Enquanto os pés das pessoas são arredondados na ponta, os sapatos sociais femininos costumam ter uma ponta afiada. Muitas pessoas também acham esses sapatos pontudos desconfortáveis de usar. Então, por que os designers de calçados continuam fazendo-os assim?
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Com mais de duas décadas na indústria da moda, pesquisei e ensinei sobre as influências por trás do design de moda e como ele é usado, mesmo quando certas tradições e estilos parecem impraticáveis. Revisitar a cativante história por trás dos sapatos pontudos femininos pode nos ajudar a entender os vários motivos pelos quais eles ainda são populares.
Várias tendências atuais da moda feminina, incluindo sapatos pontudos, foram inicialmente adotadas pelos homens. Na Europa medieval, por volta dos séculos XIV e XV, sapatos de couro pontudos eram populares entre os homens ricos. Chamados de poulaines, ou cracows, em homenagem à cidade polonesa de Cracóvia, onde os historiadores acreditam que tenham se originado, esses sapatos podiam ter até 30 centímetros de comprimento. Para manter o formato rígido e pontudo, o usuário enchia as pontas dos sapatos com musgo ou lã.
Como a maioria dos itens de moda, sapatos indicavam o status social do usuário. Poulaines eram altamente decorados e caros para produzir, e seu design alongado dificultava a locomoção. Assim, usá-los comunicava aos outros que o usuário era rico, não precisando realizar trabalho físico que exigisse mobilidade.
Sapatos pontudos como símbolo de status
Esses sapatos se tornaram tão populares que, em 1463, o Rei Eduardo IV da Inglaterra aprovou leis limitando o comprimento dos dedos a 5 cm para qualquer pessoa abaixo de um lorde na hierarquia social. Esse decreto teve efeitos sociais, políticos e religiosos.
Socialmente, restringir os sapatos de bico longo à nobreza garantiu que o calçado se tornasse um marcador visual de status associado às classes altas. Esse sinal óbvio ajudava a manter a ordem social e impedia que pessoas de classes mais baixas tentassem se passar por pessoas de posição superior à sua.
Politicamente, o rei usou essa legislação para controlar o comércio têxtil e proteger indústrias inglesas. Regulando os tecidos e acessórios necessários para fabricar sapatos excessivamente ornamentados, Eduardo IV podia limitar a concorrência estrangeira com os fabricantes têxteis ingleses e, ao mesmo tempo, gerenciar tendências da moda.
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Do ponto de vista religioso, Eduardo IV aprovou essas leis sob a justificativa de que Deus se desagradava com roupas que não fossem modestas, pelo menos, para as classes mais baixas. Além disso, líderes religiosos acreditavam que as pontas longas impediam as pessoas de se ajoelharem de maneira respeitosa e submissa, restringindo a capacidade de orar adequadamente.
A pressão para literalmente “se encaixar” nesses sapatos pontudos também tinha um custo físico. Poulaines machucavam os pés do usuário e podiam entortar os ossos dos dedos. Com isso, os joanetes, uma protuberância óssea que se desenvolve na parte interna do pé, junto ao dedão, tornaram-se mais comuns com a popularidade desses sapatos.
Diversas culturas adotaram sapatos pontudos ao longo da história, muitas vezes para simbolizar status, riqueza ou conexão com uma subcultura específica. Alguns exemplos incluem os juttis ou khussas do norte da Índia e do Paquistão, respectivamente; os sapatos de lótus, outrora populares na China; e os chinelos rasos e pontudos usados durante a civilização etrusca.
Do ponto de vista prático, porém, sapatos de bico fino podem causar deformidades nos pés e problemas de saúde. Por que as pessoas ainda usam sapatos de bico fino se eles são tão dolorosos?
Um dos motivos é o desejo de pertencer. Seu cérebro é programado para procurar e encontrar pessoas que pensam e acreditam como você. Assim como os primeiros humanos precisavam permanecer em sua tribo para sobreviver, seu cérebro acredita que fazer parte de um grupo pode ajudar a mantê-lo seguro.
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Como sapatos de salto alto e bico fino são comumente usados por mulheres, usá-los proporciona à usuária uma sensação de aceitação por parte de outras mulheres. Embora não haja nada inerente aos sapatos de bico fino que os torne femininos ou atraentes, considerando que, em geral, foram originalmente projetados para homens, a moda frequentemente se baseia em tendências com as quais as pessoas concordam inconscientemente. E as formas elegantes são frequentemente influenciadas pelas normas sociais aceitas.
Seu cérebro também usa atalhos inteligentes para ajudá-lo a tomar decisões rapidamente. Um desses atalhos é olhar para o que outras pessoas estão fazendo. Se você vê muitas pessoas usando um determinado estilo ou jogando um jogo específico, seu cérebro pensa: “Bem, se todo mundo está fazendo isso, deve ser uma boa escolha”. Esse processo ajuda a tomar decisões sem pensar demais em cada detalhe.
Cientistas chamam a poderosa influência mental da moda sobre quem a veste e sobre quem vê sua roupa de cognição vestimentar (enclothed cognition). Os sapatos que você usa podem alterar como você percebe a si mesmo e aos outros, além de carregar significado simbólico. Assim, designers podem usar sapatos alongados para criar a ilusão de uma silhueta longa e esguia, gerando um visual que não apenas é visto, mas também sentido pessoalmente como elegante e poderoso.
Com novas tecnologias e um maior desejo dos consumidores por conforto, a boa notícia é que, da próxima vez que você se vestir e quiser usar sapatos pontudos e fashion, eles poderão ser ao menos um pouco menos dolorosos do que eram no passado.
* Michael Watson é Diretor Associado Interino e Instrutor de Varejo na Universidade da Carolina do Sul
* Este artigo foi republicado de The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o original.

