Ecossistema capaz de armazenar um volume de carbono de três a quatro vezes o que as florestas tropicais guardam, o mangue é um aliado contra as mudanças climáticas. Na COP30, o governo brasileiro buscará ampliar o conhecimento sobre os manguezais e angariar mais apoio e recursos para projetos de conservação desse tipo de vegetação.
- COP30 Amazônia: veja como foi o debate sobre como a bioeconomia pode ajudar a preservação de florestas
- Ipsos-Ipec: 64% dos brasileiros apoiam a COP30 no país, mas 55% estão desinformados sobre o evento
Em 2024, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) lançou o Programa Nacional para a Conservação e o Uso Sustentável dos Manguezais (ProManguezal), que já resultou em três novas Unidades de Conservação (UCs) e no avanço de um mapeamento da costa brasileira. Para especialistas, as novas ações são essenciais para proteção de mangues, que podem aumentar o potencial do Brasil no mercado de crédito de carbono.
A conservação dos mangues é uma agenda global. Lançada na COP27, a Mangrove Breakthrough é uma iniciativa internacional que tem como objetivo restaurar e proteger 15 milhões de hectares de manguezais até 2030. Em junho, o Brasil se tornou signatário da iniciativa, que tenta garantir financiamento para conservar esse ecossistema, e terá, em Belém, mais uma reunião.
Considerado uma vegetação de transição entre os ambientes marinhos e terrestres, com sua formação única, o mangue é um berçário de espécies, essencial para a conservação da biodiversidade. Além disso, é um tipo de floresta com maior capacidade de estocagem de carbono. Um estudo da Plataforma Cazul indica que somente no Brasil existe 1,9 bilhão de toneladas de CO₂ armazenadas em manguezais.
Lançado há um ano, o ProManguezal tem como meta recuperar 17 mil hectares de mangues brasileiros, em um plano com seis eixos, entre criação de novas UCs, proteção de espécies ameaçadas, monitoramento e mapeamento. Desde então, foram criadas duas UCs no Pará e uma no Espírito Santo, e programas de monitoramento estão em implementação em diversas unidades. O MMA, junto com Ibama e MapBiomas, está fazendo o mapeamento de todos os manguezais brasileiros.
- Do Rio a Belém: Geógrafo percorre 3 mil km de bicicleta para evento e busca engajar estudantes no caminho
- Meio ambiente. Economia das florestas em pé tem alto potencial, mas falta investimento
Um eixo importante é o financiamento. Os manguezais foram incluídos no Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), como uma das entregas do Brasil para a COP30, e o Edital Floresta Viva — Manguezais do Brasil, gerido pelo BNDES, vai aplicar cerca de US$ 10 milhões (cerca de R$ 55 milhões) em oito projetos de recuperação de manguezais que somam 1.700 hectares.
— É impressionante como tivemos adesão muito forte da população. Na hora que a gente faz uma política pública colocando um ecossistema em evidência, é como se a gente reconhecesse a importância daquilo, e isso se transmite para a sociedade — celebra Ana Paula Prates, diretora do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do MMA, citando a procura de ONGs e outros parceiros interessados.
Na COP30, o governo vai organizar encontros com possíveis doadores, como fundos globais de filantropia, e vai apresentar uma plataforma inédita para unir projetos de conservação de mangue e informações sobre possíveis doadores. E o ProManguezal estará no chamado “pacote azul”, de soluções baseadas no oceano para a crise climática, para atender ao Mutirão Global lançado pela COP. Prates diz que o MMA ainda estuda como o mangue pode se inserir no mercado de carbono:
— O crédito geralmente serve mais para recuperação do que manutenção de áreas.
A maior parte dos manguezais fica em áreas da União, onde é mais difícil a estruturação de projetos de crédito de carbono. Enquanto trabalhava como voluntária na Área de Proteção Ambiental (APA) Guapimirim, no Estado do Rio, a analista ambiental Laís de Oliveira estudou o potencial de regeneração de manguezal associado à geração de créditos de carbono de áreas privadas na região. Esse trabalho evoluiu até que, em 2020, ao lado de dois parceiros e com apoio do Guardiões do Mar, ela se inscreveu em um edital da Fundação Boticário para projetos de pesquisa e conservação de áreas costeiras. Assim nasceu a Plataforma Cazul.
Por meio de imagens de satélite e cruzando dados com a base do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU, eles estimaram o estoque de carbono presente nos mangues do Brasil. Foi o primeiro trabalho que se debruçou sobre toda a costa brasileira.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/y/I/7s4eH3RJGmxSPVeP6vMQ/106615074-ri-mage-rio-de-jjaneiro-16-04-2024-parque-natural-municipal-barao-de-maua-e-inaugurado.jpg)
Após dois anos de estudos, a Cazul concluiu que os manguezais brasileiros têm potencial de gerar R$ 49 bilhões em crédito de carbono, estimados a partir de 1,9 bilhão de toneladas de CO₂ armazenadas em 13.906 quilômetros quadrados da costa. O mapeamento mostrou que o Brasil tem manguezais em 16 dos 17 estados litorâneos, com destaque para Pará, Maranhão e Amapá.
— O manguezal tem capacidade maior de estocagem de carbono por ser um solo muito argiloso, com partícula do solo muito pequena. Por isso, existe menos oxigênio entre suas partículas e o processo de decomposição é mais lento, o que retém mais os gases, como o CO2, dentro da sua estrutura. É o berçário e o cemitério da vida marinha, rico em alimentos — diz Oliveira, frisando que a iniciativa quer reforçar o potencial bioeconômico desse ecossistema com créditos de carbono. — É possível gerar recursos mantendo o manguezal.