O governo se pronunciou nesta segunda-feira sobre a conversa por videoconferência entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump
A ligação por videoconferência ocorreu duas semanas depois do encontro na Assembleia Geral da ONU, em que o chefe de Estado americano afirmou que uma reunião aconteceria.
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A conversa foi acertada no fim de semana entre assessores de Lula e Trump. O presidente brasileiro se reuniu com ministros no Palácio da Alvorada, como os titulares da Fazenda, Fernando Haddad, e das Relações Exteriores, Mauro Vieira. O vice-presidente Geraldo Alckmin, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, também participou, assim como o chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Sidônio Palmeira.
A reunião virtual abre caminho para um possível encontro presencial em território neutro, a Malásia, no fim do mês, à margem da cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean). Auxiliares de Lula insistiram que o primeiro contato ocorresse de forma virtual, em um ambiente controlado, antes de uma aproximação face a face.
“Química na ONU”
Da tribuna da ONU, em 23 de setembro, o chefe de Estado americano elogiou Lula — a quem chamou “um cara muito legal” — e disse ter combinado uma reunião para debater a relação bilateral. Foi o primeiro gesto de Trump sinalizando uma negociação, mais de dois meses depois de anunciar um tarifaço de 50% sobre os produtos brasileiros alegando, entre outros fatores, que o Judiciário brasileiro promovia uma “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na ONU, o presidente americano introduziu o assunto ao criticar o cerceamento da “liberdade de expressão” em plataformas digitais. Trump também associou a taxação ao Brasil “aos seus esforços sem precedentes para interferir nos direitos e liberdades dos nossos cidadãos americanos e de outros, com censura, repressão, armamento, corrupção judicial e perseguição de críticos políticos nos Estados Unidos”. Depois, citou um encontro rápido com Lula na sede da organização, em Nova York, e fez um aceno.
— Eu estava entrando (para discursar) e o líder do Brasil estava saindo. Eu o vi, ele me viu e nos abraçamos — afirmou Trump. — Combinamos que vamos nos encontrar na próxima semana. Não tivemos muito tempo para conversar, uns 20 segundos. Em retrospecto, que bom que eu esperei, porque isso não tem funcionado bem (o diálogo com Lula), mas conversamos.
O presidente americano foi além e relatou ter acontecido “uma química” entre os dois.
— Ele parecia um cara muito legal. Na verdade, ele gostou de mim, eu gostei dele. Eu só faço negócios com pessoas de quem eu gosto. Quando eu não gosto, eu não gosto. Tivemos ao menos 39 segundos de uma química excelente — acrescentou Trump.
No dia seguinte à fala de Trump, Lula disse que ficou surpreso com o discurso do americano:
— Eu fiquei feliz quando Trump disse que pintou uma química boa entre nós. “Eu fui surpreendido porque eu tinha acabado o meu discurso, eu já estava saindo, ia pegar minhas papeletas e ir embora, quando o Trump veio para o meu lado, sabe? Com uma cara muito simpática, muito agradável, sabe? E eu acho que pintou uma química mesmo.
Tensões na relação
A ligação desta manhã ocorre em meio a tensões recentes no relacionamento bilateral, especialmente após o anúncio, por parte dos Estados Unidos, de tarifas punitivas sobre produtos brasileiros — medida que foi recebida com críticas pelo governo brasileiro, que passou a enfatizar princípios de soberania e reciprocidade. O governo de Lula enxerga na conversa uma oportunidade de reorientar o canal diplomático e, ao mesmo tempo, reafirmar que o Brasil não aceitará imposições unilaterais ou medidas que violem sua autonomia.
Desde julho deste ano, Trump passou a condicionar uma negociação comercial com o Brasil ao arquivamento do processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado por tentativa de golpe de Estado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Sanções foram aplicadas contra cidadãos brasileiros, entre os quais o ministro do STF, Alexandre de Moraes, e sua mulher, a advogada Viviane Barci de Moraes.
A expectativa é que, com a abertura de diálogo entre os dois presidentes, seja possível negociar o fim do tarifaço contra o Brasil. Está em vigor uma sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros como máquinas e equipamentos, calçados, carnes de frutas.