Desde sua estreia, em março, a novela “Vale tudo” se notabilizou por trazer a leitura para a trama. Boa parte dos personagens aparece regularmente com um livro na mão, e o público tem repercutido as leituras deles.
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Algumas escolhas causaram surpresa, como quando a bilionária Odete Roitman surgiu com um livro do economista Thomas Piketty, francês conhecido por suas críticas aos super-ricos. Já ao ler “O perigo de estar lúcida”, de Rosa Montero, a matriarca dos Roitman provocou um boom de vendas do livro da autora espanhola na vida real.
Para a diretora de arte da novela, Carolina Pierazzo, os títulos que aparecem em cena são mais do que um mero décor. Eles reforçam a atmosfera e acrescentam camadas aos personagens.
— As escolhas das obras são tomadas em diálogo com o diretor artístico Paulo Silvestrini, para que cada obra converse com o perfil e o momento dramático do personagem e com o arco da história — diz Pierazzo.
Fã da novela, o booktoker Rodrigo De Lorenzi não ficou indiferente aos hábitos literários da publicitária Solange Duprat, que revela seu engajamento com leituras como “Mulheres que correm com os lobos”, um fenômeno editorial entre jovens feministas.
— As leituras da mocinha Duprat revelam a busca pelo autoconhecimento e empoderamento, por uma nova identidade feminina — avalia o bootoker. — É uma performance de rebeldia e autodescoberta.
Para ele, Maria de Fátima seria o caso mais representativo de “leitura performática”. A golpista se fotografa lendo clássicos da literatura brasileira para ganhar likes de seus seguidores no Instagram. O título do livro, “As palavras voam”, denuncia a sua superficialidade.
— É uma futilidade cult pra enganar seguidores — explica De Lorenzi.
As personagens não deixariam de performar nem mesmo sozinhas com seus livros. Quando lê obras de autoras renomadas, como “O segundo sexo”, de Simone de Beauvoir, e “Os anos”, da Nobel de Literatura Annie Ernaux, Odete Roitman reafirma para si mesma — e para o público — a sua certeza de superioridade moral.
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Sua irmã Celina, por outro lado, performa empatia, mas sem perder o privilégio social. A curadoria da herdeira inclui “A amiga genial”, de Elena Ferrante, e “Becos da memória”, de Conceição Evaristo. Uma das mais conhecidas autoras negras do país, Conceição foi criada na periferia, estudou enquanto trabalhava como empregada doméstica e escreve sobre temas como discriminação racial e de classe.
— Ao ler Conceição Evaristo, Celina quer mostrar que entende as desigualdades e a luta de pessoas negras neste país, mesmo que isso seja feito apenas dentro da sua sala, já que não pensou duas vezes antes de prejudicar a Raquel — opina De Lorenzi. — Ela nunca vai além do discurso.
As irmãs Odete e Celina mostram personalidades opostas através da leitura. Para Pierazzo, as obras funcionam como um espelho de cada trajetória, mas sem reduzir a experiência feminina delas a estereótipos.
— A Celina se conecta a livros mais íntimos e poéticos. Isso reforça seu olhar delicado e introspectivo. Já a Odete mergulha em obras densas, críticas e políticas — explica a diretora de arte. — É uma personagem que olha para fora, para o mundo e suas estruturas.
Pierazzi conta que o público tem reagido de forma “imediata e muito calorosa” à maneira como a novela integrou a literatura na trama.
— Cada vez que um livro aparece em cena, rapidamente surgem comentários, buscas e até listas de leitura nas redes — diz ela. — Esse movimento é interessante porque aproxima a dramaturgia da vida real.
Celina Albuquerque Almeida Roitman
- “A elegância do ouriço” – Muriel Barbery
- “A Amiga genial” – Elena Ferrante
- “Mrs. Dalloway” – Virginia Woolf
- “Jóquei” – Matilde campilho
- “O ano do pensamento mágico” – Joan Didion
- “A mulher desiludida” – Simone de Beauvoir
- “As intermitências da morte” – José Saramago
- “Becos da memória” – Conceição Evaristo
- “O Segundo Sexo” – Simone de Beauvoir
- “Capital e ideologia” – Thomas Piketty
- “Os anos” – Annie Ernaux
- “O impulso” – Ashley Audrain
- “A noite da espera” – Milton Hatoum
- “Entre o passado e o futuro” – Hanna Arendt
- “O perigo de estar lúcida” – Rosa Montero
- “Mulheres que correm com lobos” – Clarissa Pinkola Estés
- “A Câmara clara” – Roland Barthes
- “A vida invisível de Euridice Gusmão” – Martha Batalha
- “Em busca do tempo perdio – No Caminho de Swann” – Marcelo Proust
- “Em busca do Tempo Perdido – O Caminho de Guermantes” – Marcelo Proust
- “Distraídos venceremos” – Leminski
- “O Último Magnata” – F. Scott Fitzgerald
- “Crônica de uma morte anunciada” – Gabriel Garcia Márquez
- “A insustentável leveza do ser” – Milan Kudera
- “A ilha” – Aldous Huxley