Viver nunca foi tão promissor. A ciência, a medicina e a tecnologia nos presentearam com mais tempo de qualidade. Mas será que estamos prontos para aproveitá-lo? Perder a vergonha de envelhecer, parar de se comparar com os mais jovens e aprender a aproveitar o que a maturidade tem de melhor são garantias de uma longevidade plena. E tudo isso começa com a compreensão de que envelhecer é natural e que há beleza de sobra nessa fase da vida.

— Se negamos a passagem dos anos, nos prendemos à frustração. Mas, se aceitamos, podemos descobrir novas formas de viver — afirma Henrique Bueno, mestre em Psicologia Positiva pela University of East London.

O especialista chama a atenção para o fato de que o que nos faz bem hoje pode ser diferente do que nos dava prazer no passado. Por exemplo, alguém que adorava correr, mas que já não pode mais porque o joelho não permite.

— E se o prazer nunca esteve na corrida em si, mas no parque, no ar puro, nas árvores ao redor? Por que não voltar lá, caminhar devagar ou apenas sentar num banco e contemplar a natureza?

A maturidade permite esse tipo de reinvenção. Pela primeira vez, muitos têm a chance de se reconstruir sem a pressão de performar ou corresponder a expectativas alheias.

Henrique destaca a comparação provocada pelas redes sociais como um dos maiores sabotadores da qualidade de vida.

— Olhamos o palco iluminado do outro e comparamos com os bastidores da nossa vida. Isso gera uma sensação constante de inadequação, como se todos estivessem indo bem, menos a gente — observa.

Segundo ele, a tecnologia, que poderia nos dar mais tempo, muitas vezes o rouba.

— Quantas vezes por dia tiramos o celular do bolso só para dar uma olhadinha, sem nem perceber? Isso não é produtividade, é o cérebro pedindo mais uma dose de dopamina. É vício.

Esse comportamento, explica, tem deixado as pessoas exaustas, ansiosas e cada vez mais distantes de si mesmas. E, de acordo com seus estudos, viver melhor não exige grandes revoluções.

— Às vezes, basta parar, respirar e fazer pequenas escolhas no dia a dia. Como deixar o celular fora do quarto na hora de dormir, parar de atender as demandas do trabalho depois do expediente ou trocar 30 minutos nas redes por um tempo de bola com o filho. Parece pouco, mas muda tudo.

Os relacionamentos também precisam de atenção. Envelhecer bem envolve se cercar de pessoas positivas e trocas reais. E, se for preciso, fazer uma faxina nas amizades.

— Se a gente não escolhe com quem convive, acaba cercado de pessoas com discursos saudosistas, em vez de olhar para as coisas que estão acontecendo agora, com tantos caminhos possíveis — afirma o professor e palestrante.

Henrique Bueno, mestre em Psicologia Positiva pela University of East London — Foto: Divulgação

A maturidade nos dá a chance de identificar o que realmente importa e começar a fazer escolhas mais alinhadas com quem somos”

— Henrique Bueno, mestre em Psicologia Positiva pela University of East London

Investir em desejos que foram adiados é uma boa alternativa para preencher o tempo com algo positivo. Aprender um instrumento, fazer um curso, estudar um idioma, começar algo do zero. E fazer isso em grupo pode ser ainda mais potente.

— Compartilhar uma jornada nos nutre e nos lembra de que não estamos sós — comenta Henrique.

Outro ponto essencial é aprender a dizer “não”.

— A gente diz “sim” porque quer ser aceito, amado, incluído. Mas, quando dizemos “sim” para tudo, estamos dizendo “não” para nós mesmos. A maturidade nos dá a chance de identificar o que realmente importa e começar a fazer escolhas mais alinhadas com quem somos.

Isso inclui parar de buscar validação.

— Quando alguém nos faz uma crítica, podemos aprender com isso, mas não precisamos aceitar tudo.

Não se trata de ignorar o mundo ou reagir com raiva. Mas de responder com consciência, sem se machucar. No fim, estamos falando sobre autoconhecimento. E isso só acontece quando criamos espaço para ele.

— Esse gesto simples, de voltar o olhar para dentro, pode transformar completamente nossa relação com a vida — afirma Henrique.

Desfrutar da longevidade, afinal, não é se agarrar ao passado, nem fingir que tudo está sempre perfeito. É, ao contrário, ter coragem de ver a realidade como ela é e, mesmo assim, escolher construir uma vida saudável e prazerosa — com pequenas decisões, novos começos e conexões verdadeiras.

Pequenas mudanças de comportamento apontam para uma vida mais leve e saudável