A história de Amendoim, o vira-lata protagonista de “Caramelo”, filme que estreia nesta quarta-feira (8) na Netflix, por si só seria digna de estar nos cinemas. Ele vagava por aí sem muitos planos quando parou na entrada do sítio da família de Luís Estrelas, no interior de São Paulo, justamente na época em que o treinador de animais procurava — sem sucesso — um protagonista de quatro papas para a produção do streaming.
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— Comecei a pesquisa e nada de um cachorro (ideal) aparecer. Até que o Jeová, meu irmão que trabalha comigo, me ligou: “Tem um caramelo sentado aqui na frente, surgiu do nada” — relembra o treinador. — Amendoim devia ter uns quatro meses. Era orelhudo, um pouquinho magro, mas muito feliz e alegre.
Era o astro ideal para a história criada e dirigida por Diego Freitas sobre Pedro, um chef de cozinha interpretado por Rafael Vitti, que recebe uma importante promoção no trabalho quando descobre uma doença grave. É Caramelo, um cachorro espevitado, que o ajuda a atravessar os momentos de êxtase e agonia.
— Adotei uma cachorra caramelo na pandemia, num momento em que a gente não sabia do futuro, e ela me salvou, me deu uma alegria e um amor incondicional — diz Diego. — Essa mensagem de como um animal pode transformar a sua vida era o que eu queria falar neste filme.
Fazia sentido, a partir daí, procurar um bicho que fosse a cara do Brasil. Afinal, nunca havia tido uma produção nacional cujo protagonista fosse um cachorro, como é tão comum no cinema gringo, com seus “Beethoven”, “Marley e eu” e afins.
— Tinha que ter a nossa cultura e a nossa cara — diz o diretor. —E vira-lata caramelo representa o Brasil, de um povo corajoso, que não desiste e tem fé.
Amendoim é a prova disso. Nas filmagens, que duraram 11 semanas, ele tinha um “cãomarim” (camarim exclusivo) com direito a caminha (havia outra no set também), água de coco e massagista, para ajudar na recuperação dos dias de muita correria. Aliás, correr é com ele mesmo. As cenas em que Caramelo (a cor é o nome do personagem no filme) estiver mais calminho, certamente, foram feitas pelos dublês dele. Eram seis ao todo, principalmente para marcar a luz. Derek, no entanto, foi o substituto mais requisitado.
— Quando a gente precisava que o cachorro ficasse quieto, era o dublê — relembra Diego. — O Amendoim não parava, ficava correndo.
Foram usados em “Caramelo” cerca de 60 cachorros, treinados pela equipe de Luís, que atua há mais de 40 anos com publicidade e audiovisual.
— Trabalhamos com o imprevisível porque, a cada cena, os animais entregam um take totalmente diferente do anterior. E, claro, houve vários truques para conseguir fazer o filme — diz Diego, saudoso do clima do set. —Muitas vezes, o Amendoim está olhando para a câmera com aquela carinha emocionada, mas, na verdade, ele estava de olho num pedaço de carne.
Rafael Vitti tirou de letra a missão de contracenar com uma estrela tão diferente, que, vez ou outra, precisava parar a filmagem para dar uma volta na rua (praxe para não estressar os animais) ou fazer xixi (os cães-atores são treinados para “avisar” quando estão apertados ou com sede).
—É um desafio filmar com cachorro, talvez por isso a gente não faça tantos filmes (no Brasil) com eles — diz o ator, “cachorreiro assumido”. — Não é todo diretor ou toda produção que tem essa disponibilidade e predisposição para lidar, de fato, com o cão que é protagonista e está em todas as cenas e em diárias.
Se Caramelo ajuda Pedro a enfrentar a doença, Rafa diz que Amendoim e seus dublês o ajudaram também nas horas mais difíceis de composição de seu personagem.
— Em muito momentos mais sensíveis do Pedro, parecia que o Amendoim estava entendendo do que se tratava. A sensibilidade do animal, mesmo sem ter consciência igual a nossa, me impressionou muito. Isso me deixava mais presente — diz o ator.