Lidar com centenas de terabytes de informações acumuladas diariamente sobre trânsito, dados meteorológicos e outras estatísticas da cidade é tarefa que exige bastante dedicação dos técnicos do Centro de Operações Rio (COR) da prefeitura, que desde a inauguração, em 2011, compila e organiza esses dados. Recentemente, a equipe ganhou um reforço de peso: Cora chegou em meados de fevereiro, ainda está em fase de adaptação e testes, mas a torcida é que tenha chegado para ficar. Trata-se de um modelo de Inteligência Artificial (IA) — cujo apelido certeiro, como fica evidente, remete ao órgão de lotação —criado para lidar com essas informações. O objetivo com a ferramenta é agilizar e tornar mais eficientes as ações do município para lidar com situações que afetam a rotina da cidade, tais como engarrafamentos provocados por colisões, ondas de calor, enchentes e deslizamentos de encostas, por exemplo.

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—A ideia é que a IA defina diagnósticos e estabeleça protocolos indicando que caminhos temos que seguir para que a cidade volte à normalidade depois de uma ocorrência. O volume de dados que recebemos por dia cresceu exponencialmente desde 2010 e não é mais possível analisar todas as informações apenas com a ação humana. Estamos começando com o trânsito. Mas a meta é termos todos os sistemas do COR integrados e operando com o uso da Cora, desde câmeras a contadores de tráfego, pluviômetros, entre outros recursos em um ano — diz o coronel Marcus Belchior, chefe-executivo do Centro de Operações.

Nessa fase de testes, a Cora foi implantada nas câmeras de trânsito que operam em cinco túneis: Santa Bárbara, Zuzu Angel, Rebouças, Novo e Velho. Belchior explicou que a opção por iniciar a adoção da Cora pelos túneis ocorreu por dois motivos. O primeiro é que são vias de ligação estratégicas da cidade e ocorrências neles podem prejudicar a mobilidade em outros bairros. O segundo motivo é que nos túneis não há variações de luminosidade, como acontece em ruas e avenidas ao longo do dia.

— A IA e os algoritmos precisam ser treinados para reconhecer variações que ocorrem ao longo dos dias e meses, como se estamos de dia ou de noite ou com mais ou menos luminosidade. Em vias abertas essa preparação é mais complexa — explicou Marcus Belchior.

Túneis. Operação da Cora começa por vias estratégicas e com luz controlada — Foto: Alexandre Cassiano

Hoje, o COR recebe informações de 5,4 mil câmeras, em sua maioria de trânsito e instaladas em redutores de velocidade. E nem sempre os técnicos estão monitorando em tempo real a via onde houve uma ocorrência. É aí que entra a Cora para reduzir o tempo de resposta a determinado problema.

A operação da IA nos túneis funciona da seguinte forma: ao detectar, por meio de uma das cem câmeras do projeto-piloto, uma redução repentina do tempo de deslocamentos ou outra irregularidade, como um veículo circulando na contramão, um aviso luminoso é aceso no video wall (painel com câmeras) do Centro de Operações, e os operadores recebem ainda uma mensagem pelo celular.

Com base nas contagens de tráfego no projeto-piloto com os túneis, Cora já gerou informações que ajudam no planejamento das equipes que trabalham no resgate de veículos acidentados ou atendimento a incidentes. Um exemplo prático disso: entre 12 e 26 de fevereiro, ocorreram 29 acidentes no Túnel Rebouças. A análise permitiu concluir que o horário mais crítico é no período entre o meio-dia e as 17h59, com 13 ocorrências, o equivalente a 44,8% dos chamados.

Nesta fase de testes, o incidente mais curioso detectado pela IA do COR foi a identificação de um’’ veículo’’ circulando pela contramão do Túnel Velho, à 0h50 do último dia 26. Ao acionar as câmeras, as imagens mostraram que era se tratava de um homem com uma carrocinha de comida. Atenta, Cora logo identificou que a presença dele poderia provocar colisões.

Cora foi desenvolvida por técnicos da prefeitura e de empresas de tecnologia interessadas em testar, sem ônus para o município, novas funcionalidades antes de desenvolvê-las comercialmente. Entre as que participam do projeto estão Google, Waze e Amazon. O sistema tem como avatar uma figura do sexo feminino, que dá informações básicas sobre o recurso. A meta, a longo prazo, é que a Inteligência Artificial interaja com os técnicos, que poderiam, por exemplo, pedir simulações de cenários alternativos para reduzir impactos de uma ocorrência na cidade.

— O modelo desejado é aquele em que a assistente virtual defina medidas de forma descentralizada, atendendo demandas por regiões da cidade. Seria possível, por exemplo, ter estimativas mais precisas das áreas com maior probabilidade de registrar chuvas fortes — acrescentou Belchior.

Depois de testar e concluir a implantação do sistema nos 22 túneis da cidade, o recurso começará a ser adotado em corredores de tráfego que não são confinados, como ruas, avenidas e vias expressas. A tecnologia já está instalada em câmeras na Avenida Brasil, Linha Vermelha, Autoestrada Grajaú-Jacarepaguá, e nas avenidas Pastor Martin Luther King, Dom Helder Câmara e das Américas.

A chegada de Cora representa um passo a frente no uso de tecnologia pelo COR, que há tempos emprega recursos tecnológicos em sua operação, mas menos avançados. Os sinais de trânsito, por exemplo, são equipados com contadores de tráfego. O recurso permite ajustes nos intervalos de abertura e fechamento para melhorar o fluxo de veículos.

O COR foi inaugurado no réveillon de 2011 para 2012. A iniciativa da prefeitura ocorreu depois de um forte temporal que deixou 312 mortos em todo o estado. O Rio foi a primeira capital do país a contar com o serviço, que tinha o objetivo de dar celeridade ao atendimento de ocorrências envolvendo trânsito e chuvas. Outro motivo foi a necessidade de monitorar delegações de grandes eventos que a cidade realizaria nos anos seguintes como a Rio+20, a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.

A experiência serviu de base para a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) definir parâmetros nacionais para outros centros de operações. Ao longo dos anos, o COR ganhou novas funções. O serviço hoje conta com meteorologistas que fazem prognósticos de riscos de chuvas fortes, com auxílio de dois radares próprios instalados na cidade e de um terceiro equipamento, mantido pelo Ministério da Aeronáutica no alto do Pico do Couto, em Petrópolis.

Inteligência Artificial vai monitorar trânsito e chuva na cidade