O julgamento da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou com batom a frase “Perdeu, mané” na estátua A Justiça em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), será o primeiro grande teste do ministro Alexandre de Moraes em meio à pressão do Congresso e de setores da opinião pública para rever as penas dos manifestantes envolvidos nos atos golpistas de 8 de Janeiro.
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Segundo relatos obtidos pela equipe da coluna, lideranças do Congresso e até mesmo integrantes do Supremo têm procurado Moraes para tentar convencê-lo a calibrar as penas de réus já condenados pelo 8 de Janeiro, o que serviria para esvaziar a ofensiva de aliados de Jair Bolsonaro pela aprovação do projeto de lei da anistia no Congresso.
Mas ainda pairam dúvidas se Moraes está mesmo disposto a ceder na questão das penas – apesar do próprio ministro já ter feito um recuo em outro ponto, ao mandar Débora para prisão domiciliar em 28 de março.
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Débora se tornou uma espécie de símbolo da direita contra os excessos cometidos por Moraes, que defendeu no mês passado a aplicação de uma pena de 14 anos contra ela por associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Uma redução das penas impostas aos manifestantes que se envolveram nos atos antidemocráticos, capitaneada pelo próprio Supremo, é justamente a saída defendida pelo ex-presidente Michel Temer em entrevista ao blog. Para Temer, Moraes cumprirá um “papel de pacificação” na relatoria das investigações da trama golpista.
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“O Congresso tem o direito de editar uma lei referente à anistia, não se pode negar isso, mas talvez para não criar nenhum mal-estar com o STF, o melhor seria que o próprio STF fizesse uma nova dosagem das penas”, afirmou Temer, responsável pela indicação de Moraes ao tribunal, em 2017.
“É possível fazer uma nova dosimetria. Punição houve, tinha de haver, mas também a pena deve ser de menor tamanho. É uma solução conciliatória. O que estou propondo é uma mediação, um meio termo.”
Conforme informou o blog, a defesa de Bolsonaro acompanha com lupa os desdobramentos do caso da cabeleireira. A avaliação é a de que o desfecho do caso Débora pode ter repercussões legais para a situação do ex-presidente, principalmente na questão da dosimetria, ou seja, no tamanho da pena que vai ser fixada.
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Um dos focos de atenção no entorno bolsonarista são os crimes que a Primeira Turma vai imputar a Débora – e quantos anos de prisão ela deve responder por cada um deles.
Isso porque tanto Débora quanto Bolsonaro são investigados por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
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Nesta sexta-feira, a Primeira Turma do STF retoma o julgamento de Débora com o voto do ministro Luiz Fux, que suspendeu a análise do processo em 24 de março.
O caso será avaliado pelos cinco integrantes da Primeira Turma ao longo de uma semana no plenário virtual do STF, uma plataforma digital que permite o julgamento de processos sem que os ministros precisem se reunir presencialmente ou por videoconferência – e longe das transmissões ao vivo da TV Justiça e dos olhos da opinião pública.
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“Vou fazer uma revisão dessa dosimetria. E eu confesso que, em determinadas ocasiões, me deparo com pena exacerbada, e foi por essa razão que eu pedi vista desse caso”, disse Fux ao ler o voto pelo recebimento da denúncia contra Jair Bolsonaro no caso da trama golpista, no mês passado.
Até agora, apenas Flávio Dino acompanhou o entendimento de Moraes de condenar a cabeleireira a 14 anos por associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
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Além de Fux, ainda faltam se posicionar sobre o caso da cabeleireira a ministra Cármen Lúcia e o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin Martins – mas até a conclusão do julgamento, em 6 de maio, é possível que os magistrados que já votaram mudem seus votos.
Para um ministro do STF ouvido reservadamente pelo blog, uma eventual revisão de Moraes em seu próprio voto seria um gesto importante e simbólico.
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A questão é saber se Moraes também vai ser capaz de revisar o próprio voto, o que poderia ser interpretado como um recuo ou admissão de erro.
Em nota enviada ao blog, a defesa de Dèbora informou que espera sua absolvição e considera “inaceitável” que a cabeleireira seja condenada por crimes como golpe de Estado, associação armada ou abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
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“É inegável que ela não invadiu qualquer prédio público. O único ato que lhe foi imputado – o de ter passado batom em uma estátua – embora impensado, foi apagado já no dia seguinte, conforme consta em laudo técnico da Polícia Federal, e não gerou qualquer consequência ou risco à ordem pública”, diz o advogado Hélio Júnior.