Para a diretora-presidente do ISP, a delegada Marcela Ortiz, os resultados reforçam o avanço da violência não física, potencializada pelo ambiente digital.
— O uso da internet para a prática de delitos, especialmente a violência psicológica, vem se tornando predominante. A violência física requer contato direto, mas a psicológica, não — disse Ortiz. — A internet traz muitos benefícios, mas também se tornou um espaço usado para agressões.
Segundo ela, mesmo com a dificuldade de identificar autores de crimes digitais, a denúncia continua sendo fundamental. É o registro policial que permite ao delegado pedir a quebra de sigilo à Justiça e reunir provas para responsabilizar o agressor.
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Ortiz cita o crescimento dos casos em que mulheres são perseguidas, assediadas ou têm sua intimidade exposta:
— Quando a mulher envia uma foto ou um vídeo íntimo a alguém em quem confia, e isso é usado contra ela, ainda ouvimos tentativas de culpabilizar a vítima. Precisamos desmistificar isso. A mulher não tem culpa. Ela compartilhou um momento com alguém de sua confiança. Quando ocorre a exposição, ela precisa ser acolhida.
Apesar da expansão dos crimes digitais, o Dossiê também detalha o cenário do feminicídio. Em 2024, 107 mulheres foram mortas em razão de gênero, quase dois terços dentro da própria casa. A maioria era negra (71%) e tinha entre 30 e 59 anos. Em 13 casos, o crime ocorreu diante dos filhos. Cinquenta vítimas foram mortas por seus companheiros, 16 por ex-companheiros e 14 por parentes. Quase 60% dos autores tinham antecedentes criminais.
A violência sexual segue entre as violações mais graves: foram 5.013 estupros, 2.441 casos de importunação sexual e 390 de assédio. As denúncias têm ocorrido mais rapidamente — 67,7% das vítimas procuraram ajuda em até um mês. No estupro de vulnerável, mais da metade das vítimas tinha até 11 anos.
O levantamento mostra ainda que 22 mil mulheres sofreram violências combinadas — sobretudo psicológica com moral, e física com psicológica. Entre idosas, 14,5% foram agredidas pelos próprios filhos.
Quanto à autoria dos delitos, 67,3% das agressões foram cometidas por conhecidos da vítima, sendo 49,6% por companheiros ou ex. Quase metade dos ataques ocorreu dentro de casa (49,2%).
Para ampliar o atendimento e a prevenção, o governo estadual tem fortalecido ações da Secretaria da Mulher, como o programa Nós+Segura, que alcança estudantes da rede estadual; o Ônibus Lilás, que leva atendimento a municípios vulneráveis; e a plataforma “Não é Não! Respeite a Decisão”, que capacitou mais de 13 mil profissionais de bares, hotéis, restaurantes e eventos.
Há também iniciativas voltadas aos autores de violência, como os grupos reflexivos realizados na Cadeia Pública Juíza Patrícia Acioli, em Niterói, que apresentam reincidência de apenas 2,3%.
O governador Cláudio Castro afirmou que os números reforçam a necessidade de continuidade das políticas de proteção:
— Os dados do Dossiê Mulher são um alerta e, ao mesmo tempo, um compromisso público. Cada número representa uma vida que precisa ser protegida. Seguiremos ampliando políticas integradas, fortalecendo a rede de atendimento e investindo em prevenção e acolhimento para que todas as mulheres do nosso estado vivam com dignidade e segurança.

