Veículos, aviões, vinhos, bolsas de luxo… Produtos de setores essenciais da economia europeia correm o risco de ser duramente afetados pelas tarifas de 30% anunciadas neste sábado pelo presidente dos Estados Unidos e com entrada em vigor prevista para 1º de agosto.
O presidente Donald Trump justifica estes impostos alfandegários por um desequilíbrio comercial entre os Estados Unidos e a União Europeia (UE) com prejuízo para os americanos.
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A relação comercial entre os Estados Unidos e a UE representa 30% do comércio mundial, com um intercâmbio de bens e serviços em 2024 de 1,68 bilhão de euros (aproximadamente R$ 10,8 bilhões na cotação de dezembro), segundo a Comissão Europeia, braço executivo da UE.
Os produtos farmacêuticos são os bens mais exportados pela Europa para os Estados Unidos (22,5% do total em 2024, segundo o Eurostat, o serviço de estatísticas da UE) e, por enquanto, estão isentos das tarifas estabelecidas por Washington.
Várias empresas farmacêuticas já anunciaram investimentos nos Estados Unidos para reforçar sua produção no país, ao mesmo tempo em que pedem à UE uma flexibilização de seu marco regulatório.
Os Estados Unidos também são um mercado-chave para a indústria automobilística europeia, que exportou, em 2024, cerca de 750 mil veículos por um valor de 38,5 bilhões de euros (aproximadamente R$ 247 bilhões, em valores de dezembro), segundo a Associação Europeia de Construtores de Automóveis (Acea).
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A Alemanha produz a maioria destes veículos exportados, em particular os modelos sedã, SUV e esportivos de alto padrão de marcas como Audi, Porsche, BMW e Mercedes.
Em 2024, os Estados Unidos representaram 23% do faturamento da Mercedes. A montadora também produz ali seus SUVs, que depois exporta para outros países. Estes modelos também poderiam ser afetados por represálias europeias.
As tarifas alfandegárias americanas atuais já pesam consideravelmente no setor aeronáutico, altamente globalizado.
Desde 12 de março, é aplicada uma sobretaxa de 25% às importações de alumínio e aço nos Estados Unidos, materiais-chave para a indústria aeroespacial.
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Além disso, todos os produtos (inclusive os aviões) importados da Europa devem pagar uma taxa adicional de 10%.
O acordo que estava em negociação esta semana entre a UE e os Estados Unidos antes de anúncio de Trump, neste sábado, devia incluir isenções para os setores de aeronáutica, bebidas alcoólicas e produtos cosméticos.
O setor de luxo se manteve relativamente discreto nos últimos meses sobre suas reações, mas o impacto das tarifas poderia ser significativo.
Um quarto das vendas da LVMH, líder mundial do setor, vem dos Estados Unidos. No caso de vinhos e licores, o percentual sobe a 34%. O presidente do grupo, Bernard Arnault, instou os líderes europeus a resolverem amistosamente as tensões comerciais, inclusive mostrando-se a favor de “uma zona de livre comércio” com os EUA.
O grupo francês já tem nos Estados Unidos três ateliês da Louis Vuitton e quatro da marca americana Tiffany.
A Hermès, conhecida por suas bolsas Birkin e pelos lenços de seda, já tinha informado que compensaria “por completo” as primeiras tarifas alfandegárias de 10% impostas em abril por Trump, aumentando seus preços de venda nos Estados Unidos.
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Mas 30% são outra história.
Os perfumes e os cosméticos de marcas francesas e italianas vendem muito bem nos Estados Unidos.
Em 2024, a L’Oréal obteve nos EUA 38% de seu faturamento anual. A empresa produz localmente pouco menos da metade dos produtos que comercializa no país, segundo sua direção, e o que é importado da Europa corresponde principalmente a produtos de luxo, como Lancôme, Yves Saint Laurent, Armani…
O diretor-geral da L’Oréal mencionou em abril a possibilidade de realocar “uma parte” da produção nos Estados Unidos.
As tarifas de 30% são um “golpe mortal” para a comida Made in Italy, reagiu, neste sábado, o principal sindicato agrícola italiano Coldiretti, que teme um impacto nos preços para os consumidores.
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Segundo suas projeções, “com tarifas de 30%, os impostos adicionais para certos produtos emblemáticos do Made in Italy alcançariam 45% para os queijos, 35% para os vinhos, 42% para os tomates processados, 36% para as massas recheadas e 42% para as geleias e conservas.”
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No caso da França, os Estados Unidos são o primeiro mercado internacional para o setor de vinhos e licores, com um total em 2024 de 3,8 bilhões de euros (R$ 24,4 bilhões, em valores de dezembro), segundo sua federação (FEVS).
– Seria uma catástrofe para todo o setor, em um momento em que os vinhos e os licores já enfrentam enormes dificuldades – disse Jérôme Despey, diretor do braço de viticultura do sindicato FNSEA. – Temos visto com frequência ameaças por parte dos Estados Unidos; pedimos à Comissão Europeia que não ceda na negociação.