A irmã de Juliana Marins, brasileira de 26 anos que morreu após cair durante uma trilha no vulcão Rinjani, na Indonésia, publicou um vídeo nas redes sociais expressando revolta com a divulgação antecipada das informações da autópsia do corpo da jovem. O laudo, apresentado pelo médico legista Ida Bagus Alit, foi revelado à imprensa na sexta-feira — antes mesmo de ser entregue oficialmente à família. Em entrevista ao GLOBO, também na sexta-feira, Mariana Marins já havia revelado que soube dos detalhes pela mídia, e que nem mesmo o pai, Manoel Marins — que está em Bali acompanhando o caso — foi informado previamente.

‘Absurdo atrás de absurdo, e não acaba mais’

Segundo Mariana, a família havia sido chamada ao hospital para receber o laudo, mas uma coletiva foi realizada antes disso:

— Minha família foi chamada no hospital para receber o laudo, mas, antes que eles tivessem acesso a esse documento, o médico achou de bom-tom dar uma coletiva de imprensa para anunciar tudo. É absurdo atrás de absurdo, e não acaba mais — desabafou ela, em vídeo publicado no Instagram.

Após o relato, Mariana informou que a prefeitura de Niterói, cidade onde Juliana morava, ficará responsável pelos custos do traslado do corpo da Indonésia para o Brasil. Ela agradeceu ao prefeito Rodrigo Neves pela compaixão demonstrada:

Em entrevista ao GLOBO, na sexta-feira, Mariana Marins, irmã de Juliana, desabafou:

— Tudo o que eu sei, vi pela mídia. Em momento algum houve compaixão ou respeito suficiente para nos reunir e informar primeiro. Ficamos sabendo depois porque o legista quis seus 15 minutos de fama, mais um absurdo no meio de toda essa história — disse Mariana Marins.

Segundo ela, seu pai, Manoel Marins, está em Bali e só será informado sobre a autopsia da filha à noite (no horário local):

— Eu estou no Brasil, mas meu pai está em Bali. Ele me contou que agora, depois de todo mundo já ter tomado conhecimento da autópsia pela imprensa, talvez façam uma reunião com a família. É noite lá.

Manoel, pai de Juliana, confirmou ao GLOBO que está em Bali aguardando novas informações, mas não foi acionado pelas autoridades para receber detalhes sobre a autópsia feita no corpo da filha. Ele diz que soube por meio de portais de notícia.

Além da forma como a informação foi divulgada, a família coleciona dúvidas sobre quando Juliana teria morrido. Sua irmã, Mariana, questiona a própria cronologia apresentada pelo legista. Segundo ele, a morte teria ocorrido entre 12 e 24 horas antes das 22h05 — mas não deixa claro a que dia se refere. Juliana caiu no sábado, dia 21, pela manhã, e o corpo foi resgatado apenas na quarta-feira seguinte. A estimativa de morte nesse intervalo abre margem para interpretações contraditórias.

— Se o legista disser que a morte foi 12 horas após a primeira queda, isso é mentira. Temos relatos de turistas, registros, vídeos… muita coisa que comprova que a Juliana ficou viva por muito mais tempo. O ferimento fatal pode ter acontecido na última queda, já perto do resgate. Agora, se ele confirmar que foi entre 12 e 24 horas antes do resgate, isso muda tudo, diz muita coisa — completou Mariana.

Imagens feitas por turistas mostram Juliana com vida pelo menos três horas após a queda inicial. Ela teria pedido ajuda, e o grupo utilizou um drone para localizá-la. As gravações foram entregues à família e aos voluntários envolvidos nas buscas.

O que se sabe sobre a autópsia de Juliana até agora

Informações sobre a autópsia no corpo da brasileira Juliana Marins, de 26 anos, foram divulgadas nesta sexta-feira no Hospital Bali Mandara, em Denpasar, na Indonésia, onde o corpo foi examinado. Em entrevista para imprensa local, o médico legista Ida Bagus Alit concluiu que a causa da morte foi trauma, com fraturas, lesões em órgãos internos e hemorragia intensa. Ele respondeu a perguntas sobre os ferimentos e o tempo estimado entre o trauma e o óbito. Ele detalhou tecnicamente os danos ao corpo, mas ainda não está claro qual das quedas provocou a morte, estimada por ele em cerca de 20 minutos após o trauma, nem o local exato onde isso ocorreu.

Com base na entrevista divulgada por várias emissoras locais, O GLOBO reuniu, ponto a ponto, o que ele disse e o que ainda precisa ser esclarecido.

Qual foi a causa da morte?

“A partir das fraturas ósseas ocorreram danos aos órgãos internos e sangramento. Com isso, podemos concluir que a causa da morte foi um trauma contuso que causou danos aos órgãos internos e hemorragia. Então, a causa provisória da morte é trauma contuso que resultou em fraturas, danos internos e hemorragia. Quanto ao tipo de trauma, foi causada por objeto contundente. Mas reforço que estamos falando de ‘trauma contuso’, e não necessariamente de um objeto específico, pois eu não vi o objeto. Objeto contundente é qualquer coisa com superfície relativamente lisa e sólida. A maioria dos ferimentos são escoriações por atrito, ou seja, o corpo da vítima foi arrastado ou sofreu contato com superfícies duras”.

