Uma uva tinta da França ganhou um lugar perfeito em Portugal, e hoje está em vinhos que mostram potência, mas também elegância. A Alicante Bouschet é a estrela do Júlio B. Bastos Alicante Bouschet, produzido em Estremoz, no Alentejo, no Sul daquele país, pela Dona Maria. Em visita ao Brasil, o produtor Júlio Bastos apresentou todas as safras já feitas desse rótulo que homenageia seu pai e contou que as uvas vêm de vinhas de 80 anos:
— Esse Alicante Bouschet vem do original, que é a primeira vinha de Alicante Bouschet que chegou ao Alentejo, no século XIX. Era uma vinha que pré-filoxera (praga que devastou vinhedos na Europa). E tirei parte disso quando saí da sociedade com os franceses Domaines Barons de Rothschild. Decidi sair porque não me identificava com a visão deles. Eu era muito jovem na altura, foi em 1992, quando fiz a joint venture. Eles começaram a importar castas. Portanto, tudo o que era identificado com os vinhos daqui foi por desaparecer.
O produtor conta que o vinhedo foi criado a partir de varas das vinhas plantadas no passado, que foram depois arrancadas:
— Esses vinhedos têm 80 anos. Ficam a 100 metros da primeira vinha. Ela tem então o mesmo clone do primeiro vinhedo que chegou a Portugal. Esse é o segredo desse vinho.
Ele revela que essa uva foi criada no século XIX pelo botânico Henri Bouschet:
— É uma variedade feita por Bouschet em Gironde. Como ele passava as férias em Alicante, decidiu chamá-la de Alicante Bouschet. Ela é um híbrido entre Petit Bouschet e Grenache. Como era uma coisa nova na época, minha família decidiu trazer essa variedade para Portugal.
Essa variedade encontrou no Alentejo seu terroir perfeito:
— Esse vinho Alicante Bouschet tem uma coisa muito especial. É a região onde ele se dá. E não é assim nem no Douro, nem em qualquer outra região. Portugal é o lar dela. Eles já tentaram na Califórnia e na França, mas não deu qualidade nenhuma. Foi um risco para a minha família. Porque acabara de aparecer essa casta, no século XIX. Foi quando eles importaram da França, era uma novidade. Quando trouxeram, trouxeram um ponto que era o correto, que mais devolvia a elegância do Alicante Bouschet. Normalmente, não tem essa elegância, é mais compotado, até mesmo mais escuro.
A Alicante Bouschet é uma uva tintureira, não tem a polpa clara:
— Ela tem um interior que não é branco. É uma casta tintureira, mas esta que produzimos tem um pontinho no centro, no centro da cor que é branco. Ou seja, ela não é tão tintureira como sempre é. Para mim, foi uma surpresa, quando vi que havia dois ou três hectares que eram diferentes de outros. Esse é mais elegante. Normalmente, o Alicante Bouschet é mais rústico, totalmente ao contrário. No fundo, foi uma sorte que a minha família teve, também, em trazer essa casta para o Alentejo. É a casta que mais se desenvolve hoje em dia na região e que mais qualidade dá aos vinhos.
Júlio Bastos explica que as vinhas velhas têm pouca produção, de cerca de 7 mil garrafas:
— Quem quer produção não tem qualidade. E quem quer pouca produção pode produzir qualidade. Também interessa muito as minhas vinhas não serem regadas. Elas são um tesouro porque se habituam ao terroir, ao clima, tudo o que tem a ver aos solos, tudo o que tem a ver com sobrevivência num terreno, ou nos solos. Elas adaptam-se muito melhor que uma vinha nova. É como nós. Quando somos jovens, pensamos de uma maneira, mas vamos evoluindo e depois pensamos de outra. A vinha é exatamente isso. A produção é relativamente pequena e, portanto, única.
O Júlio B. Bastos Alicante Bouschet é uma homenagem ao pai do produtor, Júlio Bandeira Bastos. As uvas são pisadas em lagares de mármore e vinificadas com temperaturas controladas. Passam por barricas novas de carvalho francês durante 14 meses.
— Tento colher o mais possível à mão. Na vinificação, usamos à volta de 50% a 60% os lagares de mármore para a pisa a pé. Essa região é uma região de mármore, que é diferente do encontrado no Brasil. Ele é menos poroso, absorve menos líquido. No inox, fazemos a fermentação por variedade separada. Vemos quais são os melhores e aí começamos a fazer os blends. Depois é que vão para a madeira nova da França, onde ficam 15, 16 meses. E aí depois fica um tempo na garrafa justamente para não se notar só a madeira e essencialmente para o vinho poder evoluir.
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Ele destaca que sua proposta é criar um vinho de guarda, que seja extraordinário mesmo mais de 20 anos depois:
— Ele tem que ser fora do normal, ter a sua própria personalidade. Tem que ser um vinho que não só que as pessoas gostem, mas que possa ter guarda. Que ao longo dos anos vá evoluindo de uma maneira muito favorável e que vá sendo cada vez melhor. Isso é o que me dá a satisfação. Quando vemos na prova de um 2004 que está extraordinário.
O vinho apresenta aromas de frutas silvestres e balsâmicas. Na boca revela-se muito amplo, denso e sedoso, com taninos maduros e redondos.
A safra que está à venda no Brasil é a 2018. O vinho é importado pela PHD Wines, e o preço sugerido é R$ 1.350, em lojas especializadas.