Não é leve a carga de expectativas que pesa sobre a COP30. Primeira conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas a ser realizada no Brasil, o encontro de Belém tem uma lista grande de tarefas para serem conduzidas, em um cenário geopolítico inóspito. A crise de confiança nos acordos multilaterais, a saída dos Estados Unidos — o segundo maior poluidor mundial — do Acordo de Paris e a dura realidade do aumento já registrado de 1,5ºC na temperatura média global em 2024 tornam ainda mais complexa a missão do Brasil na condução das negociações.
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A COP de Belém terá de apresentar caminhos para ampliar o financiamento climático, depois do resultado considerado pífio em Baku, no Azerbaijão, na COP29, quando as partes concordaram em direcionar US$ 300 bilhões/ano em repasses para que os países em desenvolvimento façam sua transição energética. Porém, o volume mínimo de recursos necessários é da ordem de US$ 1,3 trilhão/ano até 2035. Para tanto, a presidência da COP30 elabora, junto com a presidência da COP29, um relatório com possíveis estratégias para se alcançar essa cifra — a ideia é propor uma reforma do sistema financeiro global, de modo que bancos de desenvolvimento e instituições financeiras tenham um papel mais ativo no financiamento climático.
Outra atribuição da presidência da COP30 será a coordenação de um relatório sobre as NDCs (sigla em inglês para Contribuições Nacionalmente Determinadas, os compromissos dos países perante o Acordo de Paris) para avaliar o quanto estão alinhados ao objetivo de 1,5ºC como teto para o aquecimento global. Hoje, se todas as NDCs fossem implementadas, as emissões de gases de efeito estufa cairiam 2,6% em 2030 em relação a 2019, resultado bem aquém do corte proposto de 43% das emissões até o final da década.
Tanto destravar o financiamento climático quanto mover os países signatários do Acordo de Paris na direção de uma ação mais ambiciosa frente à mudança do clima são tarefas que dependem de cooperação e articulação política e esbarram em uma crise de confiança no multilateralismo, instigada pela ascensão ao poder de líderes populistas que confrontam a globalização. Exemplo é a retirada, pela segunda vez, dos EUA do Acordo de Paris pelo presidente republicano Donald Trump, que vem acompanhada de corte generalizado de recursos à pesquisa da ciência do clima.
— O maior desafio hoje é o da cooperação. Ela está ferida de morte, com a maior economia do mundo fazendo uma virada de 180 graus na direção contrária — diz Eduardo Felipe Matias, especialista em direito internacional.
Além de rechaçar o livre comércio global com seu tarifaço recém-anunciado, Trump é contrário à participação dos EUA em diferentes organismos de cooperação internacional. Também às voltas com lideranças à extrema direita que endossam o negacionismo climático, a União Europeia vem trocando sua posição progressista nas negociações por maior reticência, especialmente em relação à transferência de recursos. O aumento dos gastos com defesa do bloco em razão dos conflitos em curso, sobretudo na Ucrânia, reduzem o espaço fiscal para o clima.
A diplomacia brasileira tem ainda o desafio de avançar na agenda de adaptação climática. O Objetivo Global de Adaptação, também estabelecido pelo Acordo de Paris, teve progressos nas duas últimas COPs, com a construção de uma estrutura e indicadores. Em Belém, espera-se que os países entreguem seus Planos Nacionais de Adaptação — NAPs, na sigla em inglês.
O Plano Clima, em elaboração pelo governo federal, contempla uma estratégia nacional de adaptação, com diretrizes tanto para cidades quanto para 16 setores da economia.
— O Brasil tem a chance de entregar um resultado concreto e promissor sobre adaptação, que precisa estar presente em decisões de energia, agricultura, orçamento público e setor financeiro — diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, organização dedicada à política climática.
Limitar o lobby dos combustíveis fósseis também é uma preocupação de mais de 260 organizações e cientistas de diversos países que assinaram uma carta, enviada à presidência da COP30 e à ONU, cobrando mecanismos contra conflitos de interesses. Na última COP, no Azerbaijão — grande produtor de petróleo e gás — mais de 1,7 mil lobistas do setor estiveram presentes, o que motivou protestos.
— Faltam regras sobre conflitos de interesse nas COPs. Essa lacuna permite que representantes da indústria fóssil atuem para enfraquecer os compromissos climáticos — diz Olivia Ainbinder, coordenadora do programa de integridade socioambiental da Transparência Internacional, signatária da carta. (*Do Valor)