A discussão sobre o ICMS dos alimentos tomou conta do debate público nas últimas semanas. Depois de anunciar que zerará o imposto de importação dos itens da cesta básica, o governo federal quer que os estados façam o mesmo. Muitas análises sobre o tema se resumiram ao viés ideológico de dividir os entes da Federação em dois grupos: os que adotarão a isenção e os que não adotarão. Mas a questão não pode se resumir a uma proposta de populismo fiscal com pouca eficácia real.

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Todos sabemos quanto o custo cada vez mais alto dos alimentos tira o sono de quem vai ao mercado — a inflação de alimentos foi de 7,7% em 2024. Por isso, antes de apontar heróis e vilões, é preciso jogar luz no que os estados já fazem. No Rio, a alíquota é 7% — ante os 20% tradicionais. Arroz, feijão, cebola, ovo e frutos do mar — produzidos e comercializados localmente — são isentos de tributação.

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A construção de políticas públicas baseadas em evidências é base para a formulação de propostas em nosso governo. Na contramão disso, o governo federal põe na discussão pública pressão sobre os governadores para zerar o ICMS de todos os itens da cesta básica, fazendo com que os contrários à pauta sejam vistos como inimigos da sociedade.

A verdade é que essa política de isenção é ineficaz. Estudos mostram que a mudança demoraria de quatro a cinco meses para chegar ao consumidor, que veria nas prateleiras uma diferença nos preços inferior a 1%. O sistema de cashback previsto na reforma tributária trará ganhos muito maiores, pois é uma ferramenta criada para corrigir distorções e reduzir desigualdades.

Além de ineficaz, a proposta prejudicaria as finanças dos maiores estados, comprometendo o equilíbrio fiscal e a estabilidade da economia. No caso do Rio de Janeiro, além de estarmos no Regime de Recuperação Fiscal, precisamos neste momento preservar a receita para além da nossa gestão, pensando no presente com foco no futuro. Isso porque a média da arrecadação de cada estado entre 2025 e 2027 servirá de base para a partilha do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no âmbito da reforma tributária. Quanto maior for a receita do Rio de Janeiro agora, mais recursos do IBS o estado receberá no futuro.

Zerar o ICMS da cesta básica pode até parecer um alívio imediato, mas na prática é um remédio ineficaz com efeitos colaterais graves. A proposta vende a ilusão de que basta cortar impostos para reduzir os preços, enquanto, na verdade, compromete a arrecadação, enfraquece os estados e ameaça serviços essenciais. No fim, a conta chega — e não para quem formulou a ideia. Se insistirem nesse caminho, ao contrário do ditado popular, vão-se os dedos, e ficam os anéis. Os estados perdem receita, a população paga a conta, não resolve o problema da inflação, mas o discurso populista, como sempre, permanece intacto.

*Cláudio Castro é governador do Rio de Janeiro

Zerar o ICMS da cesta básica é populismo fiscal