  • O que falta esclarecer: Não se sabe se ela colidiu em uma pedra ou mesmo na superfície.

A morte ocorreu muito tempo depois dos ferimentos?

“Talvez seja importante esclarecer que não encontramos nenhuma evidência de que a morte tenha ocorrido muito tempo depois dos ferimentos. Vou repetir: não encontramos sinais de que a vítima tenha morrido muito tempo depois dos ferimentos. É relativo, mas estimamos que não passou de 20 minutos após o trauma”.

  • O que falta esclarecer. Não está claro qual queda, de fato, provocou a morte de Juliana. Isso porque turistas conseguiram filmá-la com movimentos cerca de três horas após ela ter caído da trilha, como mostram as imagens. No vídeo, Juliana aparece sentada na fenda de uma rocha e mexendo as mãos.

O que indica que a morte foi rápida?

“Posso explicar, por exemplo, que havia uma lesão na cabeça, mas ainda não havia hérnia cerebral, que geralmente leva de algumas horas a dias para acontecer. Isso indica que não houve tempo suficiente para isso ocorrer, o que reforça que a morte foi rápida. O mesmo vale para o tórax e abdômen.”

Houve hemorragia significativa?

“A hemorragia foi significativa, e os órgãos, como o baço, não apresentavam sinais de retração, que indicariam sangramento lento. Então, podemos afirmar que a morte ocorreu em um intervalo muito curto após os ferimentos”.

Quanto tempo mais ou menos?

“A morte ocorreu entre 12 e 24 horas, com base nos sinais de rigidez e coloração do corpo. Mas não podemos descartar interferências anteriores, como o corpo ter sido colocado em ambientes que retardam esses processos”.

  • O que falta esclarecer: Questionado pelos repórteres presentes na coletiva sobre quando teria ocorrido esse intervalo de tempo — se antes do resgate ou após uma das quedas —, o legista respondeu: “Antes das 22h05”. No entanto, não fica claro a que dia ele se refere. Juliana caiu no Monte Rinjani na manhã de sábado, dia 21 (horário local), e o corpo foi resgatado quatro dias depois, na tarde da última quarta-feira. Em entrevista à BBC Indonésia, o médico legista afirmou que, pelos seus cálculos, Juliana Marins teria morrido entre 1h e 13h da quarta-feira, dia 25 de junho (no horário local). A estimativa, no entanto, diverge da informação divulgada pela Agência Nacional de Busca e Resgate da Indonésia (Basarnas), que, um dia antes, na terça-feira à noite (horário local), a equipe de resgate encontrou a brasileira já sem vida. Quanto a divergência de informações, o médio legista contou à BBC que “há uma diferença de cerca de seis horas em relação ao horário mencionado por Basarnas”.

Hipotermia poderia ser a causa da morte?

“Hipotermia é normalmente verificada por líquido nos olhos. Mas, como o corpo estava em estado avançado, não conseguimos realizar esse exame. Além disso, a quantidade de ferimentos e sangramentos nos permite descartar a hipotermia como causa”.

Por que a causa da morte é provisória?

“Porque o protocolo da autópsia exige exames complementares, como toxicologia. Isso não quer dizer que suspeitamos de envenenamento ou uso de substâncias, mas é uma exigência para termos certeza além de qualquer dúvida razoável. Há padrões definidos para isso. Em geral, os resultados saem em até duas semanas”.

Com um trauma desses, quanto tempo uma pessoa pode sobreviver?

“Repito: as evidências mostram que a morte foi quase imediata. Houve sangramento extenso, fraturas múltiplas e lesões em quase todo o corpo, inclusive nos órgãos do tórax e abdômen”.

Qual foi a parte mais grave?

“A parte mais grave foi a que afetou o sistema respiratório: lesões no tórax, principalmente na parte de trás, que danificaram os órgãos internos”.

O trauma contuso foi provocado por queda ou impacto?

“Pelo padrão das lesões por escoriação, condiz com uma queda”.

  • O que falta esclarecer: não se sabe ainda o local exato da queda — e não se confirma se foi numa primeira e ou outra queda.

Onde foram encontradas essas escoriações?

“Por todo o corpo, principalmente nas costas, braços e pernas. Havia lesões na cabeça também”.

Foi a lesão na cabeça que causou a morte?

“A mais grave foi nas costas. Mas como os ferimentos ocorreram quase simultaneamente, é o conjunto das lesões que levou à morte. A região das costas foi a mais afetada”.

  • O que falta esclarecer: O legista não especifica quantas quedas ou impactos o corpo pode ter sofrido. Informa que, quando eles ocorreram, foram simultâneos.

Havia chance de a morte ter sido causada por falta de comida ou água?

“Não. A causa direta da morte foi, com certeza, a violência. Houve grande quantidade de sangue na cavidade torácica, o que não se explica por inanição”.

irmã de Juliana Marins critica divulgação de autópsia antes de receber laudo oficial